A Líbia entrou em um conflito que é ainda mais ameaçador pelo fato de apresentar dimensões múltiplas, misturando fatores locais e internacionais.
Três anos após a queda de Trípoli em agosto de 2011, o caos prometido pelo Líder líbio, Muammar Gaddafi (morto três semanas depois em Sirte), parece ao ponto de tomar conta da Líbia.
Em 2011, após meses de combates e uma intervenção da Otan, com ataques aéreos e apoio clandestino aos rebeldes, a capital líbia caiu nas mãos de uma coalizão de brigadas originárias de diferentes cidades.
Atualmente, esses grupos estão disputando o controle da capital, enquanto outros se enfrentam na Cirenaica, tendo como pano de fundo a corrida pelo controle dos recursos petroleiros, o avanço ou o aniquilamento de grupos armados islamitas, e uma briga de influências entre padrinhos financiadores do Golfo (Emirados Árabes Unidos, especialmente), resultando em uma exposição do país ao risco de caos, como a Somália no início dos anos 1990, quando rebeldes aliados para expulsar Siad Barre em seguida devastaram Mogadício e destruíram as estruturas do Estado.
Isso quer dizer que o endurecimento dos combates na entrada sul de Trípoli, mas também em Benghazi, ao leste, representa uma ameaça ao país. Ainda mais porque outras regiões, como o sul ou zonas próximas da capital, onde atualmente não há combates, também estão sujeitas a uma fragmentação dos governos locais.
As eleições de 25 de junho foram, a sua maneira, um dos detonadores da situação atual, devido à influência política da tendência islamita. Mas as alianças vão bem além disso, ainda que aparentemente tenha sido somente pelo controle do aeroporto de Trípoli que os combates estouraram no dia 13 de junho.
A brigada originária de Zintán (uma cidade a uma centena de quilômetros ao sudoeste de Trípoli, muito ativa durante a guerra anti-Gaddafi), ainda controla o aeroporto e resiste aos ataques da brigada de Misrata (porto da costa leste de Trípoli).
O local do aeroporto agora está seriamente danificado, assim como os aviões de linha líbios que não puderam ser evacuados de última hora para Malta por pilotos heroicos.
Falta de combustível à vista
Para piorar, começou um incêndio no domingo (27) à noite nos reservatórios de combustível da empresa Brega (cerca de 6 milhões de litros), ao sul da cidade. A explosão desse estoque de hidrocarbonetos poderá ter consequências incalculáveis. Ainda que o incêndio seja controlado, a falta de gasolina deverá se tornar dramática.
Essa possibilidade não assusta os combatentes de Zintán e Misrata. Essas duas brigadas haviam participado do ataque a Trípoli de agosto de 2011.
Com a queda da capital, cada grupo se apossou de parte dos imensos estoques de armas do regime Gaddafi e, portanto, dispõe de um poder de fogo capaz de devastar uma parte de Trípoli. No domingo, um tiro de foguete Grad contra uma zona residencial do sul da cidade matou um grupo de 23 trabalhadores egípcios.
Poucos voos partindo do aeroporto militar
A França e o Reino Unido acabaram ordenando no domingo que seus cidadãos (uma centena, no caso da França) deixassem o país o mais rápido possível.
Os Estados Unidos, na véspera, haviam evacuado sua própria embaixada formando um gigantesco comboio a partir do sul de Trípoli, onde se encontra sua representação diplomática. Sob proteção de fuzileiros navais e de aviões de caça, os veículos deixaram Trípoli e chegaram à Tunísia por terra. Alguns poucos voos ainda decolam do aeroporto militar, com certos riscos.
As embaixadas da Holanda e da Bélgica foram fechadas "temporariamente". A Alemanha está pedindo para que seus cidadãos deixem o país, onde estão expostos a "crescentes riscos de sequestros e de ataques". Um comboio da embaixada do Reino Unido foi atacado e um de seus veículos blindados foi alvo de tiros.
Também no leste do país os combates continuam. As forças do general Haftar, aliado da brigada de Zintán e de partes do Exército nacional, sobretudo seu componente aéreo (tendo, portanto, aviões de caça), estão desde fevereiro em disputa com uma coalizão na qual se encontram grupos islamitas.
Reportagem de Jean-Phillippe Rémy, para o Le Monde, reproduzida no UOL.
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