terça-feira, 31 de outubro de 2017

Você também sofre com a solidão a dois?

Muitas mulheres que tenho pesquisado estão insatisfeitas com seus casamentos. Elas sentem falta de escuta, de conversa, de atenção, de reconhecimento, de intimidade etc. Algumas ainda dizem que "falta tudo".
Uma professora de 43 anos disse que sofre com a "solidão a dois":
"Ele chega e vai direto para o computador, nem me dá um beijo ou um abraço. Simplesmente me ignora, eu me sinto invisível. Ele destruiu minha autoestima. Não me conta como foi o dia dele, não pergunta como foi o meu. Faço tudo sozinha, ele não gosta de sair de casa, ir ao cinema, jantar fora, viajar. Dizem que é impossível ser feliz sozinha, mas eu acho que a pior solidão é a solidão a dois."
O marido da professora, um engenheiro de 47 anos, reclama de falta de paz e de compreensão:
"Mal abro a porta e começam as cobranças e reclamações. Ela diz que não ajudo em nada, que não escuto o que ela fala, que não valorizo o trabalho dela. É um poço de insatisfação. Trabalho o dia inteiro e quero paz em casa, mas ela vive me criticando. Pior ainda, ela adora me desvalorizar na frente de todo mundo e me comparar com os maridos maravilhosos das amigas."
Tenho observado casamentos que parecem um permanente jogo de dominação. Com suas "brincadeiras", críticas, provocações e implicâncias, muitos casais sentem prazer em envergonhar, humilhar e desvalorizar o parceiro, até mesmo publicamente. Em vez de companheiros, transformam-se em adversários que conseguem destruir a autoestima e a paz do outro.
Ele e ela afirmam que desejam uma relação mais prazerosa, leve e divertida. Mas enquanto ele enfatiza que quer paz, tranquilidade e sossego, ela afirma que quer mais conversa, atenção, reconhecimento, intimidade, beijo na boca e muito mais.
Perguntei às mulheres insatisfeitas: "Por que, então, você não se separa?". Elas responderam: "não quero que meus filhos sofram", "com o tempo, todo casamento é assim mesmo", "mulher sozinha é estigmatizada como fracassada", "estou muito velha para recomeçar", "nunca mais vou encontrar um homem que me ame", "não tenho coragem", "acho que tenho medo de ficar sem um homem para chamar de meu", "é a cultura do sou
infeliz, mas tenho marido".
Você também sofre com a "solidão a dois"?


Texto de Mirian Goldenberg, na Folha de São Paulo

segunda-feira, 30 de outubro de 2017

Desde que PT caiu, reveses do combate à corrupção se acumulam

Neste exato momento, as evidências contra Michel Temer são o que PT e PSDB sempre sonharam encontrar um sobre o outro. Quando Dilma caiu, não havia contra ela delação que fosse nem sequer comparável à de Lúcio Funaro contra Temer. Se FHC tivesse sido gravado naquela conversa com Joesley, cairia antes do raiar do dia seguinte.
E, no entanto, Temer acaba de sobreviver a mais uma denúncia. Além da gambiarra de Gilmar Mendes no TSE, já são duas fugas pelo porão do Congresso.
E isso tudo enquanto o Brasil ainda vive sob os efeitos da Lava Jato, a maior investigação de corrupção da história.
Todos os quadros importantes do governo Temer são pesadamente envolvidos nos escândalos. E o que é pior: os escândalos parecem ter destroçado PT e PSDB, que se alternavam no poder, mas deram a Presidência ao PMDB, que foi parceiro de todos os partidos em todos os escândalos.
Ninguém nunca achou que a Lava Jato conseguiria pegar todos os corruptos. Se Temer fosse um caso isolado de picareta que conseguiu fugir, menos mal. Mas há razões para ter medo de que não seja só isso.
Precisamos lidar com a possibilidade de que a janela em que os governantes brasileiros estiveram submetidos à lei, aberta quando o PT chegou ao poder, esteja se fechando.
Os governos petistas eram claramente mais fracos que seus antecessores de centro-direita: eram francamente minoritários no Congresso, nunca tiveram um único veículo de grande mídia que os apoiasse, e estavam sempre sob suspeita do empresariado. A opinião pública teria destroçado o PT se Lula tivesse indicado para o Supremo alguém tão partidário quanto Gilmar Mendes.
Nesse contexto, o jornalismo de denúncia teve uma era de ouro, Joaquim Barbosa prendeu os acusados do mensalão enquanto o grupo deles ainda estava no poder, e a Lava Jato começou seu trabalho.
Desde que o PT caiu, os reveses do combate à corrupção se acumulam. A boa notícia é que a melhor imprensa não deixou de denunciar os escândalos contra Temer; mas o apoio de todos os grandes veículos às reformas acaba colocando um limite no tom e na ênfase. O empresariado provavelmente preferia um governo liberal e honesto, mas, já que não há nenhum em oferta, acaba aceitando um liberal e corrupto. E a esquerda na oposição simplesmente não é forte o suficiente para sustentar politicamente quem enfrentar o novo grupo no poder.
Veja que o problema não é que o PT fosse inocente. É que ele era mais fraco. Sergio Moro nunca correu risco nenhum de ser escrachado pela opinião pública enquanto processava Lula, mas Rodrigo Janot foi massacrado por desmascarar Temer. Não há como comparar o poder de fogo dos blogs petistas anti-Moro com o da atual turma chapa branca.
Na última quarta-feira, após a vitória de Temer, o deputado Cunha Boy Carlos Marun (PMDB-MS) dançou para as câmeras cantando "Tudo está no seu lugar", de Benito di Paula.
As coisas não estão onde deveriam estar, Marun, mas, ao que parece, estão voltando para onde estavam antes. A janela de transparência de 2003-2016 parece estar se fechando sob governos mais fortes que os petistas. Resta torcer para que Justiça e imprensa tenham acumulado forças suficientes nesse período para sobreviver na nova fase.
Até agora, só perderam.


Texto de Celso Rocha de Barros, na Folha de São Paulo

sábado, 28 de outubro de 2017

Perguntar quem nunca será preso é forma de entender o poder no Brasil

O que há de mais cômico no Brasil destes últimos tempos é o tom.
Diante de um país no qual o ocupante da Presidência rifa direitos, facilita o uso de trabalho escravo, compra deputados e usa a máquina governamental para livrar-se de uma denúncia da procuradoria por formação de organização criminosa e obstrução de justiça, no qual um ministro do STF recebe 46 ligações de Whatsapp de um réu com o qual ele tem ligações sabidamente carnais, o cômico é ouvir o tom de quem narra tudo isto como se estivéssemos a assistir os embates políticos de uma democracia.
Deve ser algo parecido à República velha, na qual uma oligarquia inventava eleições de fachada e a imprensa descrevia aquele jogo de cena como se fosse um embate democrático.
O fato é que nunca o país mostrou de maneira tão explícita quão bem ele se acomoda a ser uma cleptocracia na qual os três poderes estão organizados para defender uma espécie de núcleo duro da espoliação nacional.
O Estado brasileiro estará disposto a usar de toda sua violência e intimidação para deixar intocada sua casta.
O caso do senhor Aécio Neves é exemplar neste sentido.
Mesmo sendo pego em gravações telefônicas expondo explicitamente manobras de obstrução de Justiça, mesmo dizendo ser necessário conseguir um atravessador que pudesse ser morto posteriormente, este senhor continua senador da República.
Ou seja, se quisermos entender como o poder funciona no Brasil, temos que nos perguntar sobre quem é intocado.
Quem, a despeito de toda cortina de fumaça, escapa sempre das amarras da Justiça. Quem, mesmo denunciado, nunca será preso.
Há várias formas de um país se degradar e o Brasil tem conhecido a mais brutal de todas, a saber, a explicitação dos mecanismos implícitos de funcionamento da democracia liberal.
A democracia liberal funciona com um duplo sistema de normas.
O primeiro é um sistema explícito de regras e normas enunciadas no ordenamento jurídico.
O segundo é um sistema implícito de práticas e violências que, a princípio, não devem vir à tona, que deve ser feito em silêncio.
Ou seja, a democracia não é apenas o império da lei. Ela é a gestão de anomias cujas dinâmicas não devem ser explicitadas.
No entanto, no Brasil atual, são tais práticas que ganham a cena sem que sua explicitação provoque maiores consequências. Isto ao menos tem uma consequências positiva, a saber, mostrar quão farsesca sempre foi nossa República.
Na melhor das hipóteses, isto pode deixar claro o tipo de tarefa política que se impõe daqui para a frente. A tarefa de ser capaz de se confrontar com a incapacidade nacional de construir uma democracia e com a necessidade de produzir o que até agora nunca existiu.
Não poderia ser diferente em um país que conheceu uma espécie de "transição democrática infinita", mas no sentido do mal infinito hegeliano.
Ou seja, uma transição que nunca terminou, que foi feita para nunca terminar.
Pois uma democracia efetiva só poderia ser construída sobre as bases de um empuxo social em direção à constituição de uma sociedade economicamente igualitária.
Mas hoje sabemos que mesmo as políticas implementadas nos últimos quinze anos não tiveram impacto significativo algum na desigualdade que destrói toda possibilidade de uma sociedade minimamente coesa.
Ao Brasil, cabe a possibilidade de continuar a farsa, brincando de eleições no interior de um sistema que funciona para blindar o núcleo duro do poder e para jogar a polícia para cima dos descontentes.
Ou aqueles que tomaram nota da degradação podem recusar as saídas autoritárias que rondam a história brasileira e procurar criar, pela primeira vez, as bases de um poder popular que possa se colocar como a força imanente e presente da República.
Em um momento no qual o resto do mundo se debate com os fins da democracia e a ascensão das estratégias populistas, o Brasil pode se colocar em um horizonte global de procura por uma experiência de emancipação social que é a grande tarefa deste início de século.


Texto de Vladimir Safatle, na Folha de São Paulo

Literatura na Rússia só é livre porque hoje ninguém mais lê, diz professor


Literatura na Rússia só é livre porque hoje ninguém mais lê, diz professor



IRINEU FRANCO PERPETUO



RESUMO Referência em literatura soviética, Ievguêni Dobrenko explica a importância dos livros na Rússia do passado e do presente, afirma que o realismo socialista era arte de má qualidade que produzia ideologia para consumo, questiona o Nobel recebido por Svetlana Alexievich e classifica Putin como "oportunista ordinário".
*
Nascido em Odessa (Ucrânia) em 1962, Ievguêni Dobrenko é referência internacional na área da literatura soviética e pós-soviética.
Chefe do departamento de estudos russos e eslavônicos da Universidade de Sheffield, no Reino Unido, ele escreveu, organizou e editou 20 livros, com destaque para "The Cambridge Companion to Twentieth-Century Russian Literature" (compêndio sobre literatura russa do século 20), "Russian Literature since 1991" (literatura russa desde 1991) e "Political Economy of Socialist Realism" (economia política do realismo socialista).
Acaba de concluir mais um, sobre a cultura do stalinismo tardio, ou seja, dos últimos anos da Segunda Guerra Mundial até a morte do ditador Josef Stálin, em 1953.
Em entrevista concedida à Folha por e-mail, em russo, ele definiu o stalinismo como "um caso especial de reação da sociedade patriarcal ao desafio da modernização. Stalinismo, nazismo, fascismo, são todos tentativas da Idade Média para se defender da modernização, liberalização, globalização". Para Dobrenko, a "tarefa de todas as pessoas pensantes, intelectuais, é participar da luta contra a Idade Média contemporânea".
*
Folha - A literatura, na Rússia, sempre foi percebida como mais do que "apenas literatura". Quanto isso mudou na Rússia pós-soviética?
Ievguêni Dobrenko - Na ausência de liberdade política, a literatura se torna a única tribuna do pensamento social. Por isso a literatura na Rússia sempre foi mais que literatura. Era filosofia, psicologia e política. Era a única tribuna social. Simplesmente não havia outras formas de autoexpressão, protesto político e reflexão nacional. Nem no século 19, nem no 20.
Na Rússia pós-soviética, isso se modifica fortemente. A literatura se desenvolve com relativa liberdade, porque perde status. Pode ser livre porque ninguém a lê, encontra-se num nicho social pequeno.
Veja as "revistas grossas". Toda literatura estava nelas. Na época da perestroika [abertura econômica na década de 1980], quando houve um pico de interesse na literatura e na política, chegaram a tiragens de muitos milhões de exemplares. Agora são míseras. Ninguém as lê, além dos literatos.
A literatura na Rússia hoje é livre porque ninguém precisa dela. As funções de propaganda e luta política saíram da literatura para outras mídias: TV, internet etc.
Quais as consequências? Quem ama e acompanha a literatura diz que, em comparação com os séculos 19 e 20, acontece pouca coisa interessante. Mas o mesmo pode ser dito hoje de qualquer literatura nacional: alemã, inglesa, espanhola... Elas não têm um Goethe, um Shakespeare, um Cervantes.
A partir da perestroika, houve mais liberdade na Rússia para os artistas vivos e o país descobriu as obras dos emigrados e dissidentes cujas obras eram proibidas. Qual foi o impacto dessa descoberta na Rússia? O processo de unificação do cânone russo nas artes foi concluído?
Na época da perestroika, produziu-se verdadeira avalanche, uma torrente imensa de literatura de emigração, literatura dissidente e, por fim, literatura dos anos 1920, que fora escondida dos leitores. Isso jamais acontecera na história da literatura russa. A influência na consciência das massas dessa literatura recém-descoberta foi imensa e, pode-se dizer, revolucionária.
Aliás, falo não apenas da literatura russa, mas da literatura e do cinema ocidental do século 20. Após décadas de realismo socialista e pseudoliteratura oficial, havia novamente a descoberta da vanguarda, diversas tendências modernistas e muitos escritores e obras de primeira classe.
Contudo, até hoje o processo de unificação do cânone literário russo não foi completado. Antes, retirava-se da literatura tudo que parecia antissoviético. Hoje, ao contrário, afasta-se tudo que é soviético. Uma censura substituiu a outra.








Você escreveu que "o realismo socialista é o meio de produzir socialismo, a máquina de transformar a realidade soviética em socialismo". Poderia explicar?
Escrevi um livro inteiro a esse respeito [economia política do realismo socialista]. Se, do quadro do "socialismo", você tentar subtrair mentalmente o realismo socialista —romances sobre o entusiasmo na produção, poemas sobre a alegria do trabalho, filmes sobre a vida feliz, peças e quadros sobre a riqueza do país dos sovietes etc.—, não vai lhe sobrar nada que possa ser chamado propriamente de socialismo.
Vão sobrar dias cinzentos, o trabalho rotineiro cotidiano, o modo de vida desorganizado e pesado.
Em outras palavras, como essa realidade pode ser atribuída a qualquer outro sistema econômico, de socialismo, no fundo, não sobra nada. É possível concluir que o realismo socialista produziu os valores simbólicos do socialismo, em lugar da realidade do socialismo.
Claro que o sistema stalinista não era socialismo nenhum. Não tinha nada em comum com o projeto marxista, além da retórica. Politicamente, era o habitual despotismo feudal oriental; economicamente, um capitalismo estatal com terrível exploração da população; culturalmente, um retorno à Idade Média. Para que as pessoas achassem que era socialismo, fez-se necessário o realismo socialista.
Pode-se dizer que a sociedade soviética era, antes de tudo, uma sociedade de consumo –de consumo ideológico. A função principal [do realismo socialista] não é propagandística, mas estética e transformadora. Mística, privada de apoio na natureza humana, a economia política do socialismo não pode ser compreendida fora da estética. Era, inicialmente, um projeto imaginário e, consequentemente, político-estético.
O romance social antissoviético, como os de Alexander Soljenítsin, é essencialmente um derivativo do realismo socialista. O mesmo poderia ser dito dos romances de Svetlana Alexievich? Quanto o realismo socialista ainda reverbera na produção cultural russa?

Soljenítsin é um escritor soviético talentoso. Chamo isso de "literatura soviética antissoviética". A literatura russa do século 20 desenvolveu-se sob o signo dos clássicos. Os bolcheviques queriam criar uma nova literatura, mas foram educados nos clássicos e aprenderam com eles. Nos anos 20, havia o slogan "aprenda com os clássicos". Todos queriam escrever como Tolstói.
O realismo socialista é uma imitação do "grande estilo" dos clássicos russos. Simplesmente não havia outros exemplos, pois o modernismo não era reconhecido nem pelos bolcheviques, nem pelos tradicionalistas. Todos escreviam "sob Tolstói". Por isso Soljenítsin é derivativo do realismo socialista, mas o próprio realismo socialista é um derivativo dos clássicos russos.
Quanto a Alexievich, apesar de meu profundo respeito por seu trabalho —um trabalho literário muito importante, um trabalho social muito importante—, apesar de toda minha simpatia por sua posição política cidadã, conceder-lhe o Nobel pareceu-me (e não só a mim) inexplicável.
No geral, essa marginalização do Nobel na área da literatura me parece evidente. Muitos premiados continuaram sendo autores pouco conhecidos, enquanto escritores que já eram clássicos passaram desapercebidos.
Sobre o realismo socialista, é claro que continua parte importante da literatura russa contemporânea, só que não mais como sujeito, e sim como objeto –retrabalhado pela "soc-art" na pintura e pelos conceitualistas na literatura, por Lev Rubinstein, Dmitri Prígov, Vladimir Sorókin, Pelévin etc.
Mas não acho que o realismo socialista possa renascer. Isso é impossível, porque o realismo socialista não é simplesmente um estilo, ou algumas técnicas e convenções literárias. Não, o realismo socialista são, antes de tudo, as grandes instituições. É toda uma máquina de direção e controle. E, claro, é um sistema de coerção e violência, ou ameaça de violência.
O socialismo morreu junto com o gulag [campo de trabalho forçado]. Sem o gulag, ele não existe. Basta passar o medo, a pressão institucional se desintegrar ou enfraquecer, e o realismo socialista se apaga, como uma vela.
Mas, na medida em que o realismo socialista era uma arte politicamente engajada de má qualidade, é claro que ele permanece na literatura. Por exemplo, os romances monstruosos de Aleksandr Prokhánov —típica grafomania política paranoica— são derivativos do realismo socialista. Essa literatura é muito produzida, embora seja absolutamente periférica.
As artes russas pós-soviéticas evoluíram de uma produção com ausência quase total e sem precedentes de censura, nos anos Gorbatchov e Iéltsin, para o que parece ser um retorno da censura, especialmente a partir de 2014. Essa mudança pode ser comparada ao ataque stalinista às artes, em 1932?
Não, de jeito nenhum. E a questão não é o grau, mas a natureza da censura. Claro que a pressão sobre a intelligentsia criativa está aumentando. Seria estranho esperar outra coisa de [Vladimir] Putin. É um autocrata, que restaurou o regime autoritário. Para ele, a arte não é perigosa nem necessária, como era perigosa e necessária para Stálin.
O regime de Putin está baseado em um impulso antimodernização (nisso consiste seu principal perigo para a Rússia, cujo desenvolvimento está sempre atrasado com relação ao Ocidente). É um regime que leva não à modernização, mas à arcaização. Um arcaísmo patriarcal baseado em "laços espirituais", "santuários", vários tabus.
Trata-se de um oportunista ordinário, para o qual o principal é o poder pessoal. Nisso é parecido com Stálin. Para ele, o antiocidentalismo é uma posição política, que lhe garante o apoio de seu eleitorado. E ele vai explorá-lo.
É um populista clássico. Daí vem o que você chama de censura. Essencialmente, é a continuação da luta da sociedade contemporânea contra a medieval.
Essa luta acontece em todos os lugares do mundo. É um processo que começou com a Revolução Francesa e vai levar mais de século, se a humanidade não perecer em uma guerra nuclear ou em uma catástrofe ecológica produzida por ela mesma.

Você escreveu que "o realismo socialista é o meio de produzir socialismo, a máquina de transformar a realidade soviética em socialismo". Poderia explicar?
Escrevi um livro inteiro a esse respeito [economia política do realismo socialista]. Se, do quadro do "socialismo", você tentar subtrair mentalmente o realismo socialista —romances sobre o entusiasmo na produção, poemas sobre a alegria do trabalho, filmes sobre a vida feliz, peças e quadros sobre a riqueza do país dos sovietes etc.—, não vai lhe sobrar nada que possa ser chamado propriamente de socialismo.
Vão sobrar dias cinzentos, o trabalho rotineiro cotidiano, o modo de vida desorganizado e pesado.
Em outras palavras, como essa realidade pode ser atribuída a qualquer outro sistema econômico, de socialismo, no fundo, não sobra nada. É possível concluir que o realismo socialista produziu os valores simbólicos do socialismo, em lugar da realidade do socialismo.
Claro que o sistema stalinista não era socialismo nenhum. Não tinha nada em comum com o projeto marxista, além da retórica. Politicamente, era o habitual despotismo feudal oriental; economicamente, um capitalismo estatal com terrível exploração da população; culturalmente, um retorno à Idade Média. Para que as pessoas achassem que era socialismo, fez-se necessário o realismo socialista.
Pode-se dizer que a sociedade soviética era, antes de tudo, uma sociedade de consumo –de consumo ideológico. A função principal [do realismo socialista] não é propagandística, mas estética e transformadora. Mística, privada de apoio na natureza humana, a economia política do socialismo não pode ser compreendida fora da estética. Era, inicialmente, um projeto imaginário e, consequentemente, político-estético.
O romance social antissoviético, como os de Alexander Soljenítsin, é essencialmente um derivativo do realismo socialista. O mesmo poderia ser dito dos romances de Svetlana Alexievich? Quanto o realismo socialista ainda reverbera na produção cultural russa?

Soljenítsin é um escritor soviético talentoso. Chamo isso de "literatura soviética
antissoviética". A literatura russa do século 20 desenvolveu-se sob o signo dos clássicos. Os bolcheviques queriam criar uma nova literatura, mas foram educados nos clássicos e aprenderam com eles. Nos anos 20, havia o slogan "aprenda com os clássicos". Todos queriam escrever como Tolstói.

O realismo socialista é uma imitação do "grande estilo" dos clássicos russos. Simplesmente não havia outros exemplos, pois o modernismo não era reconhecido nem pelos bolcheviques, nem pelos tradicionalistas. Todos escreviam "sob Tolstói". Por isso Soljenítsin é derivativo do realismo socialista, mas o próprio realismo socialista é um derivativo dos clássicos russos.
Quanto a Alexievich, apesar de meu profundo respeito por seu trabalho —um trabalho literário muito importante, um trabalho social muito importante—, apesar de toda minha simpatia por sua posição política cidadã, conceder-lhe o Nobel pareceu-me (e não só a mim) inexplicável.
No geral, essa marginalização do Nobel na área da literatura me parece evidente. Muitos premiados continuaram sendo autores pouco conhecidos, enquanto escritores que já eram clássicos passaram desapercebidos.
Sobre o realismo socialista, é claro que continua parte importante da literatura russa contemporânea, só que não mais como sujeito, e sim como objeto –retrabalhado pela "soc-art" na pintura e pelos conceitualistas na literatura, por Lev Rubinstein, Dmitri Prígov, Vladimir Sorókin, Pelévin etc.
Mas não acho que o realismo socialista possa renascer. Isso é impossível, porque o realismo socialista não é simplesmente um estilo, ou algumas técnicas e convenções literárias. Não, o realismo socialista são, antes de tudo, as grandes instituições. É toda uma máquina de direção e controle. E, claro, é um sistema de coerção e violência, ou ameaça de violência.
O socialismo morreu junto com o gulag [campo de trabalho forçado]. Sem o gulag, ele não existe. Basta passar o medo, a pressão institucional se desintegrar ou enfraquecer, e o realismo socialista se apaga, como uma vela.
Mas, na medida em que o realismo socialista era uma arte politicamente engajada de má qualidade, é claro que ele permanece na literatura. Por exemplo, os romances monstruosos de Aleksandr Prokhánov —típica grafomania política paranoica— são derivativos do realismo socialista. Essa literatura é muito produzida, embora seja absolutamente periférica.
As artes russas pós-soviéticas evoluíram de uma produção com ausência quase total e sem precedentes de censura, nos anos Gorbatchov e Iéltsin, para o que parece ser um retorno da censura, especialmente a partir de 2014. Essa mudança pode ser comparada ao ataque stalinista às artes, em 1932?
Não, de jeito nenhum. E a questão não é o grau, mas a natureza da censura. Claro que a pressão sobre a intelligentsia criativa está aumentando. Seria estranho esperar outra coisa de [Vladimir] Putin. É um autocrata, que restaurou o regime autoritário. Para ele, a arte não é perigosa nem necessária, como era perigosa e necessária para Stálin.
O regime de Putin está baseado em um impulso antimodernização (nisso consiste seu principal perigo para a Rússia, cujo desenvolvimento está sempre atrasado com relação ao Ocidente). É um regime que leva não à modernização, mas à arcaização. Um arcaísmo patriarcal baseado em "laços espirituais", "santuários", vários tabus.
Trata-se de um oportunista ordinário, para o qual o principal é o poder pessoal. Nisso é parecido com Stálin. Para ele, o antiocidentalismo é uma posição política, que lhe garante o apoio de seu eleitorado. E ele vai explorá-lo.
É um populista clássico. Daí vem o que você chama de censura. Essencialmente, é a continuação da luta da sociedade contemporânea contra a medieval.
Essa luta acontece em todos os lugares do mundo. É um processo que começou com a Revolução Francesa e vai levar mais de século, se a humanidade não perecer em uma guerra nuclear ou em uma catástrofe ecológica produzida por ela mesma.

IRINEU FRANCO PERPETUO, 46, é jornalista e tradutor. 


Reprodução da Folha de São Paulo

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Se STF acertou nos casos de Delcídio e Cunha, Aécio deveria estar preso

O Supremo Tribunal Federal não conseguiu explicar à opinião pública por que Aécio não foi preso como foi Delcídio do Amaral. Tampouco conseguiu explicar por que suas decisões contra Aécio terão que ser referendadas pelo Senado, rota de fuga que foi fechada para Eduardo Cunha.
Se as decisões sobre o candidato da direita na última eleição presidencial estiverem corretas, as decisões sobre Delcídio e Cunha estavam erradas. Se as decisões sobre Delcídio e Cunha estavam certas, Aécio deveria estar preso.
Não sou constitucionalista, não tenho a pretensão de saber qual é o caso. Mas é evidente que, se todas essa decisões foram constitucionais, o Brasil teve outra Constituição durante a guerra para derrubar Dilma Rousseff.
Não se trata, apenas, de um político corrupto escapando da Justiça. O caso de Aécio é representativo de uma tendência muito mais grave: desde que o PT caiu, a maré anti-corrupção virou.
Delcídio caiu porque era petista, Cunha caiu porque foi pego antes de a maré virar (e, mesmo assim, só depois de ter derrubado Dilma). Aécio é tucano, do grupo que subiu ao poder com Temer. Não é Aécio que tem mais capacidade de resistir à Lava Jato: é a coalizão conservadora que chegou ao poder após o impeachment.
Não é, portanto, possível descartar a hipótese de que a direita fisiológica regula a margem de ação das instituições brasileiras conforme sua conveniência.
Depois da decisão, o mundo caiu sobre a cabeça do STF, que foi acusado de não estar à altura de sua função constitucional. Bom, tem o Gilmar, mas, mesmo assim, não acho que essa seja a melhor análise.
Se a ministra Cármen Lúcia deu seu voto em favor de Aécio por temer uma guerra contra o Senado, sua leitura da situação estratégica estava correta: no momento, o Supremo Tribunal Federal é muito mais fraco que o conjunto dos senadores.
Durante a breve vigência da Constituição de 2015, o Supremo conseguiu derrubar corruptos importantes porque, na luta para derrubar Dilma Rousseff, nenhum dos analistas que hoje se preocupam com equilíbrio institucional dava a mínima para isso. Os empresários, que hoje só querem estabilidade, inflavam patos e os ânimos. Os partidos de direita que bradavam contra Delcídio hoje são o governo e têm como prioridade se livrar da cadeia, nem que para isso tenham que livrar também os petistas que derrubaram.
E a opinião pública? Como dizia Millôr Fernandes, opinião pública é a que se publica. Se o mestre, no céu dos colunistas, nos permitir uma atualização, opinião pública é a que se posta em redes sociais. Desde a guerra do impeachment, a opinião postada está sob controle da chamada Nova Direita, essa turma que não consegue mais emprego como roqueiro, ator pornô, filósofo ou militar, e descobriu que falar mal da esquerda rende um trocado.
E onde estava a Nova Direita durante o período que antecedeu o julgamento de Aécio? Estava fechando exposições de temática LGBT. A indignação que, em 2015, teria se voltado contra Aécio, agora caiu sobre o peladão do museu. O que era, é claro, o plano.
Desde que o Senado perdeu o medo da opinião pública, voltou a ser forte o suficiente para quebrar o Supremo. E enquanto a opinião pública brasileira continuar sendo a Marcha do Orgulho Otário, não adianta reclamar.


Celso Rocha de Barros, na Folha de São Paulo

A epidemia da inovação

O mundo corporativo é a distopia perfeita. De um lado, um modo inequívoco de produção de riqueza que elevou a condição material de vida dos seres humanos a um nível jamais imaginável, do outro lado, um sistema que esmaga o sujeito obrigando-o a competir cotidianamente, sem descansar nunca. Se a perfeição da vida material é uma utopia contínua no mundo contemporâneo, essa mesma perfeição produz níveis elevadíssimos de mal estar, provavelmente garantindo um futuro de mais riqueza regada a desespero a cada dia. Ninguém aguenta mais, mas ninguém pode parar.
Dentro desse quadro, chama atenção a obsessão pela ideia de "inovação". Ela aparece em todos os níveis da vida, do corporativo as pressões psicológicas sobre os mais velhos e mais jovens, num nível epidêmico.
A ideia, profundamente inscrita no "DNA" (como gosta de dizer o mundo corporativo quando "reflete sobre identidades") da modernidade, tem raízes filosóficas claras em obras como a do inglês Francis Bacon (1561-1626), entre outros. Seu projeto de "atar a natureza" a fim de conseguir as respostas necessárias para a melhoria das condições materiais de vida "na natureza" numa futura "Nova Atlântida", associado aos avanços do saneamento básico de Londres ao longo do século 19, são fundamentos básicos dos ganhos técnicos e de gestão de problemas na modernidade. Da natureza ao esgoto, o projeto é o mesmo.
Na vida pessoal, essa epidemia da inovação aparece no modo nefasto como as pessoas buscam "se reinventar" a todo momento. Ela obriga as pessoas a se vem como start ups contínuas num mercado infinito de demandas que vão da saúde física permanente, a beleza sustentável as custas de obsessões, a espiritualidade a serviço da commoditização da alma, enfim, a uma insatisfação existencial contínua como "motivação" para o imperativo da inovação.
É evidente que a proposta é patológica no nível humano, inclusive porque, apesar dos reais avanços tecnológicos na engenharia médica, marchamos para o envelhecimento e a morte, e isso tem impactos definitivos, mesmo que a indústria da inovação, regada a moda da Singularity University, a bola da vez, venda a ideia de que seremos imortais.
A epidemia da inovação no plano psicológico corrói a capacidade, principalmente dos mais jovens, de lidar com o tédio, o fracasso e a as frustrações "normais" da vida, impondo-nos o imperativo do sucesso crescente, que nos assola das nossas camas, a vida profissional, a lida com filhos até o esgotamento de nossas capacidades intelectuais e afetivas.
Um fato evidente nesse processo é o que muitos chamariam de "pressão do capital". Essa pressão nos obriga a pensar em nós mesmos como uma commodity buscando "investimento" no mercado de um mundo em "movimento", em direção a multiplicação do próprio capital que se expande a medida em que habita a inovação como condição sine qua non de adaptação a ele.
No mundo corporativo, que gasta dinheiro com palestras circenses, a fim de fazer seus "colaboradores riem", assim como uma sessão de meditação em meio ao massacre cotidiano, a epidemia da inovação é um mercado em si mesma.
Neste mundo, o futuro é uma commodity em si mesmo, vendido pelas consultorias de futuro. Citando casos conhecidos como a implantação de fake memories (diante destas, fake news é conversa de crianças), esse mercado da inovação vende a ideia de que num mundo próximo, a indústria de implantação no cérebro de memórias falsas, mas "felizes", eliminará a depressão e toda uma série de quadros clínicos indesejáveis.
Para além do absurdo da ideia, de um ponto de vista meramente médico, a própria noção de uma humanidade vivendo continuamente num parque temático "cognitivo" assusta não pelo suposto avanço médico em si, mas pelo modo como as consultorias do futuro vendem a ideia como o máximo da felicidade e da saúde. É a condição definitiva de idiotas cognitivos, sonâmbulos que caminham pela vida como um pós-humano em processo de extinção. Os neandertais, do alto de sua sabedoria de espécie já extinta, chorariam de pena de nós.


Luiz Felipe Pondé, na Folha de São Paulo

sábado, 7 de outubro de 2017

Quem sofre de depressão nem sempre parece triste

Trinta e seis horas antes de cometer suicídio, Chester Bennington, do Linkin Park, se divertia com a família num vídeo divulgado por sua mulher. "A depressão não tem rosto ou mau humor", escreveu Talinda, no Twitter.
Não sei como é para outras pessoas que sofrem com a doença, mas ouvi muitas vezes que eu parecia ótima. Eu queria estar bem, me divertir, voltar a experimentar aquilo que chamamos de felicidade. Desejava reencontrar a pessoa que sempre fui até sofrer uma crise de pânico e mergulhar numa tristeza profunda. Era a vontade de superar o problema que fazia com que, na maioria das vezes, eu não parecesse triste. Mas eu sabia que estava.
Durante mais ou menos um ano a hora mais feliz do meu dia era quando eu deitava na cama e fechava os olhos, com a esperança de que aquela noite de sono não terminasse nunca. Não era vontade de morrer, mas eu imaginava que se dormisse muito talvez acordasse mais disposta a ser feliz de novo.
Nunca era o suficiente. Nem o sono, nem os remédios, nem a paciência do meu psicanalista ou o infinito amor que recebi do meu marido e dos meus pais naquele período.
Eu queria estar bem. Me esforçava a reagir e parecer recuperada. Não podia decepcionar quem estava em minha volta. Então, eu tentava alcançar dentro de mim a pessoa que havia se perdido, mas durante a maior parte do tempo não tive forças para mergulhar tão fundo para resgatar aquela parte que havia naufragado.
Lembro que alternava entusiasmo exagerado em qualquer coisa que fizesse com dias e dias em que não queria sair de casa para nada. E era durante os episódios em que bancava a esfuziante que eu mais me enganava. E os outros acreditavam. E eu confiava no que eles viam.
Gostava de ouvir que estava bem, talvez eles conseguissem ver nitidamente o que eu não conseguia sentir. Em alguns momentos pensei que pudesse estar fingindo. Não estava. Estava tentando me arrancar daquele buraco. Mas entendi que a felicidade que eu transmitia era só a tarja preta que anestesiava a tristeza.
Funcionava. Cheguei a interromper a medicação, tudo com acompanhamento médico, porque me sentia melhor. Achava que tinha uma parte naquele processo que dependia apenas de vontade. Não adianta só querer. Levei um tombo. Mas foi dessa vez que entendi que dá para conviver pacificamente com a doença, embora os sintomas estejam apenas adormecidos.
Quase tudo que vivi naquele período parece meio nublado agora. Mesmo as lembranças dos bons momentos nem sempre têm a nitidez que a felicidade carimba em nossa memória. O cérebro não conseguia assimilar.
Não sei o que a depressão causa nos outros. Em mim, era como se a doença sufocasse no peito a pessoa alegre, divertida e bem-humorada que sempre fui. Era como se, por mais que eu tentasse, não conseguisse sentir prazer em pequenas coisas ou euforia nos grandes acontecimentos. Me olhava no espelho e não me enxergava. Passei um ano e meio da vida chapada de tristeza.
Deixei de fazer muitas coisas que gostava. O único prazer que eu tinha era afundar no sofá e beber. Beber até anestesiar os sentimentos e dormir noites intermináveis de sono. Tenho sorte. Muita gente não tem. Tornam-se alcoólatras, viciados em drogas, tiram a própria vida, tudo para fugir da dor de sentir-se triste.
Pessoas passam a vida lutando diariamente contra a depressão, algumas conseguem colocar a cabeça para fora da lama e respirar. Não sei o que funcionou no meu caso. Mas quando isso aconteceu, percebi que a doença tinha causado transformações em mim, inclusive fisicamente. Foi como se eu estivesse ficando sóbria aos poucos e me dando conta do estrago que ela tinha feito. E a ressaca é grande. Mas ela passa.
Imagine que você consegue recuperar o seu HD inteiro e ele te ajuda a lembrar quem você é, te mostra os caminhos que costumava fazer para sentir-se feliz. Dançar, correr, comer ovos mexidos no café da manhã, fazer piadas bobas, soltar o verbo. Você consegue se lembrar de como era antes da doença, que nem sempre teve que lidar com o desequilíbrio causado por suas emoções. Foi o que aconteceu comigo. E eu me agarrei a isso. E todos os dias faço um baita esforço para não soltar essa corda.
Hoje, sinto-me sóbria, e não porque não tomo mais remédios, mas porque voltei a experimentar sentimentos na intensidade que eles têm de fato. Fico feliz, alegre, decepcionada, animada e triste também. Faz parte da vida experimentar disso tudo no dia a dia. Já a depressão é um mergulho profundo na tristeza, mas nem sempre ela parece, aos olhos de quem está de fora, tão triste e devastadora quanto pode ser.


Texto de Mariliz Pereira Jorge, na Folha de São Paulo