terça-feira, 25 de novembro de 2014

Transição energética desafia Dinamarca

Transição energética desafia Dinamarca

País tenta evitar blecautes em dias sem sol ou vento
Por JUSTIN GILLIS

COPENHAGUE - A Dinamarca segue a política de combate às mudanças climáticas mais ambiciosa do mundo. Até 2050 o país pretende acabar com a queima de combustíveis fósseis -não apenas na produção de eletricidade, mas também nos transportes.
Se alguém considera impossível uma transição tão ampla, a Dinamarca discorda. Os dinamarqueses basicamente inventaram o setor moderno de produção de energia eólica e o estão levando adiante com mais afinco que qualquer outro país. Mais de 40% da energia de sua rede elétrica é renovável, e o objetivo é que até 2020 seja 50%. O consenso político em favor de continuar nesse rumo é praticamente uma unanimidade.
Por isso, os problemas com a transição para a energia limpa já não podem ser ignorados.
As fontes de energia renováveis, como a energia dos ventos e solar, uma vez instaladas, não custam nada para ser operadas. É um benefício enorme no longo prazo. Mas, à medida que mais fontes energéticas desse tipo ganham espaço na rede elétrica, elas levam os preços da energia a cair nos horários que antes eram os mais lucrativos.
Com isso, pode se tornar antieconômico operar as usinas elétricas convencionais, à base de gás, carvão ou urânio. Só que essas usinas são necessárias para fornecer a energia para os momentos em que não está ventando e o sol não está brilhando.
Fornecedores de eletricidade na Alemanha e na Dinamarca vêm pedindo autorizações para fechar algumas usinas elétricas que recentemente deixaram de ser lucrativas. Mas os governos estão resistindo, temendo que falte eletricidade em alguma noite gelada de inverno com pouco vento. Os governos ofereceram subsídios de curto prazo às usinas, cientes de que, se forçarem as empresas a operá-las mesmo tendo prejuízos, será apenas uma questão de tempo até a falência.
Governos em toda a Europa perceberam que os mercados de eletricidade terão que ser reformulados para fazer frente à nova era. Mas eles não estão encarando a tarefa com urgência. Afinal, uma reformulação malfeita pode deixar os consumidores no escuro.
A Dinamarca tem sorte geográfica. Ela tem ligações elétricas fortes com a vizinha Suécia, dotada de farta capacidade de energia nuclear, e com a Noruega, que tem eletricidade disponível graças às suas barragens. Mas políticos suecos estão prometendo fechar as usinas nucleares do país e apostar na energia renovável, enquanto cresce a demanda pela energia hidrelétrica barata da Noruega e se estuda a construção de uma linha de transmissão para o Reino Unido, sedento de energia.
"Estamos preocupados", disse Anders Stouge, vice-diretor geral da Associação Energética Dinamarquesa. "Se não fizermos algo, enfrentaremos um risco crescente de blecautes no futuro."
Portanto, é crucial acertar na reformulação do mercado.
Uma reforma modesta basicamente atribuiria um valor de mercado -logo, um preço- à capacidade que ficaria de reserva.
Mas Rasmus Helveg Petersen, ministro dinamarquês do Clima, busca uma abordagem mais ambiciosa. Esta envolveria preços da eletricidade definidos em tempo real.
Quando o vento estivesse soprando forte ou o sol brilhando intensamente, os preços cairiam vertiginosamente, mas, em momentos de escassez, subiriam de modo igualmente abrupto.
À medida que fossem instalados mais medidores inteligentes de consumo e mais aplicativos capazes de rastrear esses preços, seria possível imaginar um sistema em que a demanda se ajustaria bem à oferta disponível. Mas, mesmo que a Dinamarca consiga criar uma boa solução para o mercado de eletricidade, ela ainda terá outro grande desafio para poder alcançar sua meta para 2050: tirar os combustíveis fósseis dos transportes.
O país abraçou um sistema de carros elétricos no qual as baterias gastas seriam trocadas por novas em questão de minutos, mas só foram vendidas algumas centenas de carros antes de o plano cair por terra. Petersen ainda pensa que a eletrificação dos carros é a melhor opção.
"Precisamos de carros com autonomia maior e preços mais baixos para que essa possa ser uma boa opção", disse o ministro. "A tecnologia precisa nos salvar aqui."


Reportagem do The New York Times, reproduzida na Folha de São Paulo

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