terça-feira, 18 de novembro de 2014

O avanço das drogas sintéticas

Que a política de drogas precisa ser revista já é um assunto global. Isso deve acontecer não só por causa das calamidades provocadas pela política atual, mas também porque o avanço das drogas sintéticas põe no chinelo o combate tradicional às drogas. A mesma internet que ampliou o acesso à informação, democratizou as práticas químicas necessárias para a criação de novos tipos de drogas.
Com isso o número de novas drogas sintéticas explodiu. São substâncias na sua maioria legais, já que não há sequer tempo para que sejam estudadas e classificadas como entorpecentes. Ganharam até um apelido: designer drugs.
Já ouviu falar de Flobromazolam? MMB-Chiminaca? BK-2c-B? Metilona? Mefedrona? São alguns exemplos de substâncias psicoativas sintetizadas hoje em dia, algumas já classificadas como drogas, mas a maioria não. O fato é que são pouco estudadas e cada vez mais consumidas, vendidas pela internet com a etiqueta de "legal highs" ("baratos legais", em tradução livre).
Quando uma delas passa a ser considerada entorpecente (o que pode levar anos para acontecer), outras fórmulas são desenvolvidas. Só em 2013 foram 81 novas drogas sintéticas identificadas na Europa, ante 49 em 2011 e 41 em 2010. Esse número tende a aumentar.
E há pouco que as autoridades possam fazer. Por exemplo, a lista total de drogas hoje proibidas no Brasil pela Anvisa é de apenas 93 substâncias.
Como muitas dessas moléculas são novas, ninguém sabe ao certo quais são seus efeitos. Em razão disso, comunidades de "psiconautas" se organizam na internet para trocar informações e experiências sobre as novas substâncias. São experiências de pesquisa no melhor estilo "faça você mesmo", em que os próprios usuários determinam as dosagens e catalogam os efeitos.
Como a legislação não consegue dar conta das designer drugs, elas são combatidas por outros meios, como leis alfandegárias.
Mas isso pouco afeta as centenas de sites na internet dedicados a vender e a entregar, pelo correio, drogas sintéticas. Muitas delas são vendidas como sais aromáticos, fertilizantes ou enfeites. A procedência é indeterminada. Há laboratórios na China, na Índia, em países da Europa oriental e em outros.
A reação inicial em face desse quadro é aplicar a ele a mesma solução dada às outras drogas. Se isso for feito, será um erro. Vai servir para aumentar os preços (e lucros). E fazer com que esse comércio caia em mãos de máfias armadas.
O avanço das drogas sintéticas é uma chamada para como o modelo atual de "guerra às drogas" deu errado. Ele ressalta a importância de iniciativas como a Comissão Brasileira sobre Drogas e Democracia, que busca melhores políticas públicas para o tema e que procura caminhos mais racionais para a complexa relação entre os seres humanos e as substâncias psicoativas.


Texto de Ronaldo Lemos, publicado na Folha de São Paulo

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