sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Quando éramos todos solteiros


Amanhã o Pedrinho se casa. Na semana passada, foi a Fabi quem assinou a papelada pra formalizar o que já era fato. Vanessa teve a Olivia. Marina está grávida. A filha do Kiyo completou quatro anos. Gigi agora é sócia de um clube, onde passa os finais de semana com os dois. Monica coloca Marcelo Jeneci para o Guilherme dormir.
Somos de uma geração que saiu de casa cedo e gostou da liberdade de ir e vir, fazer e acontecer, sem dar satisfação a ninguém. Não tenho quase nenhum amigo que tenha se casado antes dos 30 anos ou tido filhos antes dos 35. A gente gostava da vida de solteiro, por uma simples razão: ser solteiro é bom demais. É uma vida boa pra quem não tem pressa de achar a outra metade. Até porque a gente queria era alguém inteiro mesmo. E essa pessoa pode demorar a dar as caras.
Tchau baladas, noites viradas, viagens repentinas, jantarzinhos no meio da semana, happy hours todos os dias, geladeira cheia de cerveja. Muito miojo e cardápios de delivery. Tchau azaração, pegação, paixões, amores que vinham e logo iam embora. Os amigos estavam sempre ali. A gente sabia que tinha para onde voltar. Para o ombro, para o abraço, para a mesa de bar, para o cineminha depois do jantar, para o miss Brasil na TV.
A gente não fazia muitos planos, só vivia. Ninguém olhava para o futuro porque tinha demais pra viver ainda no presente. Tudo estava tão certo, apesar de ser tudo incerto. A gente podia tudo, estava sempre disposto e com energia. Era dormir meia hora depois do trabalho, tomar um banho e partir para onde quer que fosse. Sabia o nome dos bares, conhecia as hostess, tinha nomes nas listas.
A mesa começava com quatro, chegavam mais dois, de repente o bar parecia nosso. O que era para ser uma cervejinha, virava a madrugada. Não tinha namorado, mulher, mãe, filho, ninguém em casa esperando. Meu apartamento por muito tempo parecia um hotel, eu só aparecia para tomar banho e dormir. A rua era a minha casa. A rua é a casa de gente solteira.
A vida veio mudando aos poucos. Felipe casou com a Paulinha. Ale e Rafa tiveram bebê. Me estrepei meia dúzia de vezes até chegar a minha vez. Troco uma noite sem dormir com a banda mais famosa do momento por meu sofá e o pé quente do momô.
É, eu chamo de momô. O Pedrinho chama a Monica de mozão. O Kiyo chama a Ana de patroa. Apelido brota do nada. Você está ali, lixando o pé no banheiro, ele aparece na porta e pergunta o que o momô quer fazer. E momô, mozão, patroa, não tem volta.
A gente começa a fazer tudo que acreditava ser cafona quando era solteiro e os outros casados. Solteiro acha gente casada cafona. Ponto. É muito tchururu, muita complicação, muito 'vou-perguntar-pro-fulano-se-ele-quer-ir'. E quando você acha que alcançou o limite da cafonice da vida de casado, coloca a foto do casal no perfil das redes sociais. Tem coisa mais cafona? Não, mas nos faz feliz mesmo sabendo que é o fim da goiabada.
E começa um sentimento de pertencimento. Estou muito mais compreensiva com as amigas que estão em dúvida se colocam porcelanato ou cimento queimado no chão. E de repente fiquei completamente interessada em quanto custou os enxoval que a Lari fez para o Pedro. Mas dá para passar dois meses na Europa! Prioridades. Momentos de vida.
Eu adorava ser solteira. Tenho certeza que meus amigos também. A gente não tinha pressa de nada, a não ser aproveitar a vida. E vivemos tudo com tanta intensidade que, quando o Micael, a Monica, o Fernando, o Tim, a Ana, o Ricardo, o Pepê, e mais tantos outros apareceram em nossas vidas, a gente estava pronto para eles. Daquele tempo, ficou uma saudade bem boa. É isso que importa. 


Texto de Mariliz Pereira Jorge, na Folha de São Paulo

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