A recente derrubada do decreto presidencial que institui o Sistema Nacional de Participação Popular, pela Câmara dos Deputados, traz à tona a discussão sobre a democracia participativa. Mais do que uma demonstração de força diante do governo recém-reeleito, a decisão dos parlamentares fere a Constituição.
A Carta assegura a participação direta dos cidadãos na política e não deixa dúvidas quanto à inexistência de concorrência de atribuições entre a participação popular e o indelegável papel dos Legislativos.
Diante desse tema, é preciso desarmar ânimos. A existência e o funcionamento de conselhos de políticas públicas, nas três esferas de governo, têm sido fundamentais para garantir melhor atendimento às necessidades do cidadão.
Esses avanços, consolidados em leis e decretos, são reconhecidos pela sociedade como estratégicos e tornaram o Brasil referência global. A experiência do Orçamento Participativo tornou Porto Alegre exemplo internacional em participação popular. A participação direta do cidadão nas decisões orçamentárias é praticada atualmente em mais de 2.300 cidades pelo mundo.
Os conselhos são espaços públicos de composição plural e paritária entre o Estado e sociedade civil, de natureza deliberativa e consultiva. Foram criados a partir de iniciativas da sociedade civil frente à necessidade de qualificar os serviços públicos e colaboram de forma efetiva para sua melhora.
É o caso dos 5.553 conselhos municipais de saúde, que trouxeram inestimáveis melhorias ao Sistema Único de Saúde. Já os 4.718 conselhos municipais de educação estão previstos na Lei de Diretrizes e Bases da Educação, e a eles cabe colaborar na elaboração do Plano Municipal de Educação e fiscalizar a ação da política local de ensino.
Há ainda outros 14.210 conselhos nas áreas de assistência social, segurança alimentar, cultura, política urbana/conselho da cidade, meio ambiente, segurança pública, preservação do patrimônio, defesa dos direitos da mulher, dos idosos, das crianças e adolescentes, dos portadores de deficiências, entre outros.
É o Brasil exportando novas práticas de democracia direta.
Uma das reivindicações mais contundentes nas manifestações do ano passado foi pela participação popular nas decisões públicas, em especial na área do transporte urbano.
Só nesse tema já estão implementados no país 358 conselhos com participação direta de usuários, trabalhadores do sistema, acadêmicos e representantes dos próprios governos. Ou seja, a decisão da Câmara Federal ignora a voz das ruas.
Para os prefeitos, a discussão sobre o alegado conflito entre as atribuições do Legislativo e a institucionalização da participação cidadã já foi superada há anos e os resultados são satisfatórios na definição e correção dos rumos das políticas públicas e no aprimoramento dos mecanismos de transparência e prevenção à corrupção.
A Frente Nacional de Prefeitos expressa preocupação diante da anulação desse decreto, o que é um lamentável retrocesso democrático.
Os prefeitos incentivam o avanço da participação popular nos governos estaduais e na União. A democracia plena está apoiada na atuação direta dos cidadãos na tomada de decisões que influenciam a qualidade de vida nas cidades. É o futuro da democracia que está em jogo.
Texto de José Fortunati, publicado na Folha de São Paulo.
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