Toda a Europa está falando na "questão francesa": será que o governo socialista do presidente François Hollande conseguirá reverter o lento declínio da França e impedir que o país escorregue definitivamente para a segunda divisão europeia?
O que está em jogo é se um sistema social-democrata, que há décadas se orgulha de servir como modelo para a oferta de um padrão de vida estável e elevado para seus cidadãos, será capaz de sobreviver à combinação de globalização, envelhecimento populacional e agudos cortes fiscais.
Pessoas próximas a Hollande dizem que ele está ciente do que é preciso fazer para cortar gastos e reduzir regulamentações que oneram a economia. Amigos da França, em especial a Alemanha, temem que Hollande possa simplesmente carecer de coragem política para confrontar seus aliados e tomar as decisões necessárias.
Mudar qualquer país é difícil. Mas o desafio na França parece especialmente árduo, em parte porque a vida francesa ainda é muito confortável para muita gente e o dia do juízo parece distante, especialmente para os sindicatos nacionais, pequenos, mas poderosos.
Os franceses têm um justificável orgulho do seu modelo social. A saúde pública e as pensões são boas, muitos franceses se aposentam com 60 anos ou menos, férias de cinco ou seis semanas são a norma e os trabalhadores com empregos em tempo integral têm jornadas semanais de 35 horas e proteções contra demissões.
Mas, numa economia mundial mais competitiva, a questão não é se o modelo social francês é bom, mas se os franceses têm condições de continuar a bancá-lo. Com base nas atuais tendências, a resposta é claramente não ou, pelo menos, não sem mudanças estruturais significativas -em pensões, impostos, benefícios sociais, regras trabalhistas e expectativas.
Mas o Partido Socialista, de Hollande, e a esquerda francesa mais aguerrida não parecem captar a famosa sacada do sobrinho do príncipe em "O Gattopardo", famoso romance de Giuseppe Tomasi di Lampedusa sobre turbulências sociais, segundo quem "é preciso que tudo mude para que tudo continue igual".
Às vezes, conversando com políticos e trabalhadores franceses, há a sensação de que todos eles se consideram revolucionários e membros de comunas -mas, ao mesmo tempo, como a extrema direita, eles desejam fixar o conforto do conhecido.
Em maio de 1968, alunos da Universidade Paris-Nanterre começaram o que julgavam ser uma revolução. Estudantes franceses de gravata e meia soquete atiravam paralelepípedos na polícia e exigiam que o esclerosado sistema do pós-guerra fosse mudado.
Hoje, em Nanterre, alunos preocupados em conseguir empregos e não perder os benefícios estatais exigem que nada mude. Para Raphaël Glucksmann, que liderou uma greve quando estava no colégio, em 1995, os membros da sua geração se sentem nostálgicos em relação a seus pais rebeldes, mas não têm estômago para arrumar briga em tempos difíceis.
"Os jovens marcham para rejeitar todas as reformas", disse ele. "Não vemos alternativas. Somos uma geração sem atitude."
Os socialistas se tornaram um partido conservador, tentando desesperadamente preservar as vitórias do último século.
Mas os sinais de alerta estão por toda parte: o desemprego na França, especialmente entre jovens, está em nível recorde. O crescimento é lento em comparação ao da Alemanha, Reino Unido, EUA ou Ásia. Os gastos públicos representam quase 57% do PIB, maior índice entre os países industrializados. Os aumentos reais de salários superam o aumento da produtividade. A dívida nacional ultrapassa 90% do PIB.
Em Amiens, no norte da França, a Goodyear mantém duas fábricas de pneus. Os empregados de uma delas aceitaram relutantemente mudar as escalas de trabalho, preservando sua fábrica. Os operários da outra rejeitaram a opção, e a Goodyear está tentando fechar a unidade, deixando mais gente sem trabalho.
Há um amplo consenso de que só a esquerda poderá promover uma verdadeira renovação. Mas isso só poderá acontecer se Hollande, que tem maioria parlamentar, estiver disposto a confrontar seu próprio partido em nome do futuro.
Texto de Steven Erlanger, para o The New York Times, reproduzido na Folha de São Paulo. Grifos do blogueiro.
Comentário rápido: não tenho certeza, mas parece que o redator no mínimo insinua que os tais benefícios, em destaque, devem ser cortados, e a vida dos trabalhadores precarizada. Obviamente para facilitar a vida do capital. É aquela coisa, não é desejável que os indianos em geral venham a ter o nível de vida dos franceses, desejável é que os franceses voltem a ter o nível médio de vida dos indianos.
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