O alvo do comando Al-Shabab – um shopping center lotado na hora do ataque, frequentado por uma clientela de quenianos ricos e expatriados ocidentais, mas também famílias comuns aproveitando o fim de semana – foi cuidadosamente escolhido por esse grupo adepto de um islamismo rigorista. O Westgate é um antro da sociedade de consumo de luxo, símbolo de certo sucesso econômico queniano. O local ideal para infligir o máximo de prejuízos humanos – pelo menos 68 mortos e 200 feridos, segundo um balanço provisório - , garantir para si publicidade mundial, difundir o terror, sabotar o turismo queniano e colocar as potências ocidentais e seus aliados africanos diante de suas próprias fragilidades de segurança.
O comunicado divulgado algumas horas depois do início do ataque do Al-Shabab explicita o principal objetivo: punir Nairóbi. Há dois anos, o Exército queniano entrou na Somália como parte de uma operação africana multinacional fortemente apoiada pelas potências ocidentais e destinada a expulsar o Al-Shabab do poder. A empreitada teve um sucesso parcial, algo que hoje os shabab estão cobrando com sangue.
"Justiça punitiva"
"O que os quenianos estão vendo no Westgate é justiça punitiva pelos crimes cometidos por seus soldados" na Somália, reivindicou o grupo em sua conta do Twitter: "Por terra, por ar e por mar, as forças quenianas invadiram nossa pátria muçulmana, matando centenas de muçulmanos (...) e deslocando milhares de outros. A mensagem que estamos enviando ao governo e à população queniana é e sempre será a mesma: retirem todas suas tropas de nosso país.".
A mensagem também foi dirigida à França, ao Reino Unido e aos Estados Unidos, que apoiaram a ofensiva contra o Al-Shabab e cujos cidadãos morreram no ataque contra o Westgate.
O Al-Shabab havia avisado que atacaria o Quênia. O passado recente provou que eles tinham de ser levados a sério. Foi lá que a Al-Qaeda, organização à qual eles hoje são afiliados, conduziu uma de suas operações mais impressionantes. Em 1998, um caminhão lotado de explosivos pulverizou a embaixada americana em Nairóbi, matando mais de 200 pessoas. Em 2002, um hotel de propriedade de israelenses nas costas quenianas do Oceano Índico foi atacado. E, três anos atrás, na vizinha Uganda, o Al-Shabab pela primeira vez demonstrou sua capacidade de conduzir operações fora de casa, lançando seus homens-bomba contra um café lotado de clientes que foram assistir à uma partida da Copa do Mundo de futebol na TV, na época organizada na África do Sul.
É verdade que a intervenção internacional na Somália permitiu expulsar o Al-Shabab da capital Mogadíscio e de grande parte dos territórios que eles controlavam e haviam colocado sob a lei islâmica mais impiedosa. As perdas que eles sofreram nos últimos meses os levaram a proliferar os atentados na Somália, por não conseguirem continuar com o combate frontal. Segundo analistas, o movimento teria se concentrado em torno de um núcleo de alguns milhares de homens, sendo que alguns deles passaram pelos campos de treinamento da Al-Qaeda no Paquistão. Prova disso são as técnicas dos atentados suicidas ou de carro-bomba utilizadas nos últimos tempos em Mogadíscio.
O ataque de sábado, em compensação, mostra que eles ainda dispõem de uma grande força de ataque. E a presença de estrangeiros no comando do atentado de Westgate também mostra que o Al-Shabab está conseguindo recrutar longe de suas bases.
Esse massacre também evidencia a dificuldade, para os países africanos e as potências ocidentais, em controlar esse espaço que agora se estende de uma margem à outra do continente africano. Esse arco do terror não segue uma linha contínua, nem forma um espaço homogêneo. Mas os laços revelados entre os islamitas do norte do Mali e a seita islamita do Boko Haram da Nigéria, e a proliferação de grupos criminosos islamitas nessas regiões fazem delas um espaço de insegurança crescente.
Texto de Christophe Chatelot, para o Le Monde, reproduzido no UOL.
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