O que fazer com as crianças que, em várias partes do mundo, não têm adultos que apresentem e leiam livros para elas desde pequenas?
A solução de Patrícia Aldana, editora guatemalteca radicada no Canadá, é conectar adultos disponíveis e prepará-los para serem mediadores de leitura, além de criar situações que permitam sua atuação. Aldana relata que esse trabalho é feito no Irã para atender ao 1 milhão de crianças refugiadas do Afeganistão.
A formação de mediadores de leitura e a aquisição de livros são coordenadas pelo Ibby (International Board on Books for Young People), entidade não governamental.
Na Faixa de Gaza, também foram formados mediadores pelo Ibby e criadas duas bibliotecas. Seu acervo é bastante diversificado e, surpreendentemente, o livro preferido das crianças de lá é "Cinderela".
Na China, há um grupo de colégios nos quais todo o ensino é estruturado a partir da leitura e, no México, escolas possuem voluntários que leem livros para os alunos nos intervalos de lanche e almoço.
Em Toronto (Canadá), durante anos, existiu um clube de leitura semanal de mães e filhos. No início, as crianças tinham nove anos e já eram adolescentes quando deixavam de se reunir. A cada semana, uma das gerações escolhia o livro a ser lido. Registrou-se, ao longo dos anos, uma mudança na qualidade dos critérios de escolha dos livros tanto por parte dos filhos como das mães.
E no sul do Chile, após um terremoto em uma pequena comunidade, formou-se um grupo de voluntários que lia todas as semanas para as crianças afetadas. O impacto dessa ação foi grande. Crianças e suas famílias passaram a procurar por livros da biblioteca da escola, que antes não eram lidos e tampouco divulgados pelas professoras.
A semelhança entre essas ações está na existência de mediadores adultos que leem para as crianças e na criação de bibliotecas que servem à formação de leitores.
Mas como tornar essa meta viável em um país do porte do Brasil? Sabe-se que muitas crianças não têm acesso à leitura, seja pela falta de livros ou instrução dos pais, seja pela desatenção à prática da leitura na sala de aula --mais comum nas escolas do que se imagina.
Desde 1997, a distribuição de acervos às escolas, alunos e professores pelo PNBE (Programa Nacional Biblioteca da Escola) vem cumprindo de forma tímida sua função de promover a inserção dos alunos na cultura letrada. A implantação do PNLL (Plano Nacional de Livro e Leitura), em 2006, reavivou o debate.
Criaram-se espaços de práticas de transmissão de narrativas e programas de formação de professores mediadores. Porém, ainda faltam projetos de formação leitora nas escolas e creches. Também se deve pensar num sistema de bibliotecas públicas comunitárias com funcionários qualificados.
Nesta semana, acontece em São Paulo a terceira e última etapa do seminário internacional Conversas ao Pé da Página de 2013.
A segunda etapa encerrou-se em agosto com uma concordância entre autores, editores e acadêmicos de destaque nacional e internacional: para se formar cidadãos democráticos, é imprescindível o contato com a leitura e a literatura. Apenas assim teremos adultos capazes de ler, compreender e formar opinião sobre todo tipo de questão e, com base nela, escolher seus representantes.
Representantes do Ministério da Cultura presentes no seminário enfatizaram que as iniciativas em municípios do Brasil devem ser aglutinadas nacionalmente. Eles defendem a formação de uma rede de projetos sociais de leitura, de autogestão e troca.
Até o final de 2014, pretende-se enviar um projeto de lei para a institucionalização do PNLL, tornando-o uma determinação política, ampliando radicalmente os investimentos públicos em leitura e, ao mesmo tempo, dando uma solução superior e qualificada à contribuição da iniciativa privada no Fundo Pró-Leitura.
Enquanto isso, resta-nos acompanhar de perto esse trabalho e nos inspirarmos em experiências únicas e criativas.
Texto de Mônica Gouvêa, publicado na Folha de São Paulo.
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