Não fossem os EUA, brasileiro poderia ter barrado uso de gás sarin por Damasco
DAWISSON BELÉM LOPESMARIO SCHETTINO VALENTEESPECIAL PARA A FOLHA
Um relatório da ONU atestou o possível uso de armas químicas contra a população síria, em 21 de agosto. Segundo o documento, as provas são "esmagadoras".
Curiosamente, mais de uma década atrás, as alavancas para evitar essa tragédia estiveram nas mãos de um diplomata brasileiro: José Maurício Bustani, que, entre 1997 e 2002, dirigiu a Opaq (Organização para a Proibição de Armas Químicas).
A Opaq foi criada com o objetivo de eliminar depósitos de armamentos químicos e destruir todas as usinas para sua produção. Diferentemente do Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares, o acordo constitutivo da Opaq é simétrico e impõe obrigações idênticas para todos os seus estados-membros.
Assim, países como Estados Unidos, Rússia e China, signatários do tratado, têm que se submeter a inspeções regulares, bem como à erradicação do arsenal químico.
Desde sua criação, em 1997, a organização comandada por Bustani passou a inspecionar seus membros, poderosos ou não, e exigir cumprimento de metas. A expectativa era de que a Opaq conseguisse eliminar todas as armas químicas até, no máximo, 2012.
A estimativa parecia razoável no início dos anos 2000, pois, sob a liderança de Bustani, a organização passou de 87 para 145 membros, incluindo países como Irã, Arábia Saudita e Paquistão. Além disso, destruiu aproximadamente 15% dos estoques de armas e 2/3 dos locais de produção de armamentos químicos em todo o planeta.
Contudo, quando buscava convencer o ditador Saddam Hussein a promover a entrada do Iraque na Opaq, submeter o país às inspeções e evitar o iminente conflito com Washington, Bustani passou a sofrer achincalhes sistemáticos dos EUA.
A Casa Branca temia que a tentativa da Opaq de investigar Saddam atrapalhasse o plano de invasão do Iraque, pois a constatação pública de que não existiam armas químicas no território iraquiano retiraria um importante argumento de legitimidade.
O golpe de misericórdia em Bustani ocorreu em abril de 2002, quando 48 membros da Opaq decidiram por sua demissão. Alegou-se descontrole financeiro na administração. Nos bastidores, sabia-se que a razão era outra.
A diplomacia americana, sob a batuta do subsecretário do Departamento de Estado John Bolton, ameaçava abandonar a Opaq, o que reduziria muito sua relevância.
À época, prevaleceu no Itamaraty o entendimento de que faltou disposição ao governo FHC para fazer frente à campanha de descrédito movida pelos EUA.
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