quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Nova geração caribenha amplia fronteiras


Nova geração caribenha amplia fronteiras

Por LARRY ROHTER

O escritor Marlon James cresceu na Jamaica na década de 1970, o que significa que tem lembranças infantis daquele período politicamente turbulento e culturalmente fértil. Mas, como adulto, sua mente continua dando voltas em torno daquele tempo e lugar, tentando entender algo que na época só poderia perceber vagamente.
Dessa busca surge seu terceiro romance, "A Brief History of Seven Killings" (uma breve história de sete homicídios), que começa mostrando como o brilho otimista da independência vai dando lugar à dura realidade da política da Guerra Fria e à ascensão de organizações criminosas ligadas aos dois principais partidos políticos. O crack aparece, e as quadrilhas se internacionalizam, estabelecendo operações em Miami e Nova York.
"A ideia desse livro foi a primeira que tive, antes mesmo dos outros dois romances, porque sempre tive interesse em escrever sobre a Jamaica onde cresci", disse James. "Pensei que fosse ser uma novela, que fosse a história de uma só pessoa. Mas estava errado, porque a História está sempre moldando tudo."
James, 43, faz parte de uma nova geração de autores caribenhos cuja principal referência cultural, além dos seus próprios países, é os Estados Unidos, em vez do antigo colonizador (no caso da Jamaica, o Reino Unido).
James se define como um "escritor pós-pós-colonial", com uma formação intelectual híbrida. Ao mesmo tempo em que leu Shakespeare e Henry Fielding na escola, observou, também escutou Michael Jackson; seu romance faz referências a "Shadow Dancing", do cantor britânico Andy Gibb.
"Nossa concepção do que significa ser um caribenho autêntico é muito mais ampla, fluída e complicada" do que a das gerações anteriores, disse Nicholas Laughlin, escritor e crítico de Trinidad e Tobago. "Marlon é um escritor que não apenas revira esses limites e definições, ele totalmente os elimina."
A trama de "Seven Killings" gira em torno da tentativa de assassinato que Bob Marley sofreu em dezembro de 1976. No romance, Marley é chamado simplesmente de "o Cantor", disse James, porque sua persona corria o risco de dominar a obra, que tem quase 700 páginas.
"Eu precisava dele mais para pairar sobre o livro do que para estar no centro", explicou. James disse que encontrou uma solução quando leu um artigo de Gay Talese na revista "Esquire", "Frank Sinatra Has a Cold" (Frank Sinatra está resfriado), que foca o círculo de pessoas próximas ao cantor. O livro "Os Detetives Selvagens", de Roberto Bolaño, também ajudou: James o descreve como um "modelo muito consciente".
Personagens inspirados em pessoas reais, como exilados cubanos e seus intermediários da CIA, desempenham papéis centrais no romance. Políticos jamaicanos como os rivais ex-primeiros-ministros Michael Manley e Edward Seaga também estão muito presentes, assim como os líderes das "garrisons" (guarnições), milícias comunitárias e criminosas controladas por seus partidos.
James alerta, no entanto, que "se você for ler isso como história, pode se decepcionar ou ficar confuso". Em boa parte do livro, disse, estou "só sendo maroto". Mas ele se lembra de ter escutado quando criança algumas histórias incorporadas no romance. Sua mãe era detetive policial, e seu pai, um policial que virou advogado.
Há alguns anos, segundo James, um entrevistador europeu iniciou uma pergunta dizendo: "Como alguém que escapou do gueto...". Ele se lembra de ter contestado: "Cresci em um bairro, como qualquer outra criança. Tínhamos dois carros e discutíamos coisas como se 'T. J. Hooker' é melhor do que 'Starsky & Hutch'."


Reprodução do The New York Times, na Folha de São Paulo

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