domingo, 12 de outubro de 2014

Distraídos do mundo


Quase todas as demais notícias parecem desinteressantes quando aparecem as primeiras pesquisas eleitorais de um segundo turno que pode levar à primeira troca de governo em doze anos. Quando o Petrolão ganha viva voz na narrativa daquele ex-diretor da Petrobras, que contou sua versão da mumunha como se estivesse em um seminário empresarial do demo, em um workshop da roubança. Quando, como se não bastasse, mais um alto comando da Polícia Militar do Rio é preso por bandalheiras várias.
Mesmo os "analistas", essa categoria nada analítica, e até muito operador local do dinheiro grosso parecem não dar trela para a contínua degradação das notícias econômicas ou outras mais ou menos relacionadas.
Por ora não importa muito que o governo federal praticamente tenha deixado de poupar gastos correntes (aqueles que excluem juros) ou que a inflação agora pode se acomodar no degrau dos 7%. Que os reservatórios das usinas hidrelétricas continuem baixando, mesmo com o país crescendo nada. Que a maior metrópole do país, maior economia brasileira, e vizinhanças até a rica região de Campinas estejam sob racionamento d'água.
Parece ainda menos interessante relatar novos sinais de que a economia mundial está se movendo de lado, mas está, para tempos bicudos de natureza algo diversa do que vimos até o ano passado, por aí.
Financistas do mundo parecem unidos na incerteza do que fazer diante da mudança, dando a entender que não sabem direito de qual mudança se trata. A Bolsa de Valores de Nova York levou um tombo significativo na terça, levantou-se com um pulo na quarta apenas para cair ontem de novo. É a maior sequência de sacolejos desde 2011.
As taxas de juros da dívida pública das duas maiores economias do Ocidente, Estados Unidos e Alemanha, definham, as germânicas em particular. Grosso modo, é sinal de incerteza grande sobre o que vai ser de dólar, política monetária americana, da europeia, da China e sobre o tamanho da nova frustração da "retomada econômica".
A maior economia da Europa, que parecia ter escapado da lerdeza geral da eurozona, pode ter encolhido no segundo e terceiro trimestres (encolheu no segundo).
O dólar forte em relação às moedas mais importantes do mundo é resultado do melhor desempenho da economia americana em relação ao restante do mundo rico.
A desaceleração no mundo "emergente" ajuda a derrubar o preço de commodities, o grosso das nossas exportações, que vão ainda mais para baixo devido ao dólar mais forte.
Mesmo quem não acredita no bode expiatório que o governo arrumou para explicar o fracasso de sua política econômica, a "crise mundial", sabe que o clima não está bom lá fora também.
Convém ainda não esquecer a vizinhança imediata, a Argentina, que mesmo depauperada e diminuída ainda causa estragos, como em parte da nossa indústria. A Argentina derrete por ora em banho-maria, mas derrete.
Tudo pode não passar de uma gripe forte. Mas o vírus está meio mudado e, enfim, trata-se de mais um ano de economia mundial meio de cama.


Texto de Vinicius Torres Freire, na Folha de São Paulo

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