Os eleitores petistas podem não ter razão em tentar canonizar seus
antigos líderes envolvidos em escândalos de corrupção, mas têm razão em
se indignar com a maneira seletiva, própria à Justiça do Brasil, de
tratar os partidos brasileiros. Não é preciso ser petista para
reconhecer que algo de estranho acontece quando o partido-alvo não é o
PT.
Por exemplo, uma mutação peculiar ocorre com o ímpeto investigativo e
punitivo do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), sr. Joaquim
Barbosa, quando o dito escândalo do mensalão passa à sua segunda fase,
aquela na qual se conta a incrível história de sua origem nas campanhas
tucanas mineiras e que, segundo o próprio deputado federal Eduardo
Azeredo (PSDB-MG), teria também ajudado a encher os cofres da campanha
de reeleição do então presidente da República, Fernando Henrique
Cardoso, em 1998.
Tomado por certa paralisia e horror, é como se nosso presidente do
Supremo não pudesse tocar no processo, deixando-o adormecer durante
meses, anos, até que os porões do Palácio da Justiça lacrem tudo com o
devido silêncio do esquecimento redentor.
Algo semelhante ocorre com um dos mais impressionantes escândalos de
corrupção do Brasil recente, o que envolve o metrô paulistano. O mesmo
metrô que se expande na velocidade de um carro subindo a rodovia dos
Imigrantes em dia de volta de feriado com chuva.
Empresas multinacionais julgadas em tribunais suíços e franceses,
pedidos de informação vindos da Justiça suíça e inacreditavelmente
"esquecidos" por procuradores brasileiros, denúncias feitas por
funcionários das empresas envolvidas citando nominalmente toda a cúpula
dos tucanos bandeirantes que vão à imprensa apenas para encenar sua
indignação por seus anos de dedicação franciscana à política serem
jogados no lixo: nada, mas absolutamente nada disso foi capaz de abrir
uma reles CPI.
Uma série de denúncias sobre assalto ao bem público durante quase duas
décadas, tão bem fundamentadas que tiveram a força de abrir inquéritos
em países europeus, não foi capaz de justificar uma reles CPI na
província de São Paulo.
Ao menos nesse ponto, os eleitores do PT têm razão em não levar a
Justiça brasileira a sério. Se o escândalo do metrô fosse com seu
partido, meus amigos, vocês poderiam esperar um comportamento bastante
distinto da Justiça e de certos setores caninos da imprensa nacional.
Agora, o próximo passo será um assessor de imprensa tucano mandar uma
carta ao Painel do Leitor, neste jornal, tentado fazer, como sempre, o
velho jogo da desqualificação "ad hominem". Assim caminha o ritmo torto
da indignação brasileira.
Texto de Vladimir Safatle, na Folha de São Paulo. Destaques do blogueiro.
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