A acusação do senador Aécio Neves e de outras eminências do PSDB ao
ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, de envolvê-los em ilicitudes
para desviar as atenções postas nos petistas presos, não resiste a um
simples olhar aos jornais ou telejornais. Até um exame médico de José
Genoino continuou mais importante do que a distensão EUA/Irã, do que um
pronunciamento conservador do papa aparentemente inovador, do que
manifestações de entidades de magistrados e da OAB contra o presidente
do STF --e, claro, do que o tal envolvimento de peessedebistas.
Mas uma parte e outra tornam necessárias mais duas linhas
investigatórias nessa história de corrupção nas licitações de metrô e
trens em São Paulo. "Mais duas" não é bem o caso, porque até agora
sabe-se de investigações que o Ministério Público Federal em SP deixou
de fazer, mas nada se sabe com certeza de investigação em processamento.
A propósito, as condutas que, por vários anos, evitaram investigações
aqui e até uma singela colaboração do MP com a investigação suíça
deveriam ser objeto de inquéritos rigorosíssimos. Tanto no próprio
Ministério Público Federal no Estado, apesar de pouco promissor contra a
força do corporativismo, quanto no plano federal, pelo dano a relações
internacionais do país.
Aécio Neves começou por acusar de manobra a entrega à Polícia Federal,
pelo ministro, de uma carta em que é feito o envolvimento de políticos
do PSDB com a corrupção. Mas o que Cardozo deveria fazer senão
entregá-la à PF? Ao que parece, o que se deseja é exatamente que toda
suspeita de corrupção, como faz a carta, seja encaminhada à PF e suas
congêneres. O original da carta, porém, segundo as eminências do PSDB,
não incluiria citação alguma ao seu partido, só existente na versão
divulgada. Ao que Cardozo responde com a informação de que a carta
exibida pelo PSDB, sem as incriminações, tem menos folhas, ou menos
texto, do que o original por ele recebido e encaminhado à PF.
Nesta altura, os dois lados nos lançaram no terreno do inacreditável.
Aécio Neves, José Eduardo Cardozo e José Aníbal são igualmente
inimagináveis como autores ou como coniventes em acréscimos ou
supressões documentais para incriminar adversários políticos. Há algo
estranho e encoberto no confronto de leviandades mutuamente atribuídas.
Estar encoberto é o traço característico da sequência que começa em
dinheirama correndo debaixo de mesas governamentais, segue em contratos
que escondem os valores corretos e mergulha no arquivo do Ministério
Público Federal em São Paulo, onde uma correspondência de investigação
se esconde e esconde a própria investigação --esta, feita na Suíça
porque o Brasil não a faz. É necessário e urgente interromper a
característica do caso, para esclarecer os sigilos da carta. Um dos
lados vai sair mal do esclarecimento. Mas isso, provavelmente, começará a
esclarecer o mais importante. Talvez, o mais escondido na história
toda.
Texto de Jânio de Freitas, na Folha de São Paulo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário