"Não se descarta a possibilidade de uma guerra civil", alertou na segunda-feira (11) o "Bangkok Post" em um editorial que ocupava toda a primeira página do grande jornal anglófono da Tailândia. As imagens das ruas não eram nada tranquilizadoras, três anos após os sangrentos confrontos da primavera de 2010, quando a violenta repressão do Exército resultou em mais de 90 mortos. Manifestantes dos dois lados passaram pelo centro de Bancoc e a tensão só aumenta entre os adversários.
Os ânimos voltaram a se acirrar depois que a Câmara Baixa aprovou, no dia 1º de novembro, uma lei de anistia que em seguida foi vetada pela Câmara Alta. Entre outras coisas, ela isentaria o ex-premiê Thaksin Shinawatra de uma condenação por corrupção. Acusado de apropriação indevida de fundos depois de ser derrubado em 2005 pelos militares, ele preferiu fugir para Dubai, onde tem vivido em exílio desde então. Essa vontade de absolvê-lo despertou o clã dos "anti-Shinawatra". A polícia temia a ocorrência de tumultos na capital do reino, na terça-feira.
De um lado, o "clã" da oposição, conduzido pelo antigo Partido Democrata e sua ala "amarela", cor dos pró-monarquistas e dos partidários da elite urbana centrada na velha aliança entre o Exército, o Palácio Real e alguns dos grandes magnatas dos negócios. Do outro, os "camisas vermelhas", aliados da atual primeira-ministra Yingluck Shinawatra, irmã de Thaksin.
Oriundos das classes mais baixas e do campesinato de regiões menos favorecidas do norte e do nordeste, os "vermelhos", que não são necessariamente de esquerda, estão bem decididos a resistir aos adversários decididamente de direita, e que hoje clamam sua determinação em "conseguir uma vitória absoluta" para derrubar esse governo, eleito com um pé nas costas no verão de 2011.
De fato é a sombra de Thaksin, cuja passagem pelo mundo empresarial por seis anos contribuiu para uma nova configuração sociopolítica, que continua a dominar a política tailandesa. Uma semana atrás, enquanto os partidários da oposição, bem como vários intelectuais e representantes da classe média se indignavam com esse projeto de lei de anistia, considerado um "cheque em branco para a corrupção", os próprios "vermelhos" estavam divididos.
Muitos deles, embora satisfeitos com uma legislação que permitiria a Thaksin – considerado o primeiro-ministro 'de facto' por dar ordens à sua irmã a partir do Golfo – retornar a Bancoc, se revoltavam com a ideia de que os responsáveis pelos massacres de 2010 também pudessem ser absolvidos.
Entre eles, o ex-premiê Abhisit Vejjajiva e Prayuth Chanocha, atual chefe do estado-maior do Exército, que é também um dos organizadores do golpe de Estado de 2005 e um dos oficiais de mais alto escalão durante a repressão contra os "camisas vermelhas" em 2010, que na época eram da oposição e exigiam a volta de Thaksin.
"Essa lei de anistia, ainda que contrarie muita gente de ambos os lados, é a única maneira de lançar as bases de uma verdadeira reconciliação na Tailândia. Do contrário, não sairemos nunca dessa situação", contou ao "Le Monde" na semana passada Jaran Ditapitchai, ex-combatente comunista nos anos 1970 e um dos defensores dos "camisas vermelhas" em 2010.
A situação social na verdade continua polarizada em torno da tensão entre parte das classes desfavorecidas rurais e a aliança das classes médias com e elite, com medo de perder seus privilégios adquiridos.
Diante da comoção provocada por essa lei, que muitos analisaram como sendo "feita sob medida" pelos deputados do Pheu Thai, o partido no poder, para facilitar a volta de Thaksin, Yingluck voltou atrás há alguns dias. Ela afirmou que se o Senado não aprovasse a lei, seu partido não insistiria para que ela passasse. Os senadores – metade deles tendo sido nomeados por instituições próximas do estabelecimento tradicional pró-monarquista – a vetaram em unanimidade.
No entanto, a polêmica não terminou: "A primeira-ministra primeiro pareceu fragilizada pela votação dessa lei na medida em que parte de sua ala, entre os "vermelhos", a rejeitava. Agora, suas forças estão novamente unidas, enquanto do lado da oposição a situação atual representa uma janela de oportunidade para tentar derrubar o governo", analisa Eugénie Mérieau, que acaba de publicar "Os Camisas Vermelhas da Tailândia" (Ed. Irasec). A oposição convocou uma greve geral e está aconselhando os empresários a atrasarem o pagamento de seus impostos.
Reportagem de Bruno Philip, para o Le Monde, reproduzido do UOL.
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