terça-feira, 12 de novembro de 2013

Dominicanos de origem haitiana vivem limbo jurídico

Dominicanos de origem haitiana vivem limbo jurídico
República Dominicana decide que filhos de imigrantes ilegais, mesmo os que nasceram no país, não têm mais direito à cidadania
RANDAL C. ARCHIBOLDDO "NEW YORK TIMES", EM SANTO DOMINGO (REPÚBLICA DOMINICANA)

Presentes na República Dominicana há gerações, haitianos com frequência são vistos com desconfiança ou com repúdio. Trabalham em empregos mal pagos, como faxineiros, na construção e nas enormes plantações de cana-de-açúcar.
Agora, intensificando uma longa discussão sobre o lugar que ocupam nesta sociedade, o Supremo Tribunal dominicano declarou que os filhos de imigrantes haitianos ilegais, mesmo os que nasceram há décadas no país, não têm mais direito à cidadania dominicana.
Com isso, foi posta em dúvida a situação legal de dezenas de milhares de pessoas que nunca conheceram outra identidade nacional senão a dominicana.
"Sou dominicana", disse Ana Maria Belique, 27 anos, que nasceu na República Dominicana e nunca viveu em outro país. Ela não pôde matricular-se na faculdade ou renovar seu passaporte, porque sua certidão de nascimento deixou de ser aceita. "Não conheço o Haiti. Não tenho família nem amigos lá. Esta é minha terra."
A corte instruiu as autoridades do país a fazerem uma auditoria de todos os registros de nascimento do país, com efeito retroativo até junho de 1929, para determinar quem não tem mais direito à cidadania.
O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados avisou que a decisão pode privar dezenas de milhares de pessoas de nacionalidade. E a aliança regional de nações caribenhas, da qual a República Dominicana vem tentando fazer parte, condenou o modo como pessoas em grande número estão "sendo mergulhadas num vácuo constitucional, legal e administrativo".
"Os números são espantosos: mais de 200 mil pessoas convertidas em apátridas", disse Laura Bingham, que estuda questões de cidadania para a organização Open Society Justice Initiative.
Ela e três outros especialistas em leis descreveram a decisão da corte dominicana como uma das maiores decisões de negação de nacionalidade nos últimos anos.
Em vista da história da relação entre os dois países que dividem a mesma ilha --relação às vezes cooperativa, às vezes tensa e ocasionalmente violenta--, a decisão da Justiça trouxe à tona um conjunto singular de tensões raciais e ressentimentos em relação às ondas de migrantes haitianos pobres.
De acordo com o último censo, cerca de 200 mil pessoas nascidas na República Dominicana têm pais haitianos, fazendo deste de longe o maior grupo de imigrantes.
Durante décadas, haitianos foram trazidos para a República Dominicana para cortar cana nas fazendas, recebendo salários ínfimos.
Altas autoridades do governo dominicano se reuniram recentemente para discutir como implementar a ordem da corte, contra a qual não cabe recurso.
Enquanto isso, o diretor de Migração, José R. Taveras, disse que as pessoas que ficaram no limbo receberão autorizações de residência temporária, enquanto o país traça um plano para lhes dar alguma forma de status imigratório. Mas, para muitos, isso significa perder vários benefícios de cidadania.

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