Uma decisão liminar do TJ-PR (Tribunal de Justiça do Paraná) suspendeu o feriado do Dia da Consciência Negra em Curitiba, que seria comemorado pela primeira vez na cidade no próximo dia 20. A sentença, provisória, é fruto de ação movida pela ACP (Associação Comercial do Paraná) e o Sinduscon (Sindicato da Indústria da Construção Civil do Paraná). Mais de uma dezena de entidades do movimento negro prometem recorrer.
O feriado foi promulgado pela Câmara Municipal no início do ano. Os vereadores o aprovaram em 27 de novembro de 2012 (já sob protestos da ACP) e enviaram o texto para sanção do então prefeito Luciano Ducci (PSB), que disputou e perdeu a reeleição. Ducci não se manifestou no prazo legal. Assim, o texto voltou à Câmara. Em 11 de janeiro passado, o presidente da casa, Paulo Salamuni (PV), o promulgou.
"Vamos entrar com recurso contra a liminar. Hoje (quarta-feira, 6), vamos reunir uma série de entidades, advogados, a procuradoria da Câmara para elaborarmos o texto", disse Romeu Gomes de Miranda, representante dos movimentos negros e principal articulador da reação.
As entidades esperam apoio do MPE (Ministério Público Estadual) para recorrer da decisão do TJ-PR, tomada na última sexta-feira (1.º). Mas, em parecer enviado ao Tribunal a pedido dos desembargadores, o MPE avaliou que o município não tem a prerrogativa de criar feriados como o da Consciência Negra – mesma tese brandida por ACP e Sinduscon.
Entendimentos semelhantes já derrubaram o feriado de 20 de novembro em outras cidades brasileiras – Florianópolis, em 2012, e Goiânia, em 2009, são dois exemplos. Londrina (381 km ao norte de Curitiba), segunda maior cidade do Paraná e quarta da região sul, comemora o Dia da Consciência Negra desde 2010.
Este ano, porém, decisão obtida pela sindicato do comércio varejista da cidade autoriza as lojas a abrirem as portas no próximo dia 20. A prefeitura informou que serviços públicos, indústrias e serviços não vão funcionar.
Presidente da ACP nega que racismo seja motivação de pedido
Em entrevista ao UOL em janeiro deste ano, o presidente da ACP, Edson José Ramon, estimou que o feriado traria um prejuízo aproximado de R$ 160 milhões a Curitiba. A cifra foi obtida a partir da divisão do PIB municipal pelo número de dias do ano. À época, a entidade se preparava para recorrer à Justiça contra o Dia da Consciência Negra.
Ramon irritou-se ao ser perguntado se a reação demonstrava racismo. "Você acha que [lutar contra] um prejuízo de R$ 160 milhões é preconceito?", reagiu. "Sou cristão, espírita kardecista, e minha vida é pautada por fazer bem à sociedade."
Em nota divulgada nesta quarta, ACP e Sinduscon reiteraram que não se opõem à comemoração do Dia da Consciência Negra, mas apenas ao feriado. "A ACP não se coloca em posição contrária à comemoração cívica e histórica da data, mas não abre mão da atitude democrática em defesa dos interesses da sociedade", afirma, no texto, o presidente em exercício José Eduardo de Moraes Sarmento.
"A entidade é favorável ao movimento da Consciência Negra, considera legítima a reflexão sobre a inserção do negro na sociedade brasileira (mas), em vez de paralisar as atividades do comércio e da indústria, sugere a realização de palestras e eventos educativos, para debater nas empresas, escolas, instituições e entidades de classe a importância deste tema, o combate às injustiças sociais e a promoção da igualdade racial", diz a nota do Sinduscon.
Secretaria de Igualdade Racial não se pronuncia; movimento negro diz que feriado melhora autoestima
Ouvido pela reportagem nesta quarta, o secretário-executivo da Seppir (Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial) do governo federal, Giovanni Harvey, não quis se posicionar na polêmica paranaense.
"É uma decisão judicial, que se respeita", afirmou. "[Ainda assim, a Seppir] se coloca à disposição da Câmara [Municipal de Curitiba e de entidades do movimento negro] para fornecer informações que sirvam para interpor recursos que considere cabíveis."
"O 20 de novembro é data importante para a sociedade brasileira. Se homenageia Zumbi dos Palmares, um herói nacional. É um dia em que se faz conjunto de reflexões", argumentou Harley. Questionado se acha que, por isso, é preciso que a data seja feriado, ele esquivou-se. "Não vou entrar no mérito", falou.
Miranda, do movimento negro de Curitiba, foi mais taxativo. "Muitos questionam que não há feriados para celebrar outras etnias [presentes na formação de Curitiba]. Mas elas vieram por livre e espontânea vontade. Nós viemos arrastados, no porão de navios negreiros. E trabalhamos como escravos por quase quatro séculos. O feriado é uma forma de melhorar a autoestima do povo negro."
Reprodução do UOL Notícias.
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