quinta-feira, 28 de novembro de 2013

No subúrbio de Londres, os serviços públicos sucumbem ao peso dos imigrantes

Olhando em retrospecto, Grzegorz Sommerfeld teria preferido não vir ao Reino Unido. Faz três anos e meio que esse polonês de 29 anos desembarcou em Slough, um subúrbio popular situado cerca de 30 quilômetros a oeste de Londres, e teve muitas suas dificuldades. Primeiro ele pulou de bico em bico, depois aos poucos acabou ficando sem emprego, nem moradia. Ele dorme ou em um prédio invadido ou em um quarto que um amigo deixa à sua disposição quando este trabalha à noite. "Mas nem penso em voltar para a Polônia como um fracassado", ele diz. "Quero ganhar um pouco de dinheiro antes de fazer as malas."
No Serena Hall, um abrigo para sem-tetos em Slough, histórias como essas vêm se proliferando. "Os poloneses representam mais ou menos metade da população atendida", calcula a voluntária Sam. Eles começaram a chegar há uma década, com a autorização dada em 2004 aos habitantes de oito novos Estados-membros da União Europeia, entre eles a Polônia, de virem trabalhar no Reino Unido. Na época, somente a Suécia e a Irlanda haviam feito o mesmo, enquanto outros, como a França e a Alemanha, adiavam a data.
O governo britânico contava com 13 mil entradas por ano, mas em dez anos chegaram 900 mil pessoas. O primeiro-ministro falou sobre essa imigração em seu artigo no "Financial Times" de 27 de novembro, questionando a livre circulação dentro da União Europeia (UE).
Mesmo entre os mais pobres as tensões vêm aumentando. "Nossa infraestrutura não está aguentando o peso dos recém-chegados", explica Ricky Bowden, um sem-teto. "Somos uma pequena ilha e não estamos mais dando conta". O fato de Ricky, com a voz um tanto pastosa por causa do álcool, estar repetindo quase que literalmente os argumentos apresentados pelos principais políticos do momento, diz muito sobre o debate que tem abalado o Reino Unido. Segundo as pesquisas, a imigração agora é a segunda maior fonte de preocupação dos britânicos, atrás da economia.
Entre os censos demográficos de 2001 e de 2011, a população da Inglaterra e do País de Gales aumentou 7%. A imigração, em sua imensa maioria legal, é a principal causa disso. O afluxo veio dos novos países-membros da UE – um quinto das chegadas - , mas também do subcontinente indiano, da África, do Oriente Médio e da Europa Ocidental. Mas a onda não se distribuiu de forma homogênea pelo país e se concentrou em cidades como Slough, onde a população cresceu 18% em uma década. Essa cidade, onde se encontram várias sedes de grandes empresas, tem um mercado de trabalho de baixa qualificação, que atrai os recém-chegados.
Sua rua principal é prova dessa diversidade. Depois dos mercadinhos mantidos pelos indianos vieram os dos poloneses, que vendem charcutaria e geleia do país. O café do centro comercial é mantido por um libanês, que empregou uma polonesa, uma húngara, uma ganense e um afegão. Na loja que oferece pequenos empréstimos bancários – geralmente algumas centenas de euros, destinados a fechar as contas do mês - , quatro dos cinco funcionários são poloneses.
No geral, os atritos continuam sendo poucos. É difícil encontrar em Slough uma voz negativa contra alguma minoria ou outra. A coesão é até notável, para uma cidade que agora só tem um terço de britânicos brancos, segundo o último censo. "Desde que cheguei, em 2006, nunca senti qualquer tipo de discriminação", conta Robert Burzynski, um engenheiro polonês. "Tem tantos imigrantes que é difícil atacar um grupo específico". Anna Wright, vereadora de Slough, ela mesma uma polonesa que chegou em 2005, confirma: "As comunidades não se misturam necessariamente, mas não chega a haver tensão entre elas."
Os indianos e os paquistaneses, que chegaram uma geração antes, são os únicos que se mostram severos. "Os poloneses bebem demais e os habitantes locais não encontram mais emprego por causa deles", se queixa Shabbir, dono de um mercadinho. Mas, em todo caso, ele tomou o cuidado de colocar algumas palavras em polonês em sua fachada...
Os novos imigrantes são até apreciados, sobretudo pelos empregadores, que os consideram trabalhadores e pouco exigentes quanto às condições de trabalho. A CIP Recruitment, uma agência de trabalhos temporários especialista em indústria alimentícia, 95% dos 600 funcionários são estrangeiros. "Os britânicos não querem trabalhar", acredita Paul Sheppard, um de seus diretores, embora ele mesmo seja inglês.
O problema dessa onda de imigração é outro: os serviços públicos e a infraestrutura estão sobrecarregados. A diretora da prefeitura, Ruth Bagley, faz a lista de suas demandas abissais. "Nós temos 6.500 moradias populares, todas ocupadas, e uma lista de espera de 7.500 pessoas. Nós temos onze escolas secundárias, mas as projeções indicam que é preciso construir mais seis e meia delas. Dentro das fronteiras administrativas da cidade, é algo impossível de se fazer. Slough sempre foi uma cidade muito receptiva, mas pressão é tanta que atingimos os limites físicos".
Não são somente as autoridades públicas que estão se queixando. Em Slough, o YMCA serve de moradia de emergência para pessoas em dificuldades. Seus diretores também acreditam que a pressão demográfica está se tornando insustentável. "Os assistentes sociais não têm mais tempo de fazer seu trabalho da forma devida", explica seu diretor, Colin Young. "Eu, que nasci em Slough, estou contente que tenha imigração, isso torna o lugar muito mais interessante. Mas fomos longe demais e não estamos mais dando conta."
O YMCA também tem um abrigo que recebe seis menores de idade em dificuldades: três vieram da África, dois do Afeganistão e um britânico. Entre eles está Lorissa, uma jovem de 17 anos, vinda de Camarões, que chegou a Slough aos 12 anos de idade. Quando atingir a maioridade, em fevereiro, a jovem, que continua frequentando a escola, corre o risco de ser deportada, uma vez que nunca obteve a nacionalidade britânica. "Minha vida é aqui. Estão me expulsando agora, mas por que deixaram que eu viesse cinco anos atrás?"
Para Edward Reiss, o presidente do YMCA local, "é preciso ser muito mais restritivo para reduzir o número de pessoas que chegam." Agora, até os assistentes sociais estão pedindo por um endurecimento das fronteiras...


Reportagem de Eric Albert. para o Le Monde, reproduzida no UOL

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