Premiê grego sai para tentar ganhar força
Com partido rachado após pacote, Tsipras renuncia na aposta de voltar com mais poder em nova eleição, em setembro
Sigla de esquerda radical fora eleita em janeiro com discurso contra austeridade, mas aceitou exigência de credores
O premiê grego, Alexis Tsipras, renunciou ao cargo, apenas sete meses depois do pleito que o levou ao poder, em janeiro, e pediu ao presidente Prokopis Pavlopoulos a convocação de nova eleição, provavelmente em 20 de setembro. Um governo interino será nomeado.
A renúncia é consequência do racha no Syriza (Coligação de Esquerda Radical), o partido do premiê, nas votações do pacote de reformas exigido pelos credores para que a Grécia acedesse a um novo socorro, agora de € 86 bilhões.
Um terço dos 149 deputados do Syriza discordou de Tsipras: foram 32 votos "não", 11 abstenções, 1 ausência e 3 votos a favor do texto geral, mas contra algumas medidas em particular.
Ou seja, o premiê perdeu a confiança de fatia substancial de seu próprio partido e, como é da praxe no parlamentarismo, tem de renunciar.
A expectativa de Tsipras é a de ganhar um mandato com mais força e que a eleição seja uma aprovação da população às reformas.
Convém lembrar que o Syriza já não alcançara, na eleição de janeiro, a maioria absoluta (seriam 151 das 300 cadeiras do Parlamento). Teve de aliar-se a um grupo ideologicamente incompatível, os Gregos Independentes (nacionalistas), mas que coincidiam com Tsipras na rejeição ao pacote de austeridade imposto à Grécia.
Os gregos votaram duas vezes seguidas contra as medidas de austeridade: primeiro ao dar a maioria ao Syriza, depois ao votar "não" em plebiscito convocado pelo partido para decidir se aceitavam ou não a proposta europeia em troca de um novo balão de oxigênio.
Não obstante, Tsipras acabou aceitando o pacote duas vezes rejeitado, o que explica o racha no seu partido.
Só conseguiu vender ao Parlamento as exigências dos credores porque obteve o apoio dos partidos que impuseram a primeira onda de austeridade –exatamente aqueles partidos contra os quais o Syriza fez campanha e venceu em janeiro.
Aqui entra análise recente do "Financial Times": "A grande questão levantada pela vitória eleitoral do Syriza em janeiro não é a respeito da Grécia. É se qualquer população nacional que adotou o euro pode expressar uma escolha democrática de maneira que tenha sentido".
Completa: "Se a união monetária e a democracia são incompatíveis, até os mais comprometidos amigos do euro precisam escolher a última".
Tsipras fez essa escolha ao convocar o plebiscito. Afinal, não há nada mais democrático do que deixar que seja o eleitorado quem decida se quer ou não adotar determinadas políticas.
Não adiantou nada porque os credores dobraram a aposta e Tsipras teve de se render.
DIREITA FASCISTA
Agora, volta ao leito da democracia, ao renunciar e convocar eleições. Mas o que elas significarão? Votar no Syriza já não representa repudiar a austeridade porque a coalizão de esquerda rendeu-se a ela.
Votar nos partidos que o antecederam e que, pela via da austeridade extrema, levaram a Grécia ao buraco seria incompreensível.
Pior: a alternativa agora é a extrema-direita fascista da Aurora Dourada.
Ou reeleger o Syriza reciclado e curvado à austeridade, não por gosto, mas por inevitabilidade.
A falta de alternativa não é exatamente uma característica da democracia, mas a Europa empurrou a Grécia a esse beco.
Reprodução da Folha de São Paulo.
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