Uma das perguntas mais intrigantes sobre Dirceu é a seguinte: se ele faturou em oito anos 39 milhões de reais com sua empresa de consultoria, por que a vaquinha para pagar a multa que lhe coube no Mensalão?
Alguns jornais trataram do assunto, mas com a habitual canalhice.
Para decifrar o enigma, fiz o óbvio: fui consultar a militância, num post no Facebook.
É um assunto que desperta paixões. O fato de eu simplesmente ter colocado a questão fez com que militantes mais apaixonados me criticassem fortemente.
Mas o fato é que o debate, de que participaram dezenas de pessoas, acabou jogando luzes sobre as sombras que existiam pelo menos para mim.
Primeiro, e acima de tudo, muitos dos participantes da discussão fizeram questão de deixar claro de que havia um caráter simbólico na doação a Dirceu.
Sabiam, segundo ele, que Dirceu não precisava do dinheiro, ao contrário de Genoino, o primeiro beneficiário das vaquinhas.
“Queríamos ver o Batman de Paracatu espumar de ódio”, escreveu um militante.
Ele se referia a Joaquim Barbosa, o carrasco do PT no Mensalão.
Um outro afirmou que era uma bofetada também em Gilmar Mendes, o tucano posto por FHC no STF sem que ninguém questionasse o baixo grau de republicanismo da escolha.
Os militantes deixaram claro um ponto: a vaquinha não partiu de Dirceu. Foi coisa da militância.
“A vaquinha foi simbólica”, disse uma petista. “Era somente para dizer que o PT e seus simpatizantes não concordavam com a condenação se utilizando do tal domínio do fato.
A maior parte da militância concordou com este ponto. Alguns disseram que voltariam a participar com alegria de uma nova vaquinha por Dirceu.
Voltei a ser confrontado num certo momento.
“A tal vaquinha foi simbólica”, escreveu um simpatizante. “Não entendi o Paulo Nogueira ter levantado esta questão. Talvez a colocação correta fosse esta: por que Dirceu não rejeitou a vaquinha?”
Respondi que, sendo jornalista e não militante, via as coisas com menos paixão. Queria apenas entender a história.
E claro: por que ele não rejeitou, então?
A hipótese mais provável é que Dirceu tenha achado que não havia como rejeitar, uma vez iniciado o mutirão.
Poderia ser um sinal de que ele tinha mais dinheiro do que o esperado pela militância.
Um dos debatedores citou Mujica, e foi pouco notado ali na multidão.
Mas a mim chamou a atenção.
Você não consegue imaginar Mujica numa situação parecida, dono de uma consultoria que fatura 39 milhões de reais em oito anos.
Mujica, numa entrevista recente, disse que quem gosta de dinheiro deve ser empresário, e não político.
No Brasil, salvo poucas exceções, políticos de direita, de centro e de esquerda parecem gostar muito de dinheiro.
Ninguém está falando em voto de pobreza, mas convém olhar para Mujica e, para citar outro exemplo, o Papa Francisco.
Sou jornalista, e como tal apartidário.
Mas se tivesse que dizer alguma coisa aos petistas, neste momento tão complicado para eles, é: olhem para Mujica e para Francisco. Para seu despojamento, para sua simplicidade, para seu desapego das coisas de luxo.
A resposta está neles.
Texto de Paulo Nogueira, no Diário do Centro do Mundo.
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