domingo, 23 de agosto de 2015

Filme sobre patriarcado em Israel desnorteia

CRÍTICA CINEMA/DRAMA

Filme sobre patriarcado em Israel desnorteia

Força de 'O Julgamento de Viviane Amsalem' é revelar de forma singular uma longa e penosa tentativa de divórcio
SÉRGIO ALPENDRECOLABORAÇÃO PARA A FOLHA

É quase uma reinvenção do filme de tribunal. Ao mostrar o longo processo de divórcio entre Viviane (Ronit Elkabetz) e Elisha (Simon Abkarian), "O Julgamento de Viviane Amsalem" revela-se um belo drama entre quatro paredes sobre o patriarcado em Israel.
Essas quatro paredes não são as de um tribunal convencional, do tipo que vemos frequentemente no cinema, mas de uma sala bem iluminada onde juízes rabinos tentam alguma solução para uma pendenga que só o marido pode solucionar.
A atriz principal, Elkabetz (protagonista do ótimo "Casamento Arranjado", de 2001), dirige o filme, acompanhada de seu irmão Shlomi Elkabetz. É o terceiro longa que comandam juntos.
O início é forte. O advogado encara Viviane, que ainda não foi revelada pela câmera. Em seguida, dirige-se aos juízes, resumindo o problema: Viviane pediu o divórcio há três anos e saiu de casa. Só agora o marido resolveu aparecer a uma audiência.
E é justamente ele que vemos em seguida. Seu rosto inspira piedade. É um homem de traços fortes, mas parece gentil demais para ser um vilão (impressão que será modificada várias vezes).
Elisha fala com Viviane, implora para ela voltar, e ela não responde. Por isso, a câmera não a mostra ainda.
O advogado dela, Carmel Ben Tovim (Menashe Noy), conversa com o juiz principal, mas só vemos o marido, desapontado. Sabemos onde Viviane está, mas não sabemos como ela reage por enquanto.
A renúncia temporária em nos mostrar o outro lado faz com que demoremos para tomar conhecimento de tudo que está em jogo. E, assim, somos manipulados pela direção.
Quando Viviane finalmente aparece, ela encara Elisha com um olhar firme, mas ressentido. É um olhar que nos faz pender para seu lado. Ao mesmo tempo, Elisha só nos é antipático porque não quer ceder o divórcio. Ele detém o poder. Absurdamente, os juízes não podem fazer nada.
Não somos desnorteados apenas pelo que a câmera escolhe mostrar. Estamos o tempo todo sem saber como será a próxima cena, qual será o próximo movimento narrativo. Sabemos apenas que a coisa beira o surreal.
O processo todo demora mais quatro anos, com várias audiências, as paredes da sala envelhecendo com os personagens. As testemunhas se multiplicam, muitas vezes fornecendo alívio cômico ao drama de Viviane. A força do filme vem dessa maneira singular de mostrar uma situação demasiadamente injusta.

O JULGAMENTO DE VIVIANE AMSALEM
(GETT)
DIREÇÃO Ronit Elkabetz e Shlomi Elkabetz
ELENCO Ronit Elkabetz, Simon Abkarian, Menashe Noy
PRODUÇÃO Israel/França/Alemanha, 2014, 10 anos
QUANDO estreia nesta quinta (20)
AVALIAÇÃO muito bom


Reprodução da Folha de São Paulo

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