sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Os sofismas sobre a independência do Banco Central

Uma das grandes confusões de economistas e estatísticos se dá na definição das relações de causa e efeito.
Um dos bordões usuais é a afirmação que todos os países com Banco Central independente melhoraram no controle da inflação.
A afirmação é falsa. As pesquisas indicam que a regra vale apenas para países industrializados e com moedas conversíveis.
Funcionário do Banco Central, Márcio Antônio Estrella compilou os principais estudos sobre independência vs inflação, e publicou o paper "Moeda, Sistema Financeiro e Banco Central - uma abordagem teórica e prática sobre o funcionamento de uma autoridade monetária no Brasil e no mundo".
"No tocante aos países emergentes, os estudos são mais escassos e, mesmo os que enfocam países emergentes, vários autores não encontraram nenhuma relação significativa entre inflação e a independência legal dos bancos centrais", diz o trabalho.
Quando se utiliza como critério de independência a rotatividade dos presidentes de BCs, se obtém uma "clara relação inversa entre inflação e a sua independência legal".
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Por aí se percebe a confusão na definição da causalidade.
A correlação correta não é entre BC independente e inflação em baixa, mas entre BC independente e países industrializados com moedas conversíveis.
Nesses países, a própria estabilidade reduz os riscos de estragos na atuação do BC. A variação das taxas básicas vai de zero a 4 pontos ano. Os efeitos sobre o câmbio são mínimos. Os canais de transmissão dos juros, desobstruídos. É uma situação totalmente diversa de países como o Brasil, no qual a independência funcional do BC permitiu - no início do plano Real - que mantivesse a taxa de juros em inacreditáveis 45% ao ano sem ser contido.
Mesmo assim, como lembrou o Nobel Joseph Stiglitz, na crise, “países com bancos centrais menos independentes, como Brasil, China e Índia, se saíram muito, mas muito melhor do que países com BCs mais independentes, como a Europa e nos Estados Unidos”.
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Isso se deve a uma característica necessária dos BCs, jamais levantada nas discussões brasileiras: a independência em relação aos mercados.
Segundo um dos maiores estudiosos do tema, o economista norte-americano Alan Blinder, "o acompanhamento das reações dos mercados deve ser realizado sem representar uma submissão da autoridade monetária aos mercados até porque, em muitos momentos, a política do banco central precisa enfrentar e até confrontar o mercado".
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Hoje em dia, o BC está capturado pelo mercado. Não há a menor preocupação com impactos fiscais e cambiais da política monetária.
Estaria em condições de assumir as prerrogativas de um BC independente. Ser independente significaria:
Poder para definir metas e objetivos e liberdade operacional para definir como atuará para atingi-las.
Irreversibilidade das decisões. No sistema americano, diz o trabalho, nem o presidente nem a Suprema Corte podem anular decisões do Federal Open Market Commitee (FOMC).
Liberdade para definir taxas de câmbio.
Garantia total para a diretoria do BC de que, em conseqüência de suas ações, dentro dos preceitos legais, seus componentes não serão exonerados ad nutum pelo presidente do país.


Texto do Blog do Luís Nassif

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