No início deste mês, em 8 de setembro, o jornal Valor Econômico publicou uma entrevista com o conselheiro de Marina Silva, Eduardo Giannetti. O bom trabalho de jornalismo das repórteres Denise Neumann e Catherine Vieira resultou em respostas bastante claras do economista, e surpreendentemente sinceras.
Ele afirmou, por exemplo, que os compromissos sociais do programa de governo de Marina dependem do equilíbrio fiscal para serem cumpridos. Garantiu, além disso, que no caso da vitória da candidata, a indústria deve se preparar para uma “operação desmame”. “Ela [a indústria] está acostumada a chorar e ser atendida. Ela vai ter que se acostumar a uma situação em que será vitoriosa se for bem na competição”.
Para cumprir o compromisso de não aumentar a carga tributária, Giannetti confessou que será necessário cortar despesas. A questão continua a ser: onde? Ele admitiu que é difícil responder de fora do governo, mas identificou “uma extravagância muito grande na expansão do crédito subsidiado no Brasil” e “uma isenção da Cide sobre combustível que prejudica a arrecadação”.
A entrevista repercutiu muito. Principalmente entre os adversários. A presidente Dilma não demorou a se posicionar, demonstrando preocupação com o programa que, ela afirmou, “reduz a pó” a política industrial brasileira, pois “tira o poder dos bancos públicos de participar do financiamento da indústria e da agricultura”.
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, seguiu na mesma linha, garantindo em entrevista ao jornal O Globo que as mudanças vão “desmontar a política industrial”. “Vai abrir a economia e submeter a indústria à competitividade. Ou seja, vão quebrar a indústria desse país. Isso se chama tratamento de choque neoliberal. Isso é clássico”, disse.
No entanto, o Jornal GGN procurou especialistas nos setores industrial e agropecuário e a surpresa é que o choque neoliberal foi muito bem aceito e bastante defendido por eles.
O ponto de vista da indústria
Para Carlos Pastoriza, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (ABIMAQ), as medidas preparam terreno para uma reforma tributária. “Esse choque político vai provocar uma confiança tão grande que rapidamente as torneiras de investimento nacional e estrangeiro vão voltar a jorrar”, acredita.
Ele afirmou que “os ajustes necessários podem até ter um primeiro momento recessivo”. Mas entende que é um mal necessário. “Vai ter um impacto no emprego, com certeza. Eu vejo o que a Espanha fez. O país está com um desemprego cavalar, de 25%, e cortou gastos, causou desemprego, para sair dessa situação deficitária”, lembrou.
Ainda assim, ele defendeu o caminho proposto por Giannetti. “A entrevista que ele deu está em perfeita sintonia com o que a ABIMAQ acredita. Essas reformas são duras, difíceis, politicamente amargas, mas absolutamente necessárias”.
Na opinião de Pastoriza, o único ponto de atenção - o corte que não pode ser realizado - é no financiamento do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) para máquinas e equipamentos. “Não pode acabar com o Finame. É a única linha de crédito que existe no Brasil para financiar compras de máquinas. Não existe nem no mercado privado. Essa linha é absolutamente necessária. Se tirar, os investimentos da formação bruta caem pela metade”, alertou.
A opinião do agronegócio
O diretor executivo da Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG), Luiz Cornacchioni, tem um ponto de vista parecido. Para ele, a fala de Giannetti é sobre “uma reforma fiscal para enxugar o Estado”. “Ele deve fazer o reequilíbrio da carga tributária, reduzindo os gastos públicos”.
As medidas seriam necessárias para aumentar a competitividade do setor agrícola. “Este ano, do ponto de vista da produção, a safra vai ser boa, mais de 200 milhões de toneladas. Mas a gente não tem mais os preços, os patamares hoje são inferiores”, explicou.
O diagnóstico de Cornacchioni aponta para uma queda nos investimentos em máquinas e equipamentos. “O custo de logística é muito alto, três vezes maior do que o dos concorrentes argentinos e americanos. Os investimentos estão paralisados. A conta frete é 25%, então, o que o fazendeiro faz? Tira o pé. Se o trator aguenta mais um ano, não troca o trator. E isso afeta toda a cadeia de fornecedores”.
Questionado se um corte no crédito subsidiado não agravaria ainda mais a situação, ele disse que não, uma eventual perda no poder de inovação do produtor, com o aumento da Taxa de Juros de Longo Prazo, seria compensada pela alta do câmbio. “O câmbio está artificialmente do jeito que está. E deve sentir rapidamente o choque”.
Cornacchioni defendeu também o fim da isenção da CIDE. “O setor sucroalcooleiro está sofrendo como nunca sofreu antes. Não dá pra segurar o preço do combustível e quebrar o setor”, disse.
Inclusive, ele não teme uma onda de desemprego. “Eu sou otimista na questão do emprego. Eu acho que se mantém, pois teremos uma safra muito boa, do ponto de vista da produção. Isso emprega muita gente para plantar, colher e transportar”.
“Eu acho que o Gianetti atacou os pontos que têm que ser atacados. O Armínio Fraga [presidente do Banco Central no governo FHC e principal assessor econômico da campanha de Aécio Neves] ataca os mesmos pontos. Vamos ter um período amargo? Vamos. Mas precisa mexer, ou os impactos no longo prazo vão ser piores”, finalizou.
Reportagem de Luiz de Oueiroz, no Jornal GGN.
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