domingo, 28 de setembro de 2014

Livro mostra crimes e ação política de dinastia dos EUA

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CRÍTICA JORNALISMO

Livro mostra crimes e ação política de dinastia dos EUA

Jornalista expõe práticas de família dona de gigante do setor petroquímico
RODOLFO LUCENADE SÃO PAULO

Danielle Smalley era uma garota linda, de cabelos escuros caindo abaixo dos ombros, franjinha marota, sorriso sempre presente. Aos 17 anos, não temia assumir responsabilidades: era a presidenta do clube de teatro de sua escola.
No dia 24 de agosto de 1996, viu que precisava fazer alguma coisa ao sentir o forte cheiro de gás que tomava conta do pequeno trailer onde vivia com o pai e a irmã no condado de Kaufman, no Texas. O fogão estava funcionando bem, o vazamento deveria ser em algum outro local. E era grande.
Como os Smalley nem sequer tinham telefone, ela se prontificou a ir até um vizinho para dar o alarme. Com o amigo Jason, pegou a velha caminhonete do pai para cumprir a tarefa. A picape de mais de 30 anos rodou uns 200 metros e apagou. Danielle girou a chave. Nada. Tentou de novo.
A explosão espalhou fumaça, fogo e desespero. O pai da adolescente, um mecânico de 40 anos, correu desesperado em direção às chamas, mas não havia chance de encontrar os jovens com vida. Os corpos carbonizados ficaram irreconhecíveis; só foram identificados pelos restos dos órgãos genitais.
O acidente que destroçou a família Smalley também lançou luz sobre as condenáveis práticas empresariais do complexo petroquímico Koch Industries (KI), a segunda maior empresa privada de capital fechado dos Estados Unidos, que no ano passado faturou US$ 115 bilhões.
Por economia, a empresa adiava os trabalhos de manutenção ou deixava sem conserto trechos inteiros de sua rede de distribuição de gás, que se estendia por dezenas de milhares de milhas pelo subsolo dos Estados Unidos. "Nós cometemos erros", admitiu em julgamento Bill Caffey, então vice-presidente da corporação. Disse também: "A Koch Industries é definitivamente a responsável pela morte de Danielle Smalley".
Não só pela morte dos dois jovens como também por uma série de desastres ambientais, crimes empresariais e interferência na política norte-americana, como deixa claro o livro "Sons of Wichita" ("filhos de Wichita", cidade no Kansas onde fica a sede do grupo). A obra tem um extenso e esclarecedor subtítulo: "Como os irmãos Koch se tornaram a mais poderosa e privada dinastia dos Estados Unidos".
O livro é resultado de uma extensa pesquisa do jornalista Daniel Schulman, editor sênior do escritório de Washington da "Mother Jones", organização jornalística sem fins lucrativos especializada em reportagens investigativas, especialmente sobre questões políticas e sociais.
Mergulhando em processos e decisões judiciais, reportagens e livros publicados ao longo das últimas décadas, além de série de entrevistas feitas por ele mesmo, Schulman apresenta a anatomia de um gigante corporativo cuja ação apenas nos últimos anos se tornou mais conhecida.
Seus tentáculos se estendem pelas mais diversas áreas da indústria, do refino de petróleo a toalhas de papel para uso em cozinha. São tantos os segmentos que a revista econômica "Forbes" não crava uma área de atuação para a KI; na sua lista de maiores corporações privadas dos EUA, classifica o grupo como multicompanhia.
O complexo se atirou também à política. Charles e David Koch, os irmãos que comandam o gigante, se notabilizaram nos últimos anos como uma das principais forças econômicas a dar suporte ao grupo direitista conhecido como Tea Party.
O livro mostra que isso não é novidade na família. Fred K. Koch (1900-1967), o patriarca e criador da empresa, foi um dos fundadores da organização racista e ferrenhamente anticomunista John Birch Society. Inculcou nos filhos crenças radicais libertárias, contra a ação do Estado e em defesa sem quartel do livre mercado.
Não conseguiu, porém, dar aos herdeiros espírito de solidariedade fraterna. Ao contrário. Seus filhos se enfrentaram em dolorosas batalhas jurídicas ao longo de anos, que exibiram detalhes sórdidos da vida empresarial e até intimidades dos irmãos.
O livro é mais do que a anatomia de uma corporação e de uma dinastia empresarial. Mostra um pouco do estilo de vida de bilionários e expõe o mundo privado das relações entre corporações e políticos. E diverte o leitor.

"SONS OF WICHITA"
AUTOR Daniel Schulman
EDITORA Grand Central Publishing
QUANTO US$ 30 (432 págs.)
AVALIAÇÃO Bom


Reprodução da Folha de São Paulo

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