quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Ascensão do antissemitismo na França faz crescer imigração para Israel

O governo francês está preocupado. Acredita que há surtos inaceitáveis de antissemitismo. O presidente François Hollande, o primeiro-ministro Manoel Valls e o ministro do Interior, Bernard Cazeneuve, lançaram alertas nestas semanas de maneira reiterada. Valls reagiu duramente no final de agosto ao ataque a sinagogas e contra o que não se ouvia há décadas nas ruas de Paris: "Morte aos judeus". A guerra de Gaza exaltou os ânimos, e o medo está instalado entre as comunidades judaicas europeias.

"Minha amiga acaba de partir com toda a família. Agrediram na rua seu pai de 80 anos, e ela disse: 'Agora chega'", conta a "El País" um judeu de Paris que prefere manter o anonimato.
Joël Mergui, presidente do Consistório Israelita da França, não duvida de que haja um antissemitismo crescente e um certo ataque à liberdade religiosa, que projeta dúvidas sobre o futuro nesse país. "Muitos consideram que este não é mais seu lugar", afirma Roger Cukierman, presidente do Conselho Representativo das Instituições Judaicas da França. Philip Carmel, conselheiro do Congresso Judaico Europeu, afirma: "Os que partem são apenas 1%. Para 99%, o país oferece um futuro."
Na França, que tem a maior comunidade judaica do continente (600 mil cidadãos), as expatriações com destino a Israel dispararam, transformando-a no país que mais cidadãos enviou este ano. Em 2012, apenas 2.000 judeus franceses partiram para Israel. Já em 2013, eles aumentaram para 3.280. Nos oito primeiros meses deste ano, foram 4.566, segundo o Ministério Israelense da Integração, quase o dobro dos que partiram da Rússia ou dos Estados Unidos.
A última pesquisa da Agência de Direitos Fundamentais da UE (União Europeia), realizada em novembro passado, concluiu que 76% dos judeus europeus acreditam que a situação se agravou nos últimos cinco anos. Um em cada três sofreu agressão física. Os insultos, o assédio e a violência não são fatos isolados, nem na França.
A crise econômica é sem dúvida uma razão fundamental da fuga. "O futuro é incerto, e sobretudo os jovens querem se desenvolver profissionalmente", diz Zvi Tal, ministro plenipotenciário da embaixada de Israel em Paris. Em algumas reportagens audiovisuais realizadas em Israel pela mídia francesa nesses dias, boa parte das famílias interpeladas reconhece que o antissemitismo também as animou a partir.
A internet favoreceu a desinibição na divulgação de mensagens antissemitas, concordam as fontes consultadas em Paris. O governo de Hollande, muito criticado neste verão por proibir dois protestos violentos nos quais houve gritos antissionistas e antissemitas, está analisando como controlar o fenômeno digital junto com Israel.
Mas seu maior temor são o jihadismo e os combatentes europeus que regressam da Síria radicalizados. Mais de 800 franceses se envolveram no conflito e alguns já são tristemente famosos por seus atos terroristas. Mehdi Nemmouche, francês de 29 anos, matou em maio quatro pessoas no Museu Judaico de Bruxelas. Agora se sabe que ele foi o carcereiro do Estado Islâmico de quatro jornalistas franceses libertados em abril.
Nemmouche, já extraditado para a Bélgica, é, segundo seus antigos reféns, um homem muito violento e antissemita, que prometia "arrastar pelas tranças os pequenos judeus" antes de matá-los. Seu herói é Mohamed Merah, outro ex-combatente francês, que supostamente matou sete pessoas há dois anos em Toulouse, entre elas um professor e três crianças de uma escola judaica.
A comunidade muçulmana francesa soma 6 milhões de pessoas. "É uma pena que, em vez de aproveitar a convivência entre comunidades tão grandes para estabelecer um diálogo na Europa, só se tenha conseguido estender para cá o conflito no Oriente Médio", diz com pesar Rivon Krygier, um rabino em Paris.

Reportagem de Gabriela Cañas, para o El País, reproduzido no UOL. Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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