quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Bem antes de Gaza-2014

A guerra é tanto a expressão comum de emoções humanas como parte constitutiva do modo em que um grupo constrói sua coesão. A noção de uma sociedade harmoniosa, com seus membros reagindo às mesmas ameaças e planejando um futuro comum, floresceu com mais intensidade no lado judaico que no palestino. Isso não é bom para o equilíbrio político da região.
Os líderes palestinos vêm fazendo mais escolhas estratégicas equivocadas do que os israelenses. Em vez de reconhecerem que Israel é produto de um legítimo processo histórico endógeno de aspiração nacional, insistem em vê-lo como fruto de ação exógena ocidental devido a um complexo de culpa pelo Holocausto.
A história mostra uma cadeia de acontecimentos desde a Declaração Balfour (1917), à Declaração de San Remo (1920) e à Liga das Nações (1922), confirmando o apoio à criação de um Estado judeu na região, decisões ignoradas pelos árabes.
Em 1937, o lorde William Peel, em nome do Reino Unido, sugeriu a partição da Palestina em dois Estados. Um árabe, que se juntaria à Transjordânia, representando cerca de 80% do mandato original da Palestina, e os 20% restantes para os judeus. A liderança sionista pragmaticamente aceitou a proposta.
Todavia, a reação do líder palestino --mufti Hajj Amin al-Husseini, dito mufti de Jerusalém, que se aliou posteriormente a Hitler-- foi de rejeição à partilha, assim como a de outros líderes árabes, com exceção do rei Abdullah, da Transjordânia.
Ele viu na partilha um trampolim para ampliar o vasto império que almejava criar. O mufti evocou argumentos religiosos, posteriormente usados pelo Hamas. A Palestina era uma terra proibida de ser dividida, mesmo que minoritariamente, com os judeus. Para ele, o judaísmo é uma religião e, destarte, os judeus não precisam de um território. Daí, Israel ser chamado de entidade sionista pela maioria dos palestinos. Esse é o fulcro do problema que persiste até hoje.
Em 1939, os palestinos perderam uma inigualável oportunidade de evitar a criação do Estado de Israel. O então novo secretário britânico para as colônias, Malcolm MacDonald, lançou uma política contrária à proposta de James Balfour e Peel. Por ela, após dez anos de transição, em 1949, seria criado um Estado único para árabes e judeus, com maioria demográfica dos primeiros.
Era um plano bem mais favorável aos árabes palestinos do que aos judeus palestinos. Foi estabelecida uma cota de 15 mil judeus imigrantes por ano para o período entre 1940 e 1944 e uma cota suplementar de 25 mil para cobrir possíveis casos de refugiados de emergência. A Palestina tornar-se-ia um Estado independente, e os judeus seriam, no máximo, um terço da população.
Uma nova imigração judaica dependeria da permissão da maioria árabe, e seriam estabelecidas severas restrições à compra de terras pelos judeus. Os árabes, mais uma vez, não acataram essa proposta. Acreditaram que com a vitória do Eixo na Segunda Guerra Mundial, acoplada a um suposto levante árabe na Palestina, provocaria a rápida expulsão dos judeus. Fatídico erro de cálculo. A Alemanha foi derrotada e aumentou o número de judeus naquela região.
Em 1947, houve a partilha da Palestina. Mais uma vez, os árabes não concordaram com ela. Irrompeu a guerra e o novo Estado árabe não nasceu, pois foi abocanhado por Egito, Israel e Jordânia. Depois houve a Guerra de Suez (1956), a dos Seis Dias (1967) e a do Yom Kippur (1973), afora os conflitos com árabes islâmicos no Líbano e em Gaza.
O Hamas engana seu próprio povo ao insistir que pode exterminar Israel. Está na hora de os palestinos aprenderem com seus sucessivos erros estratégicos e trabalharem para a criação de dois Estados antes que seja tarde.


Texto de Jorge Zaverucha, publicado na Folha de São Paulo

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