segunda-feira, 23 de junho de 2014

Dez anos sem Brizola, o galo


Há dez anos, morria o grande Leonel de Moura Brizola, o homem da Legalidade. Hoje, quero falar como a ele se referem os gaúchos nas ruas, nos bares e em qualquer simples: esse era galo. É assim que se diz. O velho Briza era de faca na bota. Esse era dos nossos. As expressões populares destacam a coragem, o ímpeto, o espírito de fogo, o entusiasmo e o engajamento do líder trabalhista. Houve poucos como Brizola neste nosso universo político de eternos defensores do poder e de reprodutores das desigualdades. Brizola errou e acertou como todo mundo. Acertou muito mais. Nunca se omitiu. Além de ter sido um grande construtor de escolas, iniciou a reforma agrária no Rio Grande do Sul.
Fazer isso exigia fibra, valentia e determinação.
Em 1961, Brizola impulsionou o MASTER, o Movimento dos Agricultores Sem Terra, antecessor do MST. Naqueles tempos de vergonhosa concentração de terras, deu uma estocada magistral no latifúndio soberano e intocável. Brizola criou o Instituto Gaúcho de Reforma Agrária. Na Fazenda Sarandi, berço da reforma agrária, enfrentou o absurdo: 20 mil hectares improdutivos. Em 1962, bancou a reforma agrária do Banhado do Colégio, em Camaquã, 25 mil hectares para famílias desesperadas por trabalho. Para coroar seu reformismo, usou 45% das terras herdadas por sua mulher, Neusa, para uma experiência, na fazenda Pangaré, em Palmares: 30 agricultores receberam 1.038 hectares para a instalação da cooperativa Bacopari. A imprensa e os setores conservadores caíam de pau em cima dele. Nunca seria perdoado.
Tocou no ponto mais sensível do conservadorismo.
Foi o melhor governador da história do Rio Grande do Sul. Encampou as companhias estrangeiras de luz e telefone. Deu um tapa na cara do parasitismo internacional que prestava maus serviços, ganhava muito dinheiro e ignorava os apelos dos seus clientes. Eu me orgulho de ter escrito um livro, “Vozes da legalidade”, em homenagem às façanhas de Brizola. Guardo as primeiras linhas na ponta da língua: “Conta-se que o caçula rejeitou o próprio nome antes mesmo de saber o significado de um nome, como se houvesse uma misteriosa educação pelo nome, uma pedagogia da identidade, ele que, depois de se impor um nome, faria ecoar seu sobrenome pelo mundo inteiro, como se em cada etapa da sua vida precisasse de um novo batismo, chamando para si, numa solidão orgulhosa e inexplicável, por vezes melancólica e demorada, a tarefa de sentir o momento da virada e de se renomear até alcançar renome. Nascido Brizola, em Cruzinha, pedaço de Carazinho, distrito de Passo Fundo, no Rio Grande do Sul, em 22 de janeiro de 1922, chamado de Itagiba por uma mãe zelosa e aflita…”
Itagiba virou Leonel, que virou Leonel Brizola. Andou pelo mundo. Viveu a amargura do exílio. Coloriu os debates políticos com sua retórica maravilhosamente floreada de metáforas e tiradas espirituosas. Deixou um legado, do seu governo no Rio Grande do Sul, de 5902 escolas, 278 escolas técnicas e 131 ginásios. Até hoje, não foi batido.
Esse era galo.
Daí o ódio por ele dos conservadores.

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