terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Governo, empresários e rentistas

Governo, empresários e rentistas
Poderá o governo conquistar o apoio dos empresários e neutralizar a poderosa coalizão liberal?
Nos países mais avançados da Europa, é normal haver a alternância no poder entre partidos conservadores e social-democráticos --uma alternância que sinaliza a boa qualidade da democracia europeia ao mostrar que a classe capitalista é capaz de aceitar um governo que não seja seu representante direto.
Mas o governo social-democrata não pode ser contra a burguesia; ele pode ser eleito sem seu apoio, mas não tem alternativa a não ser governar com ela.
O PT, no poder há quase 11 anos, compreendeu esse fato. Por isso, desde o início do seu governo, Lula procurou estabelecer um pacto desenvolvimentista com os empresários, enquanto a coalizão, formada pela alta e média burguesia rentista e pelos financistas, ficou de fora, e seus economistas, calados.
No último ano, porém, ficou claro que o governo Dilma não lograria apresentar o mesmo desempenho econômico que o de seu antecessor, dada a sobreapreciação cambial que herdou.
Isso levou a coalizão financeiro-rentista a recuperar forças, enquanto seus economistas passaram a "explicar" o baixo crescimento. Ele seria consequência da política industrial, particularmente da política de desonerações, que "confundiria" os empresários e os levaria a não investir. A explicação não fazia sentido, mas ganhou certa credibilidade com a redução no superávit primário e um aumento da inflação.
A presidente e seus ministros mais próximos, por sua vez, apostaram na política industrial de desonerações para compensar a sobreapreciação cambial herdada do governo anterior e fracassaram.
Ignoraram que esse resultado fora alcançado nos anos 1970 graças a tarifas de importação e subsídios à exportação de manufaturados de, em média, 45%. Hoje, depois da OMC, isso é impossível.
Diante do fracasso da política industrial e do baixo crescimento causado pela sobreapreciação cambial de longo prazo existente no Brasil, a burguesia rentista e seus economistas liberais buscaram cooptar para sua causa os empresários, embora seus interesses sejam conflitantes, enquanto a presidente mostra dificuldade em fazer com eles o pacto desenvolvimentista.
Estamos diante de uma queda de braço em torno do empresariado industrial. De um lado, a presidente e o governo como um todo buscam seu apoio; de outro, o sistema financeiro-rentista busca falar em seu nome, como se não existisse conflito entre empresários e rentistas.
Enquanto o governo busca retomar o desenvolvimento, mas não tem suficiente apoio na sociedade para desvalorizar o câmbio, a coalizão financeiro-rentista está determinada a recuperar o nível alto da taxa de juros real --sempre seu objetivo maior.
Para isso, é necessária uma Selic alta e uma inflação baixa, esta associada a um câmbio valorizado. E já está tendo algum êxito. Sem uma política fiscal contracionista, o Banco Central voltou a aumentar os juros, enquanto, preocupado com a inflação, esforça-se para evitar a depreciação cambial determinada pela queda da oferta de dólares.
Como se resolverá esse conflito e esse impasse político? Poderá o governo conquistar o apoio dos empresários e neutralizar a poderosa coalizão liberal?
Isso só será possível se o governo lograr a retomada do desenvolvimento, mas nada indica que isso esteja à vista, porque não conseguiu tirar o país da armadilha rentista de juros altos e câmbio apreciado e, por isso, não logrou consolidar um pacto político desenvolvimentista.


Texto de Luiz Carlos Bresser-Pereira na Folha de São Paulo

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