quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

A conversa e a desconversa de Aécio

AÉCIO NEVES tomou a atitude elogiável de lançar um pré-programa de governo, uma "agenda para o país", como diz o clichê. Não é lá grande coisa, mas é alguma coisa, algum debate, enfim.
O texto dos "12 pontos" do candidato tucano parece a conversa dos programas eleitorais de TV. Em grande parte é um blá-blá-blá genérico permeado de simplificações grosseiras e desconversas, promessas de fazer omeletes com ovos na casca.
Para começar, chuta com os dois pés os governos "dos últimos anos" e da "última década". Não fica claro se coloca Dilma Rousseff e Lula no mesmo saco.
O governo do PT seria um vale-tudo sem-vergonha que mente, abusa da máquina pública, abusa de estatais, desmoraliza a política, coopta sindicatos, entidades e movimentos sociais e tolera a corrupção a fim de se manter no poder.
O que diz de menos inespecífico sobre economia (aqui, no caso, política macroeconômica)?
Que o Brasil está desacreditado, tem inflação alta, cresce pouco e tem deficit externo em alta. Que o gasto "ilimitado" compromete as contas públicas. Bidu.
A "agenda" é levar a inflação para a meta, com "tolerância zero" (haveria, pois, um choque em 2015? Isso é tolerância zero).
Para (não) variar, um "choque de gestão" reduziria os gastos. Por exemplo, haveria menos ministérios. Haja paciência.
Sim, precisamos muito de "gestão", mas isso não resolve problema fiscal, as contas desequilibradas do governo. Mesmo a melhor gestão da galáxia não pouparia o bastante para dar conta de qualquer política fiscal melhorzinha.
Francamente, Aécio e tucanos acham mesmo que, "nos últimos anos, a máquina estatal agigantou-se e passou a consumir recursos escassos que deveriam estar servindo à melhoria da qualidade de vida dos brasileiros"? O grosso do gasto volta em forma de transferências (INSS, Bolsa Família, benefícios para idosos e deficientes, seguro-desemprego e assemelhados), pouco vai para o "custeio da máquina".
A distribuição das aposentadorias pode ser injusta. Aécio vai mexer nisso? Na Previdência? Silêncio. Mas vai gastar mais em saúde, coisa a que, diz, este governo se opôs.
Para piorar, parece que Aécio não deixou de ser governador, ou acha muito importante cativar prefeitos e governadores, pois insiste temerariamente no novo "pacto federativo". Isto é, grosso modo, a União, governo federal, deve ficar com menos dinheiro dos impostos, em favor de Estados e municípios.
Como arrumar as contas federais, reduzir a carga tributária (não é essa a ideia?), gastar mais em saúde, segurança e abrir mão de receita? Não dá, pelo menos nos próximos quatro anos. Aécio ainda reclama da "dívida impagável" de Estados e municípios com a União. Vai então abrir mão de mais receita?
Onde vai poupar? O texto desconversa sobre aumentos do salário mínimo acima da inflação, os quais inflam os gastos com benefícios sociais e outras despesas públicas. O mínimo será "adequado", diz lá o texto.
O documento quer saber "onde foi parar cada centavo emprestado pelo BNDES". Quase todo para empresas, as maiores do Brasil. Aécio vai fazer devassa no sigilo bancário delas? Tudo bem. Mas vai? Enfim, o que fará do BNDES?


Texto de Vinicius Torres Freire, na Folha de São Paulo.

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