Um texto da grande mídia me chamou particularmente a atenção na semana passada.
O motivo é que ele era extraordinariamente revelador da mentalidade que domina as corporações jornalísticas.
O autor do texto é o jornalista Fernando Rodrigues, do UOL.
Ele escreveu sobre o “constrangimento” imposto ao “homem mais rico do país”, Jorge Paulo Lemann, por este ser obrigado a usar o elevador comum numa visita a Dilma no Palácio do Planalto.
Usar elevador comum é fonte de constrangimento: este é o ponto de Fernando Rodrigues.
Um fotógrafo reconheceu Lemann e registrou a cena. Rodrigues classificou-a, triunfante, como um “furo”.
Pobre sociedade brasileira.
Na Escandinávia, como Claudia Wallin mostrou em seus textos, juízes da Suprema Corte se locomovem de bicicleta de casa rumo ao trabalho. Dirigem seus próprios carros, pagam suas contas, lavam suas roupas.
E dividem os elevadores com as pessoas que querem subir ou descer.
Primeiros ministros também.
É uma cultura igualitária – e é aquela pela qual se bate o DCM.
No Brasil, pelo menos no Brasil das empresas de jornalismo, é o oposto. Um empresário pegar o elevador comum é um embaraço.
É uma coisa que reflete o que os jornalistas vêem em seu ambiente de trabalho. Quase sempre, quando os patrões chegam, os elevadores são imperialmente bloqueados aos demais funcionários.
Sua Majestade chegou.
Essa mentalidade está na raiz dos privilégios dados ao chamado 1%. Entende-se que eles não pertencem ao mesmo mundo de todos os outros, mas a uma esfera superior, digna do tratamento dispensado aos Luíses da França pré-Revolução.
Pegar seu próprio café passa a ser um insulto. Lavar sua própria sujeira, pior ainda. Dirigir seu próprio carro, nem pensar.
Aliás: quem falou em carro próprio?
Veja os juízes do STF. Não apenas andam de carros pagos pelos contribuintes como têm motoristas para levá-los a almoços e jantares que não pagarão com o seu dinheiro.
É isso também que leva um senador como Aécio a achar normal requisitar um avião da FAB, sustentado pelos contribuintes, para uma missão patética na Venezuela.
Na classe média, essa mentalidade é uma tragédia. Não lavamos nossos pratos, não fazemos nossa cama. E se quem faz isso por nós ascende socialmente, como aconteceu nos últimos anos, ficamos revoltados e vamos bater panelas.
Na Escandinávia, vigora a Janteloven, um código de conduta derivado do que vigorava nos romances de um escritor antigo local.
O primeiro mandamento é: “Não sou melhor que você e nem pior.” O lixeiro não é pior que o primeiro ministro, o milionário não é melhor que a faxineira.
No Brasil das companhias jornalísticas, um empresário sofre um constrangimento se pegar um elevador ao lado de gente comum.
O dia em que esse tipo de mentalidade desaparecer – e o DCM contribuirá para tanto, na medida de nossas modestas possibilidades – seremos uma sociedade enfim desenvolvida.
Texto de Paulo Nogueira, no Diário do Centro do Mundo.
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