domingo, 21 de junho de 2015

Livro relata ineficácia do FBI e desmistifica poder de seu fundador


CRÍTICA

Livro relata ineficácia do FBI e desmistifica poder de seu fundador

História da polícia federal dos EUA também mostra que abusos recentes do país não são pontos fora da curva
CARLOS EDUARDO LINS DA SILVAESPECIAL PARA A FOLHA

O aparente desmanche da corrupção na Fifa trouxe ao FBI (a polícia federal norte-americana), responsável pelas investigações, notoriedade e prestígio mundiais, como não havia provavelmente nunca desfrutado antes.
Com isso, o livro de Tim Weiner, "Inimigos: Uma história do FBI", lançado recentemente no Brasil, ganha importância ainda maior pela possibilidade que dá ao público de dimensionar com mais precisão o que é e o que foi essa agência.
Ao menos três conclusões importantes podem ser tiradas da leitura do excelente trabalho de Weiner, jornalista ganhador do prêmio Pulitzer.
A primeira é que, ao contrário do que sugerem inúmeros autores de história e ficção (como Clint Eastwood no seu drama biográfico "J. Edgar", com Leonardo DiCaprio no papel-título), o grande arquiteto do FBI, J. Edgar Hoover, não tinha tanta autonomia nem era tão voluntarioso como se supõe.
Hoover não intimidava e chantageava presidentes, mas sim foi usado por todos os oito sob quem serviu durante os 48 anos em que estruturou e dirigiu o FBI.
Na própria maneira como a agência se organiza funcionalmente está a origem de muitos dos seus vícios: até hoje, o FBI não tem um estatuto, e muito de seu orçamento é mantido em segredo do público.
Antes mesmo de existir com sua denominação e formato atuais (o que só ocorreu em 1924), o escritório em suas formas precedentes obedecia a ordens do presidente da República que desrespeitavam as leis, a Constituição e os direitos humanos.
Daí vem a segunda conclusão possível do livro: os abusos que os EUA vêm cometendo contra princípios básicos de justiça neste século na "guerra ao terrorismo" estão longe de constituir ponto fora da curva na história.
Em 1917, com argumentos muito parecidos com os que George W. Bush usaria 84 anos depois, o presidente Woodrow Wilson assinou decreto que dava ao BOI (Bureau of Investigation) poderes para deter e manter presos estrangeiros suspeitos de terrorismo ou espionagem sem acusações formais ou julgamento, como se fez neste século em Guantánamo.
Os anarquistas eram os islâmicos de quase cem anos atrás. A Lei de Espionagem (Espionage Act) era o instrumento legislativo similar à atual Lei Patriota (Patriot Act) que embasava desrespeitos a direitos básicos e levou à condenação de 1.055 pessoas (contra a maioria das quais nunca se conseguiu provar nada de ilegal, como destaca Tim Weiner).
O livro mostra que --como em 2001-- a maioria dos políticos e da opinião pública apoiou esses abusos contra a liberdade e os direitos humanos, mas --diferentemente de 2001-- os principais veículos jornalísticos se opuseram.
A terceira conclusão é que, ao contrário da lenda, o FBI tem sido muito ineficaz no cumprimento de suas missões básicas.
Ele não prendeu nenhum espião alemão nas duas guerras mundiais e não vigiou bem Lee Harvey Oswald, o assassino de John F. Kennedy, depois de ele ter voltado da União Soviética em 1962.
E, no dia 10 de setembro de 2001, negou um mandado de busca no apartamento de Zacarias Moussaoui, um dos artífices dos atentados do dia seguinte, entre outros fiascos relatados por Weiner.

INIMIGOS: UMA HISTÓRIA DO FBI
AUTOR Tim Weiner
EDITORA Record
QUANTO R$ 69 (616 págs.)
AVALIAÇÃO bom

Nenhum comentário:

Postar um comentário