Como é bom escrever todo dia. Nunca falta assunto. Um gozo só. Orgasmático.
– Nada como um processo bem cozinhado – diz a traça.
– Em fogo lento – responde a companheira.
– Acompanhado de um bom queijo Minas.
As traças, mesmo em tempos virtuais, alimentam-se do velho processo do mensalão tucano, que já completou dez anos sem julgamento. Até agora nenhum tucano perdeu ou pegou uma pena. Por que mesmo? Na última explicação, a juíza tinha pedido aposentadoria. Não havia substituto disponível. Sabe-se que o judiciário é moroso. Seletivamente moroso.
Cada coisa tem o seu tempo. Uma eternidade.
– Processo é como iogurte. Tem data de validade – diz a traça.
– Sim, se demorar, prescreve – enfatiza a companheira.
No caso do mensalão tucano duas prescrições já aconteceram: Walfrido Mares Guias e Cláudio Mourão estão livres graças à idade mágica de 70 anos. Não julgou em oito anos, dançou. Alguns acusados fizeram manobras para atrasar o julgamento. O ex-governador mineiro Eduardo Azeredo, pai de todos os mensalões, renunciou ao mandato de deputado federal para que seu caso saísse do STF e fosse para a primeira instância. O STF não viu nisso um jeitinho para escapar da guilhotina. Para não morrer de tédio, Azeredo espera o julgamento, que talvez nunca venha, trabalhando como executivo da Federação das Indústrias de Minas por um parco salário mensal de R$ 25 mil. Está com 66 anos de idade. Será que a justiça mineira segura mais quatro?
– Osso de tucano é duro de roer – comenta a traça.
– Osso ou papel?
O papelório está, em boa parte, na 9ª Vara Criminal de Belo Horizonte, que, entre um tutu e um feijão tropeiro, exclama:
– Uai, esse trem não anda!
Outro que manobrou para atrasar o trem foi o senador Clésio Andrade. Renunciou ao mandato e aguarda o futuro dirigindo a Confederação Nacional do Transporte. Ainda nem foi ouvido. Não houve tempo. As testemunhas de defesa também não foram chamadas. É coisa rápida. Mais uma década e todo mundo será ouvido. Clésio tem 62 anos.
– Eu confio na justiça – afirma a traça.
– Tarda, mas não falha – jura a companheira.
– É papel demais para examinar.
Eduardo Azeredo tem uma resposta na ponta da língua para justificar a sua inocência: não sabia de coisa alguma. Não se envolvia com questões financeiras da sua campanha. Mas e a tal teoria do domínio do fato? Não cabe aí uma pitadinha que seja? O mensalão tucano teria desviado R$ 3,5 milhões, o que, corrigido, dá R$ 13 milhões, uma bagatela perto do petrolão, mas igualmente ilegal. Um dos réus passou a ter foro privilegiado ao assumir o cargo de secretário da Fazenda do governo petista de Fernando Pimentel.
– Para que falar do mensalão tucano? – questiona a traça.
– Por uma questão de justiça – deixa escapar a companheira.
– Para aliviar a barra dos petistas que foram condenados?
– A ideia era que todos fossem julgados da mesma maneira, nas mesmas instâncias, com os mesmos instrumentos e com a mesma rapidez.
– São coisas diferentes, amiga.
– É o que tenho percebido.
Num dia apanha o PT. No outro, o PSDB.
Reprodução do Blog do Juremir Machado da Silva, no Correio do Povo.
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