A truculência da Guarda Municipal nesta quarta (3) ao tentar desapropriar duas casas da Vila Autódromo --embora houvesse decisão judicial suspendendo a ação-- mostra que o prefeito Eduardo Paes não vai descansar enquanto não tirar essa favela do mapa do Rio. Ela fica na região da Barra da Tijuca, a principal da Olimpíada do próximo ano e uma das mais cobiçadas pelas construtoras.
A Vila Autódromo seria um caso isolado se muito do que Paes considera recuperação da cidade não fosse vinculado a interesses de grandes grupos empresariais e não provocasse a tal da gentrificação --anglicismo horrível que resume um paradoxo semântico: áreas "revitalizadas" pelo poder dito público se tornam tão caras que quem construiu sua vida ali é forçado a ir embora.
Poderá acontecer na zona portuária, que vem passando por profunda transformação. Sua história está ligada às lutas de descendentes de escravos, de estivadores, de migrantes e imigrantes. Essas lutas têm seus espaços no chamado Porto Maravilha, mas à sombra dos arranha-céus e vultosos empreendimentos.
O maior anunciado até agora é o Moinho, que reformará e ampliará a fábrica do Moinho Fluminense. O complexo terá Moinho Mall ("com todo o lifestyle de um mall", segundo o vídeo de divulgação), Moinho Medical Center, Moinho Hotel Design, Moinho Long Stay, Moinho Corporate e Moinho Commercial Lofts. Tudo numa área "premium" do Rio.
Paes promete 2.200 "habitações de interesse social" na zona portuária. Falta ver se os habitantes terão dinheiro para circular pela "neighborhood". As obras da prefeitura na região contam com R$ 3,5 bilhões aportados pela Caixa Econômica com recursos do FGTS. Equivalem a certificados que investidores têm até 2026 para adquirir. Por enquanto, é no nosso cofrinho que estão enfiando todo o "lifestyle".
Texto de Luiz Fernando Vianna, na Folha de São Paulo.
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