De todas as formas de conhecimento, a do Direito é a que mais exige o exercício da lógica. O processo judicial é isso, uma sucessão de argumentos e contra-argumentos com pouco espaço para fugir dos temas centrais.
Por essa exigência de rigor analítico, às vezes me surpreende a maneira como alguns advogados-juristas de razoável reputação desenvolvem seu raciocínio, fugindo das próprias premissas apresentadas.
É o caso de Oscar Vilhena – que ontem palestrou em evento na Associação dos Advogados de São Paulo, presentes três Ministros do STF (Supremo Tribunal Federal). Em sua apresentação, identificou todas as variáveis que explicam a crise política atual – menos as essenciais.
As premissas de Vilhena giraram em torno do país legado pela Constituição de 1988.
Primeira premissa – um poder pulverizado.
“Na Inglaterra, partido que ganha eleição leva tudo. No Brasil todos ganham o tempo todo. E, ao ganharem, podem exigir parcelas no poder", diz ele. "Não criamos essa democracia majoritária, em que quem ganha leva tudo. Nossa democracia é generosa com perdedores, com distribuição de poder com parlamento, estados e parcelas de poder conferidas ao Legislador, ao Executivo, Judiciário e MPF.
Em outras palavras, ele diz que o Executivo, por aqui, não tem as mesmas prerrogativas de outras democracias, como a inglesa. Ele é mais vulnerável, porque o poder é distribuído. Ainda mais em um quadro partidário com 37 partidos.
Essas são as premissas que justificam nosso presidencialismo de coalizão.
Segunda premissa – a inclusão social aumenta as cobranças. Com a frustração do crescimento, entre o que o cidadão estava esperando e o que ele está recebendo, sobrevém a frustração geral, agravada pelas generosidades fiscais do primeiro governo Dilma, aportando recursos no BNDES e nos subsídios ao setor industrial.
Desenhou um caso clássico de crise previsível - dadas as características do presidencialismo brasileiro -, agravada por erros de política econômica. Uma versão elegante da máxima “é a economia, estúpido!”.
Terceira premissa – não se tem nem crise institucional nem social, mas uma crise de governabilidade. Isto é, as pessoas não duvidam das instituições, mas de seus ocupantes.
Essa crise é agravada pelo fato "comum nas democracias novas", de que os que exercem o poder não entendem que, se derrotados, poderão mais à frente voltar ao poder.
Entenderam? Vou tentar explicar.
Não é a oposição que não se conforma em ter perdido as eleições de 2014 e não tem paciência para aguardar 2018; é o governo (que ganhou as eleições de 2014) que não tem grandeza de tirar o time de campo, sabendo que poderá voltar em 2018. Em vez disso, tenta cooptar aliados com práticas clientelistas.
Ou seja, apresenta como premissa do modelo brasileiro a fragilização do poder do Executivo. E, depois, afirma que o esforço do Executivo para garantir a governabilidade denota falta de desprendimento.
Nenhuma sugestão sobre como aprimorar o modelo, sobre como reduzir a alta volatilidade da política brasileira, sobre como não transformar cada crise em instabilidade política. Tudo se resume à oposição impichar o governo em crise e o governo, por despreendimento, não reagir.
E não para por ai: sustenta que o papel do STF (Supremo Tribunal Federal) não é o de impor ritos mínimos, para não transformar o exercício do impeachment em prática banalizada, comum às republiquetas. É deixar a bola rolar e o destino manifesto da oposição se impor.
Com tal nível de superficialidade, seria muito exigir de Vilhena análises mais aprofundadas sobre o mercado de opinião, a cartelização dos grupos de mídia, o papel desestabilizador da dobradinha mídia-órgãos de controle.
Reprodução do Blog do Luís Nassif.
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