O desarquivamento, no Tribunal Superior Eleitoral, de um dos pedidos do PSDB para cassação de Dilma Rousseff e Michel Temer tem dois aspectos positivos. Embora os cinco votos pelo desarquivamento não fossem por tais aspectos. Até pelo contrário, talvez.
Menos relevante, decidir de uma vez entre a correção e a ilegalidade da campanha de Dilma não deixa de ser uma das definições necessárias nas atuais circunstâncias. O país está sendo torturado há dez meses, com agravamentos também econômicos, pelas várias tentativas de destituir Dilma e Temer, para que Aécio Neves e o PSDB tenham a pretensa oportunidade de assumir o poder. E Eduardo Cunha veja o caminho aberto aos seus obscuros projetos. Ou seja, por ação de um grupo político que nada tem a distingui-lo dos demais, na qualidade medíocre e na ausência de programas.
Para o país, é um custo muito alto, que não se está pagando com a crise corrosiva, mas a ser pago pelos amanhãs de muitos e muitos anos. Não foi esta, claro, a motivação de Gilmar Mendes para votar por desarquivamento e investigações. Nem seria a de Luiz Fux e Dias Toffoli, que em tudo parece obcecado em comprovar-se independente de quem o nomeou. Ou de Henrique Neves e João Otávio de Noronha, tido como identificado com o PSDB. A par de considerações jurídicas, havia aí uma esperada tendência majoritária pelo desarquivamento, ou contra Dilma. O que não quer dizer que todos tenham propensão no mesmo sentido para a decisão final. Com a prudente ressalva quanto a Gilmar Mendes.
O outro aspecto transcende a guerra política e os procedimentos eleitorais. E vai alcançar o problema essencial da Lava Jato, ainda não abordado mas decisivo nos julgamentos. Há um fundo de ilegalidade na decisão de desarquivar as acusações ao PSDB à campanha de Dilma: como indicou, em seu voto contrário, a ministra Luciana Lossio, a lei exige que esse tipo de ação inclua provas das acusações ao governante, o que não foi apresentado pelo PSDB. As acusações são várias e muitas insignificantes ou tolas, como manipulação de dados econômicos pelo Ipea, integrante do governo mas não da campanha. E, carro-chefe que não faltaria, a alegação de uso de dinheiro desviado da Petrobras por empreiteiras.
O dinheiro que saiu da Petrobras e entrou no caixa das empreiteiras não tinha carimbo especial. E não consta que em qualquer delas fosse para conta ou aplicação exclusiva dos pagamentos da estatal. O recebido da Petrobras juntou-se ao recebido pelas empreiteiras de outros clientes seus e de possíveis investimentos. Dinheiro sem apartheid. O que indica, e como foi ou será obtida a indicação, que o dinheiro doado por empreiteiras, a tal ou qual campanha, proveio da Petrobras? E da corrupção lá praticada, não de pagamento legítimo da estatal à empreiteira?
Pode haver casos de um sobrepreço aplicado para a transferência do seu valor a uma campanha. Em tal eventualidade, ficam rastros. Mas não é esta a lógica das doações de estatais ou de empresas privadas, porque os sobrepreços são processos em geral demorados, mais do que as campanhas. Para levar a acusação do PSDB e as numerosas acusações da Lava Jato a se transformarem em condenações, os tribunais ficam pendentes das provas de que o dinheiro doado era precisamente o pago a cada doador pela Petrobras, por meio de corrupção.
Um problema interessante.
Reprodução de texto de Jânio de Freitas, na Folha de São Paulo.
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