terça-feira, 20 de outubro de 2015

A cooperação internacional como arma política


Volto ao tema da cooperação internacional e da geopolítica.
Nas últimas décadas, a luta contra o crime organizado ampliou as formas de cooperação internacional, a possibilidade de procuradores de vários países trabalharem de forma conjunta.
Ganhou corpo depois da primeira grande onda de liberação financeira, que consagrou vários paraísos fiscais e colocou no mesmo circuito dinheiro de sonegação, do tráfico de drogas e de jogadores, da corrupção privada e pública.
Foi um fantástico avanço cujos resultados mais expressivos se mostram na Lava Jato, mapeando o roteiro percorrido pelas outrora rotas seguras de ocultamento de patrimônio.
No Ministério Público Federal, a cooperação ficou sob as mãos competentes do procurador Vladimir Aras, que se notabilizou na apuração dos escândalos do Banestado - muito apropriadamente batizado pelo senador Roberto Requião, de a "mãe de todos os escândalos".
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Quando uma média potência tenta se lançar no mercado internacional, sua manifestação de poder é através de suas corporações. Foi assim, desde a Organização das Índias Ocidentais, pela Holanda, a pirataria inglesa bancada pela Coroa, até a grande exploração econômica da guerra do Iraque por grupos ligados ao ex-presidente norte-americano George Bush.
Por trás da ascensão internacional de toda potência, há as alianças de grupos políticos e econômicos locais, alimentadas por financiamento de campanha mais ou menos legais e esquemas de corrupção.
Em Portugal, o  grupo Espírito Santo se beneficiou da parceria com Cavaco Silva. A Pirelli, Danone e a Olivetti não teriam se tornado multinacionais sem o apoio do sucessivos governos italianos.
A Ambev não teria saído das fronteiras do Brasil, nem Daniel Dantas se transformado em banqueiro sem capital sem a parceria com o governo FHC. Assim como a Odebrecht não teria assumido a dimensão que assumiu sem  parceria com o governo Lula.
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Onde entra a geopolítica?
A cooperação internacional define regras gerais internacionais de combate à corrupção.
Economia madura e, portanto, pragmática, os Estados Unidos definiram um conjunto de prerrogativas da Presidência de República, inclusive o poder sobre o Ministério Público e a capacidade do Presidente de anistiar empresas ou empresários em nome do interesse nacional.
Nas democracias mais jovens – como a Itália dos anos 90 e o Brasil de agora – não há uma institucionalização das prerrogativas do Executivo, especialmente nas definições das estratégias internacionais.
Por essas diferenças, as mesmas medidas tomadas pelos respectivos Presidentes em defesa do chamado interesse nacional, são legais e aceitas nos Estados Unidos e criminalizadas em países em que essas práticas não foram institucionalizadas.
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É por aí que entra a visão geopolítica norte-americana nos acordos de cooperação internacional.
Os canais de cooperação internacional permitem ao parceiro mais aparelhado – os EUA – alimentar os parceiros emergentes com informações de seu próprio interesse.
Não apenas os crimes claros de corrupção são coibidos, como há a tentativa de criminalização até das estratégias geopolíticas nacionais. Entram nesse caldeirão a tentativa de criminalização das ações diplomáticas na África, a tentativa de quebrar as pernas das empreiteiras no mercado internacional, criminalizando até financiamentos à exportação de serviços e a tentativa de inviabilizar o BNDES.
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Nem se culpe o MPF por essa falta de sensibilidade geopolítica. Caberia à Presidência da República, antes dela, aos institutos ligados aos partidos políticos, à academia, a consolidação desses conceitos.
Como alguém já colocou apropriadamente, o subdesenvolvimento é um trabalho pertinaz de gerações.

Reprodução do Blog do Luís Nassif

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