quinta-feira, 1 de outubro de 2015

Com Saúde, Dilma atravessou o Rubicão

Ao entregar o Ministério da Saúde para o fisiologismo, Dilma Rousseff atravessou o Rubicão. A Saúde tornara-se o símbolo maior de blindagem contra a fisiologia. Com alguns problemas pontuais, a partir do governo Collor o Ministério foi comandado sucessivamente por Ministros ligados ao tema, a formidável bancada da saúde, acima das paixões e dos partidos, fornecendo quadros para as administrações federal e estaduais.
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O estilo Dilma impõe custos maiores do que o razoável.
A presidente persiste em determinada posição brigando com os fatos até o limite da ruptura. Rende-se apenas na penúltima hora, e aí o custo do acordo cresce exponencialmente.
Foi assim com a demora inexplicável em substituir a diretoria da Petrobras, a lenha que jogou na fogueira de Pasadena, o atraso com que substituiu Aloisio Mercadante.
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Com a última leva de concessões, os aliados, especialmente os militantes, ficam no direito de indagar por que razão continuarão a defender Dilma, quando ela deixa de representar qualquer veleidade de projeto político.
O jogo atual um capítulo a mais em um enredo complexo cujo desfecho marca o fim do ciclo político pós-redemocratização.
Vem a redemocratização e a liderança do processo político cabe ao PMDB. A extraordinária voracidade com que foi ao pote racha a frente democrática.
Nascem, então, os dois partidos que iriam dominar a cena política dali para frente: o PSDB com sua bandeira supostamente anti-populista e de responsabilidade fiscal; o PT, com suas bandeiras sociais.  E, para garantir a governabilidade, o presidencialismo de coalizão, inaugurado por Fernando Henrique Cardoso, tendo como ponto de equilíbrio os coronéis políticos eletrônicos – a maioria com poder garantido pela aliança com os grandes grupos de comunicação.
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A era Lula leva ao limite o modelo, loteando diretorias da Petrobras justo no momento em que a empresa ampliava de forma inédita seus investimentos.
A dinheirama que jorrou de forma descontrolada da empresa ajudou a engordar a nova velhíssima geração de políticos do baixíssimo clero que ascendeu à Câmara.
Das entranhas do petrolão nasceu a força da bancada fluminense do PMDB, com seus caciques Sérgio Cabral, Eduardo Paes e Eduardo Cunha. Os mesmos recursos irrigaram a liderança abortada de Eduardo Campos, que estava pronto para descer do Nordeste com uma tropa de causar inveja nos legionários fluminenses.
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Daqui para frente, o quadro partidário é de fim de festa, com a crise quase terminal dos principais partidos, e a indefinição programática dos novos partidos que surgem.
PT – o pragmatismo afastou do PT movimentos sociais e da intelectualidade. O petrolão acentuou a perda de legitimidade. Agora, o PT está sendo sangrado diariamente pela ação de Dilma, preso a uma armadilha fatal: não é governo, mas não pode ser oposição. Cada medida do governo Dilma aprofunda o distanciamento da base. Dispõe ainda de uma militância aguerrida. Mas parte dela seguramente migrará para o novo partido de Marina Silva. Tem como última reserva o prefeito de São Paulo Fernando Haddad, às voltas com o antipetismo da cidade.
PSDB - deixou definitivamente de ser alternativa de poder. Sua marca era a responsabilidade fiscal. Decidiu ser populista sem povo, incendiário e predador, conduzidos por uma liderança imatura, como Aécio Neves. Seu último programa eleitoral matou qualquer ilusão. Nele, as principais lideranças garantem que votarão em todas as medidas que beneficiem o povo e contra todas as medidas que signifiquem cortes de direito. A bandeira do quanto pior, melhor, vai colar inexoravelmente no partido. Já está perdendo os liberais. E se contentará com Rebeldes Online e outros grupos adequados ao nível mental de Aécio e do novo PSDB.
PMDB – a dispersão de comando aumentou a voracidade dos grupos internos. Dificilmente conseguirá traduzir em projeto de governo sua atual influência política. Nenhum intelectual de peso ousará cerrar fileiras com o partido.
Ainda é muito cedo para apostas sobre o novo jogo político.
Da etapa atual restará Lula articulando uma frente ampla – na qual caberá o PT e os aliados do PMDB. E os liberais se agrupando em torno da Rede, jogando o PSDB ao mar.
O Rede será um dos vitoriosos da nova fase, mas preso a um paradoxo de nascença: está aberto a um conjunto de grupos sociais descrentes do PT, mas sua ideologia econômica é a do liberalismo arraigado, contra o Estado de bem-estar e reticente em relação aos gastos sociais.
Até 2018 muita água irá correr.

Reprodução do Blog do Luís Nassif

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