quinta-feira, 16 de julho de 2015

Poesia no metrô

Este ano, o metrô de Londres está "celebrando a poesia irlandesa", em sua maravilhosa série "Poems on the Underground". Trata-se de livretos de 12 páginas e contendo 12 poemas, com impressão esmerada, fáceis de carregar e de ler, disponíveis para os passageiros em todas as estações de metrô londrinas. Mais de 250 poemas foram distribuídos no "Tube" desde que o programa foi lançado, em 1986.
A coleção começa com William Butler Yeats, um poeta complexo e controverso. Nacionalista irlandês, Yeats foi premiado com o Nobel de Literatura em 1923 –o primeiro irlandês a receber essa honraria. No entanto, ele veio a flertar com o fascismo, no fim da vida. Yeats era um poeta cujo trabalho, na avaliação de Marjorie Perloff, professora emérita de literatura na Universidade Stanford, era "uma complexa antecipação do colonialismo, do nacionalismo e do apelo do fascismo em tempos de caos, o medo das multidões e do poder".
Um poema de Yeats baseado em "Ich am of Irland", do século 14, abre a coleção.
Em tradução de Lucas Bertolo para o português:
"Eu sou da Irlanda/ E a Sagrada Terra da Irlanda/ E o tempo corre, chorou ela/ Saias da caridade/ Venha dançar comigo na Irlanda."
A celebração da poesia irlandesa no metrô londrino tem importância mais que passageira. O metrô de Londres foi alvo de numerosos complôs dos nacionalistas irlandeses para atentados com bombas. No começo do mês, os londrinos recordaram o ataque ao metrô (e a um ônibus de dois andares) por extremistas suicidas islâmicos em julho de 2005, que causou a morte de 52 pessoas e ferimentos a mais de 500. Pelo menos no mundo do terrorismo internacional, os irlandeses parecem ter sido há muito superados. O que demonstra que algum progresso pode ser obtido na solução até mesmo das mais intratáveis queixas históricas. E isso não é pouco.
A coleção também inclui "He Wishes for the Cloth of Heaven", de Yeats. Na tradução para o português de Lucas Bertolo:
"Tivesse eu do céu as bordadas vestes/ Trabalhadas com ouro e prateada luz/ O azul e o escuro e a negra veste/ Da noite e a luz e a meia-luz/ Eu espalharia as vestes sob teus pés/ Mas, sendo pobre, tenho só meus sonhos/ Eu espalhei meus sonhos sob teus pés/ Pise com calma, pois pisa em meus sonhos."
Em São Paulo, cerca de cinco milhões de pessoas usam o sistema de trens e metrô, uma imensa audiência potencial para a poesia. Mas os passageiros passam desatentos pelos poucos poemas afixados às paredes das estações, solitários e perdidos em meio à publicidade onipresente.

Texto de Kenneth Maxwell, na Folha de São Paulo. Tradução de Paulo Migliacci. 

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