quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Europa ainda pratica o "apartheid' em vários países

Todos os dirigentes europeus, sem exceção, elogiaram nesta semana os méritos de Nelson Mandela. Muitos pronunciaram frases brilhantes e participaram dos funerais do homem que venceu o ódio racial e o apartheid. Mas justamente na UE, onde a crise não termina, o desemprego afeta 25 milhões de pessoas e há 80 milhões de pobres, a xenofobia e o racismo não param de aumentar.
A viagem começa em Ostrava, na República Checa. Aqui, as crianças ciganas são enviadas para escolas especiais. Algumas compartilham classes com alunos incapacitados, outras vão a colégios só para ciganos. Muitas vivem em bairros ou povoados separados do resto da população e sem acesso aos mesmos direitos. Um regime de apartheid. Situações semelhantes ocorrem na Hungria, onde 90% dos ciganos estão desempregados. Na Polônia, onde muitos restaurantes não deixam entrar romanis. Ou na Romênia, Eslováquia, Eslovênia e Bulgária.
Miroslav Turek, pedagogo social da escola Premysla Pittra, em Ostrava, se parece pouco com qualquer professor europeu médio. Depois de dez anos de trabalho em uma prisão e outro período em uma casa de acolhimento infantil, esse professor se encarrega agora do grupo mais problemático de um colégio em que todos os alunos são ciganos, apesar de o bairro incluir outras comunidades. Turek diz ensinar 14 garotos entre 13 e 15 anos, embora na minúscula classe que dirige não se vejam mais de sete. "Em novembro só houve oito dias em que todos assistiram." Explica que trabalha com os pais para minimizar as faltas.
À primeira vista, Premysla Pittra não é uma escola diferente: um centro de ensino primário acolhedor, com trabalhos infantis a enfeitar as paredes. Mas esse especialista deve se empenhar em lições alheias ao programa educacional. "Durante três meses, por exemplo, me dediquei a lhes mostrar a importância de trazer lápis para as aulas", explica com admirável serenidade. O professor não se dá por vencido. Coopera com as famílias e deixa claras as regras com métodos simples: cartão verde na primeira infração, amarelo na segunda e a partir daí ordem de ficar na classe depois de tocar a campainha.
Premysla Pittra é uma escola segregada: só recebe crianças ciganas, em grande medida de entornos desfavorecidos que prejudicam seus resultados escolares. Mas ainda existe uma opção pior para essas famílias com problemas mais graves que a educação dos filhos. Que as crianças caiam em escolas para "incapacidades mentais leves", como o sistema as denomina. Devido a um perverso círculo vicioso, a maioria dos que acabam lá são ciganos que não superaram a prova de aptidão que determina em que escola ingressarão as crianças de 6 anos.
A maioria dos checos escolariza seus filhos a partir dos 3 anos, etapa em que a educação não é obrigatória. Assim, chegam treinados a esse pequeno exame - com provas como contar até dez ou pequenos jogos de lógica. Mas os ciganos costumam enfrentar essa avaliação com uma fase mínima de adaptação anterior à escola. Por isso, muitos não passam e acabam ingressando no que as autoridades denominam de maneira eufemística escolas práticas. Os dados oficiais afirmam que 3% das crianças entram nelas por ano, embora se recusem a definir a proporção de ciganos. "Não podemos armazenar os dados por raça. Seria discriminatório", alega Martin Stepanek, vice-prefeito de Ostrava encarregado da educação.
A segregação nas escolas é um problema que afeta toda a Europa oriental. E emerge como símbolo de um mal maior que já percorre todo o continente: o ódio às minorias, sendo os ciganos, árabes, judeus e negros as comunidades mais perseguidas.
Do outro lado da Europa, na Holanda, Áustria, França, Bélgica ou Reino Unido, o poder político há alguns anos tenta transformar as exíguas minorias ciganas no bode expiatório da crise, ou da gestão da crise. Silvio Berlusconi abriu fogo em 2008, aos recensear e expulsar em massa os ciganos da Itália; Nicolas Sarkozy assumiu o posto em 2010 e hoje o vírus contagiou os "supostos" progressistas.
Assim, o apartheid econômico e racial e o ódio do diferente começam a ser um sinal de identidade em muitos dos 28 países da UE. O fenômeno preocupa alguns observadores. Segundo escreveu o filósofo francês Christian Salmon, "a política está sendo devorada pela xenofobia inerente ao sistema econômico neoliberal". Na França e no Reino Unido, as pulsões xenófobas chegaram da extrema-direita à cúpula do Estado. O sociólogo francês Eric Fassin explica que as diatribes do ministro do Interior, Manuel Valls, contra os romanis "legitimam o discurso racista da Frente Nacional e tentam fazer os eleitores esquecerem que o governo socialista faz a mesma política econômica que Sarkozy". O Executivo socialista leva meses derrubando barracos de cidadãos europeus (ciganos) sem realojar seus 17 mil ocupantes - a metade crianças -, descumprindo assim a promessa eleitoral de François Hollande, as normas internacionais e a circular do Interior de agosto de 2012. A ideia era tratar com humanidade e firmeza as populações "precárias". Só fica a firmeza.
Em paralelo, os racistas deram um passo à frente e ocuparam as ruas, as redes sociais e a mídia. A ministra da Justiça francesa, a guianense Christiane Taubira, foi comparada a um macaco por uma ex-candidata da Frente Nacional, por uma menina de 12 anos em um protesto contra o casamento gay e por uma revista de extrema-direita. Os ataques da direita populista contra a comunidade muçulmana já são tão comuns que não são notícia. A novidade é que, segundo uma recente pesquisa da Agência de Direitos Fundamentais, 85% dos judeus franceses creem que o antissemitismo é um problema em seu país, contra 66% da média europeia.
O porta-voz da União de Estudantes Judeus da França (UEJF), Elie Petit, comenta: "O discurso antissemita se legitimou e corre livre pelas redes sociais. É como se a linguagem dos anos 1930 voltasse a estar na moda. Mas o mais grave é que as ideias xenófobas calam entre os jovens: 40% dos franceses entre 18 e 25 anos se declaram dispostos a votar na extrema-direita nas eleições europeias" de maio.
No Reino Unido, a coisa parecia ir melhor. Mas há alguns dias o primeiro-ministro David Cameron embarcou na onda anticigana com um artigo no "Financial Times" no qual anunciava que exigirá da Europa medidas para regular a imigração e referia-se aos "nômades" romenos e búlgaros dizendo que seu governo lhes negará os direitos que concede a outros migrantes, como as ajudas sociais para moradia e desemprego. Cameron recorreu ao eufemismo ao escrever que Londres deportará os "imigrantes europeus que peçam esmola ou durmam na rua".
Em tempos de ódio ao diferente, os negros vivem situações semelhantes às dos ciganos e dos judeus: a rejeição imediata à primeira vista e identificação com os clichês que sempre os acompanharam. "O negro é tachado de preguiçoso ou irracional. E o estereótipo não desaparece nem quando são ricos", explica Omar Ba, responsável pela Plataforma Africana em Antuérpia, próspera cidade belga que vive seu particular receio das minorias. Neste caso, a base não é tanto econômica quanto de identidade nacional: o nacionalismo flamenco endurece os critérios para ter acesso a certos benefícios com requisitos como o conhecimento da língua, o holandês.
Ba alerta que a extrema-direita está se aproximando da população média, ao mesmo tempo que os partidos majoritários imitam os discursos radicais. "Com a crise, os políticos demonstraram sua incapacidade. Assim, como não é fácil encontrar culpados e a cidadania está frustrada, jogam a carta do estrangeiro. Mas é preciso ter cuidado. Antes da Segunda Guerra Mundial havia esse mesmo discurso", previne esse belga eloquente, procedente do Senegal, que relata problemas de acesso a alguns serviços que só são solucionados quando aparece sua esposa, de origem belga.
Talvez os líderes das velhas democracias se inspirem no que acontece no leste da Europa? No bloco do "capitalismo tardio" reside a maior parte dos 8 ou 10 milhões de europeus ciganos, e a palavra "romani" se conjuga com pobreza, desemprego e perseguição. Ali, manifestar em público o ódio aos ciganos - e de forma crescente aos judeus - é cada vez mais rentável.
Na Eslováquia, por exemplo, um neofascista acaba de ganhar eleições regionais com um vasto programa político - como ironizou De Gaulle: pôr os ciganos para realizar trabalhos forçados. As eleições de Banska Bystrica transformaram em presidente desta região, que em 1944 se levantou contra os nazistas, Marian Kotleba, que baseou sua campanha em dois elementos: denunciar a corrupção e acabar com o "parasitismo cigano", suprimindo as ajudas sociais aos romanis e enviando-os para reconstruir as estradas. Segundo Peter Pollak, alto representante eslovaco para a questão cigana, 40% dos romanis do país vivem em guetos, contra 20% uma década atrás.
O êxito de Kotleba lembra a Europa dos anos sombrios. Fundador em 2003 de um pequeno grupo violento chamado Comunidade Eslovaca, Kotleba foi preso várias vezes por desfilar pelos guetos ciganos com um uniforme igual ao da guarda do sacerdote Andrej Hlinka, a milícia clerical fascista que monsenhor Josef Tiso lideraria entre 1939 e 1945.
Em Ostrava, uma cidade média de antigo esplendor industrial onde os ciganos vivem em bairros muito desfavorecidos, o apartheid escolar das crianças ganhou destaque em 2006 porque algumas famílias levaram o caso ao Tribunal Europeu de Direitos Humanos. Este sentenciou que o sistema educacional incorria em uma discriminação indireta ao orientar as crianças majoritariamente para essas escolas de nível inferior. E obrigou o Estado a indenizar os demandantes.
Apesar da decisão, as coisas pouco mudaram. "Inclusive a comunidade cigana tem a impressão de que é pior agora, porque estão mais conscientizados", explica Kumar Vishwanathan, responsável pela ONG Vivendo Juntos, que liderou todo o processo. Essa organização promove a convivência de "ciganos e brancos" em várias comunidades de Ostrava, com bons resultados de integração. Renata Gaziova dirige uma delas. "Apenas 3% das crianças ciganas vão a boas escolas; o resto é segregado", explica esta romani que é taxativa na hora de definir o que as crianças aprendem nas escolas que se afastam do cânone: "Nada. Conheço uma menina de 15 anos que não sabe ler nem escrever o próprio nome", relata.
As famílias têm dificuldade para se afastar do destino definido pelo sistema. "Gostaria de dar a meus filhos a liberdade de terem sido médicos, por exemplo, mas na escola já lhes dizem que não podem. Por isso eu mesma recomendo a um deles que seja cozinheiro. Pelo menos eu posso lhe ensinar!", brinca Iveta Kroscenova, mãe de nove filhos, cinco deles matriculados em escolas segregadas. A seu lado, Jolana Smarhovycová, ativista para a integração dos ciganos, explica que sua filha frequentava uma escola normal, mas a puseram em uma classe em que só havia ciganos. Quando perguntou a razão, a mudaram. "Então se transformou na única menina cigana de sua classe. Afinal nos mudamos", explica. Seu sobrinho Kristian não teve tanta sorte. Terminou com boas notas em uma escola para meninos com dificuldades de aprendizado, mas ao sair percebeu que seu preparo não permitia seu acesso à educação secundária.
Esse é o círculo em que são envolvidos os ciganos, que costumam percorrer o mesmo caminho de pobreza e marginalização que seus pais. O vice-prefeito Stepanek se defende: "Vão a escolas nas quais só há ciganos por critérios de proximidade. E quanto a escolarizá-los em colégios especiais são os psicólogos que decidem".
Na Hungria, os ciganos estão habituados a ouvir essas desculpas e outras piores. Os dados desenham uma situação de profunda marginalização. Segundo um coletivo de ONGs, o índice de desemprego entre o coletivo supera 90%, enquanto o desemprego entre a população não cigana é de 11%. Além disso, 40% dos 10 milhões de húngaros vivem abaixo do limite de pobreza; quase um milhão deles são ciganos. Apesar da violência desses números, a voz da minoria romani é quase inaudível. Mas alguns começam a se organizar.
Estamos em Budapeste, capital de um país onde há 70 anos 500 mil judeus e 100 mil romanis foram assassinados pelos nazistas com a colaboração do regime fascista do almirante Miklós Horthy. Aqui acaba de nascer o Partido Cigano da Hungria (MCP), que já afirma ter 5 mil militantes e pretende se apresentar nas eleições legislativas e europeias de 2014. Aladár Horváth, seu porta-voz e presidente da Associação para os Direitos dos Ciganos, explica que a situação dos romanis se deteriorou com o governo do populista Viktor Orban: "A discriminação racial e social está institucionalizada no governo e é onipresente na mídia". Apesar de seu nome, o Partido Cigano quer representar "todos os pobres, porque hoje, aos olhos do poder, tudo o que é pobre é cigano", acrescenta Horváth.
Curiosamente, o ideólogo e vice-presidente do Partido Cigano não é cigano, e sim judeu: o aguerrido e lúcido militante antifascista Sandor Szoke. Roteirista e escritor, Szoke ajuda os ciganos a repelir os ataques dos paramilitares do partido neonazista Jobbik, a terceira força política do país, que tem 44 deputados de um total de 386 e se diverte semeando o pânico na comunidade romani e agredindo os judeus, por enquanto só verbalmente.
Szoke conta que começou a ajudar os romanis a enfrentar os "skinheads" há seis anos, "porque tinha que haver algum branco entre eles para defendê-los". Enquanto come uma truta no decadente café Astoria de Budapeste, reconhece que fundar um partido cigano "não é a melhor ideia, mas não há alternativa: não há uma esquerda que os defenda, o consenso na fobia é absoluto".
Desde 1989, quando caiu o Muro de Berlim, a situação dos ciganos se transformou em desastre. "Eles eram os únicos que viviam melhor que hoje sob o comunismo. Como em outros países do bloco, a indústria estatal artificialmente sustentada desmoronou, deixando-os sem sua principal fonte de trabalho. Muitos romanis húngaros eram mão-de-obra dessas fábricas. Naquele momento a indigência era proibida e o desemprego, ilegal. Se alguém passasse mais de três meses sem trabalhar era denunciado como 'parasita e fugitivo do trabalho'. Por isso, quando caiu o muro, os ciganos voltaram a ser vistos como criminosos, assim como antes da Segunda Guerra Mundial. Hoje continua sendo assim." Há uma segunda razão, acrescenta Szoke. A involução democrática. "Orban partiu dos anos 1980, depois retrocedeu aos 60 e agora vamos de cabeça para a sociedade adormecida, feudal e clientelista da Hungria de 1918 a 1944, a do nascimento do fascismo."
A última reforma promovida pelo governo é a da educação, que reduziu em dois anos, para 14, a idade obrigatória de escolaridade. "A ideia é brilhante, copiada do comunismo: criar uma força de trabalho cigana de baixo custo. Agora os obrigam a viver em povoados divididos pela metade: uma parte cigana e outra branca. Em Budapeste vivem em dois guetos porque ninguém lhes aluga apartamentos e não têm acesso ao mercado de trabalho. Estão como os árabes na França nos anos 1970, fora do sistema. Agora Orban lhes oferece trabalho por 120 euros ao mês. Se recusarem, os deixam três anos sem ajudas sociais nem seguridade social."
A preocupação também é palpável entre os judeus húngaros, a elite social e econômica, que reside majoritariamente na capital. Todos os entrevistados em Budapeste contam que têm amigos de famílias judias que emigraram. Os episódios antissemitas, dizem, ocorrem com cada vez mais assiduidade. "Ainda não nos agridem, como aos ciganos, mas os ataques verbais são constantes e há pessoas que se foram de Budapeste e outras que hesitam em fazê-lo", diz Anna Szeslzer, uma mulher risonha, laica e nada dramática, que fundou a escola particular Lauder de Budapeste em 1990 e se aposentou há alguns meses da direção do colégio. "Em dois anos perdemos 28 alunos, uma classe inteira", explica com um sorriso amargo. "E paradoxalmente agora temos listas de espera, talvez porque os ataques ajudem a despertar a consciência judia."
O assédio e a diáspora incipiente - que alguns preferem atribuir só à crise - são entendidas com um acontecimento recente. Antes do verão, um importante dirigente do Jobbik, Márton Gyöngyösi, pediu no Parlamento que se elaborem listas dos judeus, "sobretudo os que estão no governo e no Parlamento, porque representam um risco para a segurança do país", disse. Agora, Gyöngyösi declina um convite deste jornal para se explicar. O governo de Orban condenou suas palavras e afirmou que toma "as mais estritas medidas contra toda forma de racismo e de comportamento antissemita". Mas a comunidade judia não vê isso tão claro, diz em Nova York Esther Susán, uma jovem que decidiu deixar seu país. "Parti temporariamente, não por causa do antissemitismo, mas por tudo o que aconteceu no país nos últimos dois anos. Não creio que eu tenha um futuro ali, mas não só por ser judia." De Barcelona, David Stoleru, diretor do programa The Beit Project, que conta o Holocausto por colégios de toda a Europa, afirma que "a Hungria está emitindo uma luz vermelha muito intensa".
Daniel Bodnar, presidente da Fundação Ação e Proteção (FAP), a primeira associação húngara contra o antissemitismo, não parece sentir medo e entra no café Astoria sorridente. Conta que a FAP detectou "há um ano em meio" o mal-estar da comunidade judia e há oito meses analisa as razões. "Noventa e nove por cento dos ataques são verbais. Esse assédio é superior à média europeia, mas em troca não há ataques físicos; 90% dos ataques procedem da política." "E o maior problema é que a justiça não age. Eu denunciei 29 ataques nos últimos seis meses e só um acabou em processo. A culpa é dos promotores e da polícia. Desde 1990 na Hungria só houve duas sentenças por antissemitismo."
Outro jovem ativista, Adam Schonberger, líder do movimento Marom, que promove as culturas das minorias, atribui o aumento da xenofobia à desinformação e à pobreza. "Não é só culpa de Orban e do Jobbik; a mídia, a crise e a falta de reação das associações judaicas também têm seu papel. Estamos há seis ou sete anos assim. Londres já é a terceira cidade húngara e o antissemitismo existe há muito tempo, mas o discurso se expande porque os políticos se calam. O antissemitismo é popular."
Nas sinagogas de Budapeste se respira um ambiente de tensa tranquilidade, ou de tensão resignada. Um jovem rabino de Buda, Tamas Vero, conta que "algumas famílias do bairro foram para Israel e outras para Viena e Berlim", e que sua mulher também quer ir "por causa das meninas", porque nos livros escolares os judeus não existem e "porque diz que estamos outra vez em 1933". O rabino tenta descontrair sua esposa, mas admite que nas sextas-feiras jovens se concentram diante da sinagoga fazendo a saudação nazista. "Digo a ela que o capitão é o último que abandona o barco, e que não é verdade que a Hungria nos odeia, mas o que posso fazer? Ela tem razão em uma coisa: o Estado e Orban não nos protegem o suficiente. Em todo caso, eu ainda passeio tranquilo pelo bairro com meu quipá, embora em certos lugares o use embaixo do gorro. Mas seu primeiro alvo são os ciganos."
Do outro lado do Danúbio, outro jovem rabino, Istvan Horvath, recebe o jornalista na porta da grande sinagoga de Pest. Quando entra no escritório, tira o gorro e aparece o quipá. Horvath está preocupado com "a escuridão espiritual" que assola os jovens europeus e com a "escassa consciência" dos judeus húngaros. "Meus pais são laicos e ignoram quase tudo sobre o judaísmo. Como tantos que sobreviveram ao Holocausto, esconderam sua origem durante anos. Minha avó dizia: 'Somos todos iguais'. Talvez porque perdeu a fé em Auschwitz, onde morreram 28 membros da família. Creio que cabe aos netos tentar reforçar o significado dessa identidade perdida. E é um trabalho muito duro. Porque não é verdade que os ataques do Jobbik, que são nazistas de coração, reforcem o sentimento de pertencer à comunidade judaica. Ao contrário."
Quando lhe pergunto se a Europa está voltando a seu passado mais obscuro, o jovem rabino responde: "Às vezes se parece com o que aconteceu há 70 anos. Mas não é igual. Hoje temos recursos que na época não tínhamos. Aqui há oito ou dez associações judaicas, e existe a União Europeia". Sim, mas os ciganos são atacados fisicamente... "Essa é a grande vergonha. Ninguém faz nada para ajudá-los, incluindo eu. Por isso, quando ouço um judeu discutir com eles, grito e choro."

Reportagem de Lucia Abellan e Miguel Mora para o El País, reproduzida no UOL. Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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