CIFRAS&LETRAS
CRÍTICA ECONOMIA INTERNACIONAL
cifras@grupofolha.com.brDilemas do euro não têm saída fácil, aponta coletânea
Obra reúne artigos editados desde 1955 pela revista 'Foreign Affairs'
A Grécia não é entendida porque há resistência em ver a crise como ela é: uma continuação da série de socorros ao setor financeiro iniciada em 2008 e que ainda continua. É muito mais fácil culpar os gregos e ficar surpreso quando eles se negam a cumprir o roteiro estabelecido.
A maior parte dos empréstimos para a Grécia foi direto para os bancos. Grosso modo, dos 230 bilhões de euros destinados ao país, apenas 27 bilhões de euros acabaram usados para manter o Estado funcionando. Há estimativas apontando que 90% dos empréstimos "aos gregos" nem passaram pela Grécia.
Se o dinheiro tivesse sido distribuído no país, cada cidadão teria recebido 21 mil euros. Teria sido impossível gerar toda a pobreza e desarranjo provocados pelas políticas de austeridade, que levaram a Grécia a ter um desemprego da ordem de 25% entre os adultos e de 50% entre os jovens.
O autor da análise é o economista Mark Blyth, professor de política econômica internacional da Universidade Brown (EUA). Sua avaliação integra a coletânea de 29 artigos sobre o euro publicada pela revista "Foreign Affairs".
A seleção inclui textos editados pela publicação norte-americana sobre a questão da integração europeia ao longo de décadas. O primeiro, de 1955, ressaltava os rumos do comércio na situação pós-guerra. Na sequência, o ex-presidente francês Valery Giscard d'Estaing (1974-1981) mostrava, em artigo de 1983, preocupação com o aumento do desemprego na região e a fragmentação da sociedade.
As avaliações, em grande parte da linhagem conservadora, percorrem a história europeia, com ênfase na economia. Quando, nos anos 90, chega o debate sobre o euro, as opiniões se dividem e há muitos alertas sobre as incongruências do projeto que, na visão de muitos, privilegiou as elites.
Em texto de 1996, o economista alemão radicado nos EUA Rudiger Dornbush (1942-2002) opina que a moeda comum era uma má ideia. Já em 2012, o norte-americano Martin Feldstein decreta que o euro tinha falhado, apontando o avanço nos deficits e nas taxas de desemprego.
UNIÃO INSTÁVEL
No mesmo ano, em ensaio de maior fôlego, o britânico Timothy Garton Ash busca nas memórias de guerra a sustentação do projeto europeu. Identifica na reunificação alemã o ponto crucial a acelerar a ideia de criação de uma moeda única, um compromisso franco-germânico.
Ressalta a existência de um "triângulo disfuncional" entre políticas nacionais, europeias e as do mercado financeiro global –cujo avanço as últimas décadas introduziram um crucial elemento de instabilidade. E alerta para o aumento do radicalismo político, bem visível no continente.
A solidariedade do pós-guerra e o otimismo do crescimento nos anos seguintes dão lugar a uma dinâmica inversa. Se aos jovens do passado havia uma ascensão à vista, hoje a perspectiva é contrária, aponta o autor.
Na Grécia, segundo ele, as filas nos sopões, o aumento do número de sem-teto e dos dados de suicídio fazem rememorar condições enfrentadas em plena guerra.
"Um mercado único de 500 milhões de consumidores continua um atrativo para a maioria dos países europeus. No entanto, não é mais evidente que a Europa traz crescimento, prosperidade e bem-estar a seus cidadãos", diz.
No centro do debate sobre o projeto europeu está o caso grego. Na coletânea da "Foreign Affairs" não há apostas em saída fácil: há possibilidades de colapso, de manutenção do desgaste e de maior integração e solidariedade.
Há um consenso. A posição alemã é chave para os desdobramentos futuros. Nas palavras de Mark Blyth (agora em artigo de 2011, com Matthias Matthijs):
"O problema hoje não é a força da Alemanha, mas a sua fraqueza –sua relutância em atuar no seu papel hegemônico. Apesar de ter lucrado regiamente com o arranjo da moeda, ela precisa entender que o modelo está fincado em bases frágeis, não pode ser generalizado para todos os Estados e chegou ao seu limite de sustentabilidade. Se o euro colapsar, a Alemanha colheria os piores frutos."
EUROPE'S MONETARY (DIS)UNION
AUTOR Gideon Rose (org.)
EDITORA Foreign Affairs
Quanto US$ 8,95 (300 págs.)
Avaliação bom
AUTOR Gideon Rose (org.)
EDITORA Foreign Affairs
Quanto US$ 8,95 (300 págs.)
Avaliação bom
Reprodução da Folha de São Paulo.
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