quinta-feira, 10 de novembro de 2016

Fracasso civilizacional

Ainda não dá para cravar, mas tudo indica que há policiais envolvidos no assassinato dos cinco jovens paulistanos que estavam desaparecidos havia duas semanas. Não chega a ser surpresa. As polícias brasileiras são o retrato do fracasso civilizacional do país.
Como já escrevi aqui, a criação da polícia foi um dos passos mais decisivos para a humanidade. O surgimento de Estados fortes com suas milícias e o monopólio do uso da violência, no século 16, fez as taxas de homicídios despencarem para algo entre um décimo e um quinquagésimo dos valores anteriores. Mas, se a polícia é a conquista mais fundamental da civilização, o controle do aparato policial é sem sombra de dúvida a segunda mais importante. Nesta, o Brasil falha miseravelmente.
Dados do recém-divulgado 10º Anuário de Segurança Pública mostram que a taxa de letalidade das polícias brasileiras é de 1,6 óbito por 100 mil habitantes, o que é uma enormidade. Nos EUA, o mais violento dos países industrializados, esse índice é de 0,34, que já é incomparavelmente mais do que o 0,0034 da polícia finlandesa ou o 0,0016 da inglesa. Nossos agentes da lei matam mil vezes mais que seus homólogos britânicos.
É verdade que os policiais brasileiros também são assassinados em proporções muito maiores do que os de nações avançadas, o que os deixa visceralmente predispostos a puxar o gatilho. A questão é que cabe ao Estado adotar medidas que possam superar essa lógica de vendeta. Não tem conseguido fazê-lo.
No caso de São Paulo, que tem tido sucesso em reduzir de forma consistente os índices gerais de homicídio, a persistência da alta letalidade policial (1,9 por 100 mil em 2015) se torna ainda mais gritante.
Aqui não dá para exonerar o PSDB de culpa. O partido governa o Estado já há mais de 20 anos, tempo suficiente para trocar toda uma geração de agentes da lei, e não chegou nem perto de criar uma polícia civilizada.


Texto de Helio Schwartsman, na Folha de São Paulo

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