quinta-feira, 11 de agosto de 2016

Quem vai empurrar a minha cadeira de rodas?

O provocativo título acima foi tema de uma conferência no último congresso de geriatria e gerontologia. Ele cutuca um ponto que a gente prefere não pensar: de que estamos envelhecendo e, provavelmente, nos tornaremos dependentes de alguém, seja um familiar ou um cuidador profissional.
Várias pesquisas apontam que o "ficar dependente" é o principal temor da população acima de 60 anos. Em um passado não muito distante, em que as pessoas morriam mais jovens, o tempo de dependência era bem menor. Agora, pode durar anos e até décadas.
Dias atrás, Adriano, um eletricista de 38 anos, me contava o que enfrenta com o pai, na cama há 15 anos com sequelas de dois AVCs (Acidente Vascular Cerebral). Embora tenha dois irmãos, nenhum quis assumir ou dividir os cuidados com o pai, que ficou viúvo há dez anos. Adriano, 38, cuida dele sozinho. Para isso, abdicou do trabalho regular (faz bicos quando algum vizinho ou parente aceita ficar com o pai) e da vida pessoal (a mulher o deixou).
É um pequeno exemplo dos desafios que teremos pela frente e o quanto temos que aprender. A ciência e a tecnologia estão muito mais à frente do que a nossa capacidade de cuidar. E ninguém está preparado para isso. Nem como indivíduos nem como sociedade.
Hoje é grande o número de pessoas que não puderam ou não quiseram ter filhos, as famílias estão menores, os filhos estão distantes, as mulheres, antes cuidadoras naturais, estão no mercado de trabalho, enfim, por uma série de razões não há mais certeza alguma para a pergunta: quem vai cuidar de mim?
Na verdade, envelhecer é uma novidade para nós. Famílias, administradores públicos e profissionais de diversas áreas ainda estão tentando entender e se adaptar a esse fenômeno. O desafio se torna ainda maior diante da crise financeira. Vamos dobrar a proporção de idosos nos próximos 18 anos: de 12,5% para 25%. Nenhum país do mundo viveu isso nessa velocidade.
E, ainda assim, a gente segue feito avestruz, com a cabeça no buraco. Ninguém pensa, por exemplo, que o estilo de vida que se leva hoje terá um impacto decisivo lá na frente. Sim, tem gente que vai sofrer doenças crônicas, degenerativas, independentemente do seu comportamento por uma condição hereditária, congênita. Mas a imensa maioria dos problemas pode ser prevenida com hábitos saudáveis, investindo em prevenção das doenças crônicas.
Isso pode reduzir muito o tempo de dependência na velhice, segundo vários estudos. Mas quem pensa sobre isso na juventude? No imaginário, os jovens até se imaginam velhos. Mas sempre numa perspectiva bem idealizada. Um exemplo foi o concurso de redação que a Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia fez neste ano em que estudantes secundaristas citaram que querem envelhecer como Mick Jagger e Tina Turner.
Além da dieta e da atividade física, tem um fator cada vez mais determinante para um envelhecimento ativo: as relações sociais. Bons relacionamentos nos mantêm mais felizes e mais saudáveis. A solidão é tóxica. Pessoas mais isoladas são menos felizes, a saúde decai rapidamente, o cérebro se deteriora mais cedo e elas vivem menos. A mensagem vem desse maravilhoso TED do Robert Waldinger : "Do que é feita uma vida boa? Lições do mais longo estudo sobre felicidade".


Texto de Cláudia Collucci, na Folha de São Paulo

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