quinta-feira, 30 de junho de 2016

'Quantos anos você acha que eu tenho?'

Uma professora defendia a ideia de que as pessoas podem ser consideradas ageless (sem idade) quando uma aluna perguntou: "Quantos anos você tem?"
A professora reagiu: "Quantos anos você acha que eu tenho?"
Constrangida, a aluna pensou duas vezes antes de responder: "38?"
A professora disse: "Se você acha 38, eu tenho 38!".
A aluna suspirou aliviada por ter acertado a idade que a professora tanto desejava aparentar.
As duas compartilharam um jogo tipicamente feminino: a aluna sabia que devia mentir e a professora, mesmo sabendo que é uma mentira, ficou muito feliz com os "38".
A cena é a mesma, só que com um aluno. Ele perguntou a idade da professora e ela reagiu: "Quantos anos você acha que eu tenho?"
Ele respondeu sem hesitar: "54".
A resposta feriu mortalmente a professora. O aluno, ao dizer exatamente a idade que a professora tem, sem jogar o jogo feminino de mentir a idade (provavelmente por desconhecer este tipo de jogo), desmascarou a fantasia de que ela aparenta ser mais jovem do que realmente é.
A professora descreveu a crueldade do aluno para uma colega alemã. A alemã não conseguiu entender por que a brasileira se sentia feliz quando os outros diziam –ou melhor, mentiam– que ela parecia ter menos idade.
"Por que você quer parecer mais jovem? Por que dizer a própria idade é um drama para você? Por que você sente vergonha de ter 54 anos? Este é um comportamento muito infantil, não combina com uma mulher madura. Você não acha uma falta de dignidade querer ser o que você não é?"
Em uma cultura em que o corpo jovem é uma verdadeira riqueza, um "corpo-capital", é compreensível que as mulheres tenham pânico de envelhecer e de revelar a idade. No entanto, quando a mulher é valorizada por outros capitais, ela pode envelhecer com mais dignidade, liberdade e felicidade.
Termino com um conselho de amiga. Nunca pergunte a uma mulher: "Quantos anos você tem?". Se ela responder: "Quantos anos você acha que eu tenho?", você terá que mentir muito, mas muito mesmo, para deixá-la feliz.


Texto de Mirian Goldenberg, na Folha de São Paulo

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