Um relatório elaborado pela Anistia Internacional e divulgado nesta terça (28) aponta o aumento da violência pelas forças do Estado no México e mostra que a maioria das detentas ouvidas é alvo de maus tratos ou é torturada no ato de sua prisão ou quando já está encarcerada.
Segundo o estudo "A Tortura de Mulheres no México", 97 das 100 mulheres ouvidas em distintas regiões do país afirmaram terem sido tratadas com violência. Trinta e três dizem ter sido estupradas por integrantes das Forças Armadas ou da polícia.
Apesar das 2.403 denúncias registradas na Justiça, afirma o documento, nenhum processo foi aberto contra os possíveis agressores. A maioria das detentas ouvidas está em prisão preventiva enquanto aguarda julgamento por crimes relacionados ao narcotráfico.
"O que mais nos espanta é a impunidade. Entre 2010 e 2015, nenhum soldado ou oficial foi suspenso ou advertido por abuso da força ou por tortura", disse à Folha Madeleine Penman, uma das responsáveis pelo relatório.
"Nosso estudo mostra que os abusos, muitas vezes envolvendo estupros, são um método rotineiro para tratar as detentas."
Entre os métodos de tortura listados pelo relatório estão choques elétricos em partes íntimas e espancamentos.
"Além disso, essas mulheres esperam julgamento longe de suas casas e famílias, com grande prejuízo aos filhos", acrescenta Penman.
A Anistia diz ter procurado o Estado mexicano para ouvi-lo sobre os números, mas não recebeu resposta.
AUMENTO DA VIOLÊNCIA
O relatório é divulgado num momento de acirramento da violência praticada pela polícia e pelas Forças Armadas, com vítimas civis e não necessariamente ligadas ao crime organizado.
Há poucas semanas, um confronto da polícia com professores em greve deixou nove mortos no Estado de Oaxaca. O envolvimento de forças do Estado em mortes de civis é investigado nos massacres de Tlatlaya, com 22 mortos, e Ayotzinapa, no famoso caso do desaparecimento de 43 estudantes.
"O aumento do uso da força pelo Estado tem sido constante desde o início da guerra com o narcotráfico, mas hoje já a extrapola; é um modo sistemático de atuação cotidiana", conclui Penman.
Durante a gestão de Felipe Calderón, do PAN (Partido da Aliança Nacional, centro-direita), entre 2006 e 2012, o Estado mexicano declarou guerra aos cartéis e iniciou ações bélicas de forma sistemática.
O saldo desse confronto chega a 80 mil mortes, incluindo milhares de civis. Já seu sucessor, Enrique Peña Nieto (PRI, direita), regionalizou ações e adotou alianças em alguns casos, com as chamadas "auto-defensas" -milícias formadas por cidadãos.
Segundo estimativas de ONGs, a estratégia não vem surtindo resultado, e a violência no México tem crescido. Só em 2016, o número de homicídios subiu 15%.
Diante do quadro, no último domingo (26), milhares de pessoas marcharam no centro da Cidade do México pelo fim da violência.
Depois de ser desautorizado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, que contestou a versão oficial sobre o desaparecimento dos 43 estudantes em Ayotzinapa, e de seu partido, o PRI, ter perdido em vários Estados na eleição regional mais recente, Peña Nieto vem propondo mudanças na abordagem do tema da segurança.
Uma delas é a introdução do debate sobre a despenalização da posse e do consumo de maconha e a liberação da droga para uso medicinal.
Reportagem de Sylvia Colombo, para a Folha de São Paulo.
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