Apesar do empurrão da pesquisa Datafolha, divulgada na véspera, os atos contra Dilma perderam um tanto de sua força. Mas não é o caso de desqualificá-los. Pelo contrário. Comprovou-se que há gente engajada no que acredita ser o melhor para o país. Isso é relevante num movimento com marcas de despolitização, como desconhecimento da história brasileira –parecendo crer que a corrupção começou há 12 anos– e apreço pequeno pela democracia duramente conquistada.
No jogo de especulações sobre por que a revolta retraiu, talvez valha pensar em dois pontos, dentre outros. Um é que, mesmo sendo o impeachment o tesouro procurado, parte dos anseios dos descontentes já vem sendo atendida: esfacelamento do PT, que virou uma coisa invertebrada, e triunfo de uma agenda conservadora –redução da maioridade penal, leis para estimular a violência das polícias, bloqueio da ampliação dos direitos de mulheres e gays.
É significativo que, em protestos que têm a corrupção como inimiga, seja difícil ver cartazes contra Eduardo Cunha. Ao emparedar o PT e devolver ao reacionarismo um vigor político que não tinha desde a ditadura, o presidente da Câmara dos Deputados realiza muito do que desejam os manifestantes.
O segundo ponto é que o movimento ainda está sendo guiado mais pelo fígado (ódio ao PT) do que pelo estômago (desemprego, perda de renda); mais por vontade do que por necessidade. Para quem conhece o Rio, foi fácil perceber que não havia em Copacabana gente em situação financeira precária. Eram 10 mil pessoas de uma classe média que segue a pauta dos grupos de comunicação, claramente favoráveis aos protestos.
Se a crise se instalar com a força que se espera e os mais pobres saírem às ruas, é possível que a turma deste domingo corra para seus apartamentos. E chame a polícia.
Texto de Luiz Fernando Vianna, na Folha de São Paulo.
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