terça-feira, 21 de abril de 2015

Desvios de conduta

A chacina de Vigário Geral (21 pessoas mortas por policiais em 29 de agosto de 1993) é o alicerce sobre o qual se ergueu o Grupo Cultural AfroReggae, nascido na favela carioca. Nestes mais de 20 anos, a ONG amealhou parceiros poderosos, entre empresas, políticos e artistas. Seu líder, José Junior, virou ícone do que pode ser chamado de ativismo sociocultural.
Em 2 de abril, quando Eduardo de Jesus Ferreira, morador do Complexo do Alemão, foi morto por um tiro de fuzil aos 10 anos, Junior escreveu no Facebook: "Esse menino, segundo informações, era bandido.
Provavelmente, se fosse bandido, poderia ter matado um policial se tivesse oportunidade". Depois, alegou que suas palavras foram distorcidas e pediu desculpas aos pais da criança.
Não foi um caso isolado. Junior se tornou figura próxima do governo do Estado do Rio, sobretudo da área de segurança. Militou na campanha de Aécio Neves para presidente. E, agora, está associado a movimentos que pedem o impeachment de Dilma Rousseff.
Ele tem todo o direito de defender o que acredita. Mas, com essas atitudes, perdeu o equilíbrio para prosseguir no que fazia bem: mediar partes em conflito; apontar caminhos para quem vive em situação de risco. Tornou-se força auxiliar e legitimadora de projetos políticos que, ao menos em parte, vão contra o que pregava. Exemplo: Aécio defende a redução da maioridade penal, algo que Junior sempre combateu.
Outros ativistas também posam ao lado de políticos conservadores, engajam-se em campanhas eleitorais, almejam cargos públicos, transformam suas ações socioculturais em trampolim para ambições pessoais. Mantêm relações com jornais e jornalistas para que suas mudanças de rumo não sejam apontadas e seus nomes permaneçam bem tratados. Vendem-se como novidade, mas já estão envelhecidos.


Texto de Luiz Fernando Vianna, na Folha de São Paulo

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