A classe média que o presidente Barack Obama identificou em seu discurso do Estado da União na semana passada como a base da economia norte-americana vêm diminuindo há quase meio século.
No final dos anos 60, mais da metade dos lares nos Estados Unidos estavam exatamente no meio, ganhando, em dólares de hoje, entre US$ 35 mil e US$ 100 mil por ano. Poucas pessoas perceberam ou se preocuparam à medida que o tamanho do grupo começou a diminuir, porque a mudança foi causada principalmente por mais norte-americanos que subiram a escada econômica para degraus de maior renda.
Mas desde 2000, a fatia de lares de classe média continuou se estreitando, sendo que o principal motivo é que mais pessoas caíram para o a margem mais baixa. Ao mesmo tempo, menos pessoas desse grupo se encaixam na imagem tradicional de um casal com filhos em casa, um espaço cada vez mais preenchido pelos idosos.
A mudança social drástica ajuda a explicar por que o presidente se concentrou em reavivar a classe média, oferecendo um punhado de propostas voltadas especificamente para preocupações como pagar pela faculdade dos filhos, tirar licença maternidade ou paternidade, pagar berçário e comprar uma casa.
"A economia da classe média significa ajudar as famílias a se sentirem mais seguras em um mundo em constante mudança", disse Obama ao Congresso e ao público na terça-feira.
Ainda assim, independentemente da renda, a maioria dos norte-americanos se identificam como classe média. O termo propriamente dito é tão amorfo que os políticos costumam citar o grupo ao introduzir propostas para gerar um apelo amplo.
A definição aqui começa com US$ 35 mil – que é cerca de 50% mais alto do que o nível oficial de pobreza para uma família de quatro pessoas – e termina na marca dos seis dígitos. Embora muitos norte-americanos de lares que ganham mais de US$ 100 mil se considerem classe média, principalmente aqueles que vivem em regiões caras como as Costas Nordeste e Pacífico, eles têm substancialmente mais dinheiro do que a maioria.
Independentemente de como as linhas são estabelecidas, está claro que milhões estão com dificuldades de conseguir os itens que a maioria dos especialistas consideram essenciais à vida de classe média.
"Eu consideraria classe média as pessoas que podem viver confortavelmente com o que ganham, podem pagar suas contas, podem guardar algum dinheiro para a aposentadoria e para a faculdade dos filhos e podem tirar férias e pagar por lazer", diz Christine L. Owens, diretora executiva do Projeto Nacional de Lei Trabalhista, um grupo de pesquisa e defesa de tendência esquerdista.
Lisa Land, 49, é uma dessas pessoas que caiu para o andar de baixo. Ela vive com os cheques da Seguridade Social de seu pai e com ajuda de sua filha adulta para comprar mantimentos.
Lisa Land, 49, é uma dessas pessoas que caiu para o andar de baixo. Ela vive com os cheques da Seguridade Social de seu pai e com ajuda de sua filha adulta para comprar mantimentos.
Suas circunstâncias são uma mudança drástica em relação a poucos anos atrás, quando ela se considerava firmemente na classe média. Apesar de um salário relativamente modesto, seu pagamento e outros recursos rendiam bastante na minúscula Eden, na Carolina do Norte, onde ela trabalhou por 13 anos no atendimento ao cliente em uma fábrica têxtil.
Em 2008, contudo, Land foi demitida. Com os pais doentes e uma recessão que devastou a economia da região, ela se mudou para a casa do pai para cuidar dele em tempo integral.
"Nós não tínhamos muito dinheiro, mas tínhamos tudo que precisávamos", disse ela. "Agora, não temos dinheiro extra para nada. Nada de férias. Nada de jantar fora. Nada dessas coisas."
Enquanto a classe média norte-americana encolheu, também passou por uma transformação. Os 53 milhões de lares que permanecem na classe média – cerca de 43% de todos os lares – parecem consideravelmente diferentes da classe média da geração anterior, de acordo com uma análise de dados do censo feita pelo New York Times.
Nos últimos anos, o componente que cresceu mais rápido na nova classe média foram os lares chefiados por pessoas com 65 anos ou mais. Hoje, os idosos têm melhores benefícios de aposentadoria do que as gerações anteriores. Além disso, os norte-americanos mais velhos estão cada vez mais trabalhando além da idade tradicional de se aposentar. Mais de 8 milhões, ou 19%, estavam na força de trabalho em 2013, quase duas vezes mais do que em 200.
Como resultado, enquanto a renda dos lares médios caiu em média 9% desde a virada do século, ela teve um salto de 14% entre os lares chefiados por adultos mais velhos.
A proeminência crescente de idosos na classe média reflete, em parte, a forma como a Seguridade Social e o Medicare – originalmente estabelecidos como redes de segurança para proteger os idosos de caírem na pobreza depois da aposentadoria – forneceram uma proteção substancial para eles contra os tempos difíceis.
Casais casados com filhos – que representam uma categoria que está encolhendo como um todo – estão diminuindo ainda mais rápido enquanto fatia da classe média. No final dos anos 60, cerca de 45% de todos os lares incluíam adultos casados e seus filhos. Mas entre os lares da classe média, mais de 60% tinha esse arranjo familiar tradicional.
Hoje, casais com filhos em casa representam apenas um quarto dos lares. Mas mesmo enquanto diminuem como fatia da população, essas famílias subiram a escada econômica à medida que mais mulheres casadas passaram a trabalhar como assalariadas. Em 2000, 42% ganhava mais de US$ 100 mil em dólares de hoje.
A recessão mais recente colocou um obstáculo aos avanços até mesmo deste grupo geralmente bem sucedido. Sua fatia na classe média caiu em 3 pontos percentuais e a fatia que ganha menos de US$ 35 mil cresceu.
"Na grande recessão, perdemos muitos empregos de classe média e ganhamos muitos empregos que pagam pouco", disse Michael R. Strain, acadêmico residente no American Enterprise Instituto, de direita.
Por mais de duas décadas, John D'Amanda, 54, ganhava cerca de US$ 30 mil por ano administrando um serviço de lavagem de janelas em Oakland, Califórnia. Ele tinha um carro e um apartamento. Então, em 2009, os telefonemas diminuíram. Seus clientes não tinham mais dinheiro para pagar pelo luxo de alguém lavar as janelas para eles.
D'Amanda arranjou um emprego no McDonald's, onde trabalha desde então, agora ganhando 25 centavos acima do novo salário mínimo estadual de US$ 9 por hora. Ele paga US$ 350 por mês de aluguel para dividir um quarto pequeno com um colega.
"Eu mal consigo pagar isso", disse ele.
Hoje em dia, a maioria dos adultos de classe média atingiu seu status através do ensino superior. Ainda em 1992, metade de todos os lares da classe média eram chefiados por alguém com um diploma de ensino superior ou menos, de acordo com a análise do The Times. Hoje, apenas 37% da classe média não frequentou a faculdade.
A geografia também importa. As maiores quedas nos de classe média durante a metade de século anterior ocorreram no Nordeste – em estados como Massachusetts, Connecticut e New Jersey – onde economias industriais deram lugar à suburbanização em massa e maior afluência.
De acordo com uma pesquisa do New York Times em dezembro, 60% das pessoas que se autointitulam de classe média acham que se trabalharem duro vão ficar ricas. Mas as evidências sugerem que este objetivo está cada vez mais fora do alcance. Quando as pessoas da classe média olham para cima, elas veem os ricos ficando mais ricos, enquanto elas se esforçam sem resultado.
"O meio basicamente ficou na mesma; não melhorou", disse Lawrence F. Katz, um economista da Universidade de Harvard. "Agora você tem um iPhone e uma TV melhor, mas sua renda média não mudou. O que de fato mudou é que aquele apartamento de cobertura ficou muito mais bacana."
Reportagem de Dionne Searcey e Robert Gebeloff, para o The New York times, reproduzida no UOL. Tradutora: Eloise De Vylder
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