O mais longevo dos enxugadores de gelo do Rio despede-se da função
nesta semana. José Mariano Beltrame, secretário de Segurança do Estado
por quase uma década, deixa o cargo vendo a maior marca de sua gestão, as Unidades de Polícia Pacificadora, desmoronar.
Com as UPPs, Beltrame colocou em prática uma ideia conceitualmente
simples, mas de difícil execução: a polícia precisava se aproximar dos
moradores e do cotidiano das favelas, em vez de entrar nelas só para
impor medo e trocar tiros com bandidos. Mas o resto do Estado precisava
subir o morro também. Se a única face visível do poder público nas
comunidades fosse a policial, jamais haveria paz duradoura.
Beltrame sempre soube que o sucesso das UPPs como força de ocupação
militar teria duração limitada. E ela expirou. Não apenas por conta da
calamidade financeira em que o PMDB jogou o Rio, mas por uma falha de
execução do projeto. Porque os governantes se preocuparam mais em levar
teleféricos do que saneamento às favelas.
É difícil evitar o desânimo ao ver que a melhor oportunidade que a
cidade já teve para controlar a violência não durou nem uma década.
Beltrame superou seus antecessores em longevidade porque teve condições
para trabalhar como ninguém antes dele, e aproveitou-as com
inteligência. Mas se despede do cargo em baixa como os demais.
Parabéns, secretário. O senhor foi o mais eficiente dos dublês de Sísifo
que o Rio já teve. Por alguns anos, chegou mesmo a convencer ao menos
parte da sociedade de que seu plano lograria êxito.
Mas jamais haverá pacificação sem que se trate seriamente da inclusão
social. Sem que se admita o fracasso da guerra às drogas como executada
até hoje. E sem que se garanta à polícia formação e remuneração dignas.
Texto de Marco Aurélio Canônico, na Folha de São Paulo.
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