terça-feira, 18 de junho de 2013

Emirados sufocam dissidência islâmica


RAS AL-KHAYMAH, Emirados Árabes Unidos - As monarquias árabes do Golfo Pérsico usam petrodólares há anos para aplacar os chamados por mudanças. Agora, estão voltando a recorrer à ameaça de prisão.
Em fevereiro, no Qatar, um poeta foi sentenciado a 15 anos de prisão por um poema subversivo. Já a Arábia Saudita reprimiu protestos de sua minoria xiita, perseguindo ativistas. Mas o caso mais abrangente é o dos Emirados Árabes Unidos, uma federação de sete emirados dinásticos impelidos à prosperidade graças à enorme riqueza petrolífera e à adoção de políticas favoráveis às empresas.
O governo dos Emirados agiu agressivamente para sufocar o Islah, grupo islâmico que, no passado, operava um complexo social na entrada de Ras al-Khaimah.
Toda a direção da organização foi substituída por decreto governamental, dezenas de seus membros foram levados a julgamento e até mesmo seu nome foi mudado.
Noventa e quatro membros do Islah foram acusados criminalmente de conspirar com outro grupo islâmico, a Irmandade Muçulmana, para depor o governo.
Entre os réus, que podem ser sentenciados a 15 anos de prisão, há juristas destacados, acadêmicos e até mesmo parentes de uma das famílias reais do país.
Em janeiro, o procurador-geral declarou que os detidos "lançaram, fundaram e administraram uma organização que se opunha aos princípios básicos do sistema de governança dos EAU e tinha por objetivo tomar o poder".
Khalid Alroken, cujo irmão, um advogado de destaque, é um dos acusados, negou que a organização tenha objetivos políticos. "É uma organização social que trabalha com o povo visando a preservação dos Emirados como país muçulmano de característica árabe", afirmou. "As autoridades interpretaram nossas atividades como o primeiro elo de uma cadeia que visaria derrubar o governo e enfraquecer o Estado."
A repressão começou em 2011, após o início das revoltas árabes, embora não tenham ocorrido protestos nos EAU. Mais de 130 ativistas, incluindo acadêmicos e algumas dezenas de membros do Islah, firmaram uma petição pedindo que os membros do Parlamento fossem eleitos livremente e recebessem poderes legislativos plenos.
Um mês depois, cinco ativistas e críticos do governo foram detidos e levados a julgamento, acusados de insultar os dirigentes do país. Todos foram sentenciados à prisão, mas perdoados no dia seguinte.
O Islah operava legalmente no país desde 1974. Em 1994, sua sede em Dubai foi fechada, levando o grupo a se transferir para Ras al-Khaimah. A partir de 2011, enquanto a Primavera Árabe explodia em outros países, sete membros do Islah foram privados de sua cidadania, enquanto dezenas de outros eram presos. Em 2012, o sultão Bin Kayed al-Qassemi, presidente do Islah e primo do governante de Ras al-Khaimah, foi um dos detidos.
Os Emirados parecem ser palco improvável de um revival islâmico. Seus líderes aproveitaram sua riqueza, abertura econômica e mão de obra estrangeira para converter o país em centro de atividade internacional.
Mas isso não foi seguido por abertura política. Os partidos políticos são proibidos, e a maioria dos cidadãos não pode votar.
"Não somos um país democrático, mas somos progressistas em relação a várias questões -no tocante às mulheres e ao que eu chamaria de tolerância", comentou Anwar Gargash, ministro de Estado das Relações Exteriores. De acordo com ele, o governo prioriza a prosperidade, não o desenvolvimento econômico.
Muitos árabes concordam, temendo que grupos como o Islah coloquem em risco a estabilidade que tornou seu país de 5,5 milhões de habitantes rico, seguro e pacífico. "Este país funciona porque é apolítico", opinou o escritor Sooud al-Qassemi. "É uma zona livre de islamismo político. "
Mas muitos perguntam o que significa ser cidadão dos Emirados Árabes Unidos. Uma visão pode ser testemunhada em Dubai, a maior cidade do país, onde os habitantes locais são poucos, o consumo de álcool é generalizado e mulheres de minissaia flertam com homens em público. A visão oposta, defendida pelo Islah, prevalece nos emirados menos ricos do norte do país, onde ainda vigoram códigos sociais tradicionais.
Talvez seja paradoxal que a incerteza, o caos e a guerra (em alguns casos) que se seguiram à Primavera Árabe tenham reforçado o apoio ao governo.
"Temo que uma transição democrática hoje, num país como os EAU, nos submetesse ao conservadorismo reacionário", comentou o analista político Mishaal Al Gergawi. "Olho para o que está acontecendo no Egito e em outros lugares e me pergunto se precisamos desse tipo de transição."


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