sábado, 16 de abril de 2016

No day after, Lula

Vamos lá, a mais um exercício de futurologia: se eventualmente aprovado o processo de impeachment na Câmara no próximo domingo deverá recomeçar no minuto seguinte a caçada ao ex-presidente Lula. Seja para cassar seus direitos políticos ou para efetivamente recolhe-lo a algum presídio.
Se para uma parcela importante da sociedade, formada pelos grandes meios de comunicação (e a classe média que serve de caixa de ressonância para suas teses e interesses), pelo mercado financeiro e por instituições patronais como Fiesp, Firjan e CNI, o governo Dilma não tem mais condições políticas de continuar, para outra parcela importante da sociedade, formada pelas esquerdas, pelos movimentos sociais, pela intelectualidade e pela mídia independente o governo Temer não reúne condições políticas, éticas e jurídicas sequer para começar.
Se para a direita o governo Dilma, caso consiga arrebatar cerca de duzentos deputados na Câmara e se safar do impeachment, mesmo assim não terá mais quaisquer condições de governabilidade dali por diante, para a esquerda um eventual governo Temer, inventado por dezenas de parlamentares denunciados, indiciados ou mesmo já tornados réus em processos de corrupção não tem envergadura moral para comandar o país.
Mas mais do que isso: um eventual governo Temer, por provavelmente vir a ser formado pelas forças que apoiam o impeachment de Dilma, por se pautar na tal “Ponte para o Futuro” e por dever favores a todos os setores que estão atuando pela queda da atual presidente, terá de ser necessariamente um governo de um duríssimo ajuste neoliberal, trazendo ainda como adereços a pauta do conservadorismo moral tão cara ao baixo clero atuante na Câmara e no Senado.
Some-se a isso a luta de foice no escuro que deverá ocorrer entre os prováveis novos donos do poder para apossar-se de nacos importantes do Estado brasileiro e os significativos desajustes da economia legados pelo governo Dilma e imagine-se o conjunto de medidas amargas que deverão vir por ai. Com os custos recaindo, obviamente, sobre a classe trabalhadora e inclusive sobre os setores de classe média que hoje apoiam ardorosamente o impeachment da presidente.
Postas estas condições, em pouco mais de dois anos de seu eventual governo Temer terá poucas condições de entregar ao país uma situação muito melhor do que a atual. E terá sempre associado a si, perante parcelas da opinião pública brasileira e internacional, o estigma da ilegitimidade.
O consórcio PMDB-PSDB-DEM-Baixo Clero que poderá comandar o país caso Dilma caia deverá ter dificuldades nas urnas de 2018. Poderá se reencontar com Lula na eleição presidencial em situação de ampla desvantagem. O ex-presidente poderá apresentar-se ao país em 2018 como Vargas se apresentou em 1950, após o desastroso governo Dutra, que o havia sucedido em 1946. Daí porque tira-lo do jogo, seja cassando-lhe os direitos políticos ou mesmo prendendo-o, será um passo fundamental para a sobrevivência política por mais tempo desse novo consórcio que se insinua para comandar o país.


Texto de Wagner Iglecias, no Jornal GGN

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